Paraná

Eleições municipais

Ney Leprevost foge de rótulo de “direitista”, mas adota linha conservadora sobre ocupações urbanas e tarifa zero

Principal nome da centro-direita para disputar prefeitura de Curitiba não descarta apoio de outras matizes ideológicas

Curitiba (PR) |
Ney Leprevost concedeu entrevista ao Brasil de Fato Paraná - Foto: Paulo Sérgio/Câmara dos Deputados

Reconhecida como cidade “direitista”, Curitiba deverá ter um leque de candidaturas deste campo da extrema à centro-direita para a sucessão do atual prefeito Rafael Greca (PSD). Na movimentação do tabuleiro, peças como o bolsonarista Paulo Martins, deputado federal pelo PL, o vice-prefeito da cidade, Eduardo Pimentel (PSD), e até mesmo Fernanda Dallagnol, esposa do deputado federal cassado Deltan Dallagnol, se movimentam para buscar estarem bem posicionados quando iniciar de vez as tratativas para a construção das chapas. Até o nome do tucano e ex-prefeito de Curitiba Beto Richa é levantado para participar de uma eventual disputa.

Dentre os nomes do campo conservador, no entanto, o nome que desponta para suceder Greca, a quase um ano das eleições, é o do ex-candidato à prefeitura e atual deputado estadual Ney Leprevost (União). No último levantamento feito pelo instituto IRG, em junho deste ano, Leprevost aparece na liderança, com 18%, seguido pelo ex-prefeito de Curitiba e deputado federal Luciano Ducci (PSB).

Leprevost começou sua carreira política institucional como vereador de Curitiba, sempre filiado a partidos de centro-direita, mas evitando posicionamentos mais extremados. Em 2016, por exemplo, chegou a unir no palanque de sua candidatura à prefeitura o PCdoB ao lado do MBL. Apesar de estar na base do governo conservador de Ratinho Junior (PSD) na Assembleia Legislativa (Alep), e já ter sido secretário na gestão, Leprevost chegou a flertar com a possibilidade do deputado estadual e presidente do PDT-PR, Goura, ser o seu vice.

Em entrevista ao Brasil de Fato Paraná, Leprevost evitou críticas frontais ao atual prefeito Rafael Greca, mas buscou se diferenciar abordando temas como a tarifa-zero no transporte coletivo da capital, pauta que é historicamente ligada ao campo progressista, e que vem ganhando adesão de outras correntes partidárias e ideológicas. Perguntado sobre apoios, Leprevost fugiu de qualquer rótulo de direitista e buscou tom conciliatório: “política não pode ser um Athletiba”. Apesar do tom visto como neutro durante a entrevista, o pré-candidato adotou uma linha conservadora sobre ocupações urbanas, criticando-as, e defendeu um lucro ‘’razoável’’ para as empresas do transporte coletivo.

Confira:
 

Brasil de Fato Paraná: Como o senhor avalia o cenário de disputa para as eleições de Curitiba no ano que vem?

Ney Leprevost - Acredito que o cenário está completamente aberto. As eleições são só apenas ano que vem. Portanto, nesse momento existem muitos balões de ensaio, mas acredito que tem muita água para rolar embaixo da ponte. O cenário está publicamente aberto, eu sei que todas as pesquisas que são feitas apontam o meu nome em primeiro lugar, mas eu não vejo um cenário consolidado nesse momento a favor de um ou de outro candidato.

Pretende ser candidato à prefeitura de Curitiba? Quais apoios o senhor pretende buscar?

Eu tenho um sonho de ser prefeito de Curitiba, mas é um sonho e não uma obsessão que eu vou buscar custe o que custar. Eu tenho muita gratidão pelos curitibanos, fui o vereador mais votado de Curitiba, fui o deputado estadual mais votado de Curitiba, na última eleição fui o deputado estadual mais votado da grande Curitiba, que é a soma dos 75 bairros da capital com os outros 28 municípios da região metropolitana. Então estou à disposição para servir aos curitibanos, mas não basta que eu tenha essa disposição.

Eu tenho essa energia, essa disposição, tenho ficha limpa. Tenho preparo administrativo, já provei isso como secretário de esporte e turismo, já provei como secretário de justiça, família e trabalho, onde fiz uma verdadeira revolução na empregabilidade do estado do Paraná. Mas as pessoas precisam querer que eu seja prefeito, e isso que eu vou sentir ao longo dos próximos meses, e não avaliando pesquisas, nem conversando com políticos, mas andando nas ruas, nos bairros, nas comunidades, nas praças, nas feiras, nos parques, ouvindo as pessoas.

Se os curitibanos entenderem que chegou a hora, que é esse o momento, eu estarei à disposição para atender esse pedido. Mas o principal é, antes de fazer qualquer coisa, na política, primeiro combinar com o povo, afinal de contas, está escrito na Constituição Federal que todo poder emana do povo. 

O senhor teve uma disputa acirrada com o atual prefeito Rafael Greca nas eleições de 2016. Passados dois mandatos, qual a sua opinião sobre a atual gestão?

O atual prefeito Rafael Greca, não acho um mal prefeito, entendo que ele cuida bem da área de zeladoria da cidade, principalmente nos bairros do anel central. Os parques da cidade estão bem cuidados, as praças estão bonitas, pelo menos a maioria delas, mas eu entendo que podemos fazer melhor. O que o Rafael Greca fez de bom deve ser mantido, mas nós podemos e devemos, temos a obrigação, dever de fazer mais pelos mais pobres, pelos mais humildes.

Eu entendo que a gestão pública da cidade precisa se voltar mais ao ser humano, principalmente às pessoas que passam por situação de vulnerabilidade social. Curitiba está muito carente na área de moradias, para as famílias mais pobres, Curitiba precisa melhorar o atendimento de saúde, dar agilidade na fila dos atendimentos médicos. E precisamos resgatar a autoestima dos professores municipais, e isso se faz também valorizando-os monetariamente, não só com bons treinamentos. Precisamos cuidar do problema dos moradores de rua, que está cada vez maior, antes que a cidade passe a ter uma “Cracolândia”.

E tem algumas questões arrecadatórias da atual gestão que são exageradas. O IPTU em Curitiba, por exemplo, é muito alto. E eu entendo que nós temos que pensar também em dar mais transparência na questão dos radares. É importante a prevenção de acidentes de trânsito, mas em Curitiba muitos moradores avaliam que hoje é uma indústria da multa. Nós temos que saber qual é a empresa que opera esses radares, quanto arrecada, se esse recurso está sendo destinado para campanhas de educação no trânsito, se vai para recuperação de pessoas que sofreram acidente de trânsito, temos que abrir essa caixa preta dos radares de Curitiba. E temos também a questão do transporte coletivo, acredito que é possível buscar gradativamente, de forma segura, baixar a tarifa de ônibus, visando chegar até a tarifa zero. Para isso vai ser necessário muito diálogo com os operadores do sistema de transporte da cidade, muita transparência, enfim…o que é bom tem que continuar, mas tem muita coisa que ainda precisa ser feita, principalmente para os que mais precisam, para os mais humildes, para as pessoas que vivem na periferia e nas comunidades.

Apesar de ser visto como um candidato mais conservador, o senhor fez uma aliança com o PCdoB em 2016, e chegou a se aproximar do deputado estadual Goura, ambos de esquerda. Pretende procurar algum campo político ideológico específico para as eleições do próximo ano?

Minha candidatura não é atrelada a nenhuma ideologia. Eu me considero uma pessoa humanista, defendo a democracia, tenho compromisso firme com a liberdade. E como prefeito de Curitiba, caso venha a ser candidato e ser eleito, eu tenho que conversar com o governo estadual, conversar com o governo federal, apresentar projetos, pleitos, tanto aqui no Palácio Iguaçu, como em Brasília. O diálogo vai ser republicano, cordial e respeitoso, como deve ser nas relações democráticas.

A minha ideologia vai ser servir a cidade, é esse o ideal de um bom prefeito. Não é se vincular a uma cartilha ou a outra, existem pessoas boas nos mais variados campos ideológicos. É claro que eu tenho uma postura um pouco mais conservadora, mas não sou nenhum radical, nenhum extremista. Consigo dialogar de forma muito tranquila com todas as pessoas, sem nenhum tipo de preconceito e quero trabalhar por conciliação para que a cidade tenha pessoas que vivam de forma feliz, solidária, e para que a gente possa, caso venha a ser prefeito, fazer uma gestão construtiva onde Curitiba seja um município onde reine a paz, a alegria e a fraternidade entre todos.

Eu não vejo política como o futebol, uma disputa, como temos aqui no Paraná, um Athletiba. A política que traz uma gestão que traga frutos para a população, ela deve procurar sempre buscar a conciliação entre as pessoas. Queremos unir Curitiba, queremos unir as pessoas em torno de um projeto de cidade, para fazer de Curitiba, dentro dos próximos 30 anos, um modelo de gestão eficiente e moderna, valorizando e utilizando a tecnologia, utilizando o nosso principal recurso, que são os recursos humanos qualificados da nossa cidade, uma das melhores capitais para se viver no planeta. Eu quero começar esse projeto para que Curitiba, em no máximo 30 anos, seja uma das melhores capitais para pessoas viverem, e esse é o nosso legado que a gente poderá deixar para os nossos filhos.

O senhor cita a questão social e de moradia como pautas que pretende levar na campanha. Como pretende tratar a questão das ocupações urbanas organizadas por movimentos populares, que, entre outras pautas, pedem aluguel social ou que a fila da Cohab se acelere?

A fila da Cohab evidentemente precisa ser acelerada em Curitiba, a capital do Paraná está investindo muito pouco em moradia popular, ao contrário do que fizemos no governo do estado. Eu, quando fui secretário de justiça, família e trabalho, busquei recursos junto ao BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento] e fornecemos esses recursos para Cohapar em cidades onde havia uma fila que estava estagnada, para construir casas populares de qualidade.

Portanto, a reivindicação dos movimentos sociais pedindo moradia digna e pedindo que seja acelerada a fila da Cohab, não é uma reivindicação errada, o que há de se tomar cuidado é a forma de fazer essa reivindicação. Eu sou claramente contra a “invasão” de propriedades particulares, porque sigo à risca, e jurei quando assumi meu mandato, cumprir a constituição federal, e a constituição federal coloca, em seu artigo 5º como cláusula pétrea, junto com o direito à vida, o direito à liberdade, junto com direito à privacidade, o direito à propriedade, portanto a reivindicação é justa. Nós pretendemos tirar do papel os programas para construir habitações populares em Curitiba.

Eu conheço bem a questão do aluguel social, socorri vulneráveis quando era secretário de justiça, direito e trabalho, em diversas oportunidades utilizando-se deste expediente, inclusive para pessoas que foram removidas de ocupações. Então é um enfrentamento que faremos sem problema algum e que precisa ser feito, hoje é um dos maiores problemas da cidade, e a tendência é que isso se agrave caso nada seja feito, inclusive expondo a riscos a população mais vulnerável, que muitas vezes acabam ocupando áreas que são fundos de vales, beira de rios e colocam-se à mercê de sofrerem acidentes devido a enchentes e outros problemas climáticos.

Semanas atrás tivemos uma fala polêmica da presidente da Fundação de Ação Social (FAS) pedindo a remoção de moradores de rua e uso da Guarda Municipal para causar medo. Como o senhor avalia esse tipo de atitude por parte da atual gestão? Pretende propor qual abordagem em relação às pessoas em situação de rua?

É uma fala totalmente inapropriada e infeliz, uma fala que não leva em conta todos os aspectos que fazem com que essas pessoas vivam na rua. Tem pessoas que estão na rua por falta de moradia, tem pessoas na rua porque querem, tem pessoas que estão na rua porque sofrem de dependência abusiva de álcool e de drogas, e o melhor caminho para tirar essas pessoas da rua, evidentemente, não é através de ameaças, mas de programas sociais sérios, onde essas pessoas tenham oportunidade de receber uma moradia popular ou um aluguel social. Essas pessoas precisam, no caso principalmente dos que são dependentes químicos ou aqueles que têm doenças mentais, receber tratamento médico adequado, ter o direito de fazer sua desintoxicação.

Mas em paralelo a isso, é preciso dar a elas a oportunidade de construir uma nova vida, e como se faz isso? Proporcionalizando cursos profissionalizantes, abrindo para elas ofertas no mercado de trabalho através de parcerias do poder público com a iniciativa privada e tornando os locais onde elas podem ser abrigadas nos momentos de crise atrativos para essas pessoas. Essas pessoas não podem ser enviadas para, entre aspas, lugares sem a menor condição de higiene e conforto. Para sair das ruas elas precisam ir para lugares onde elas possam receber assistência de fato, um local com assistentes sociais, psicólogos, médicos, profissionais que possam orientá-las, ajudá-las, e até em alguns casos conduzi-las para cura, porque muitas dessas pessoas estão doentes, afundadas em uma dependência permanente de drogas pesadas, como crack, por exemplo.

Então, a questão não é simples como parece, e não vai ser resolvida com ameaças, ameaça faz apenas o morador de rua se deslocar de um local para outro. Ameaça não resolve a situação, ela é um paliativo populista ineficiente e desumano.

Sobre a questão da tarifa zero: Curitiba, no passado, teve contratos de licitação no mínimo duvidosos com as empresas que operam o transporte da capital, e hoje temos uma das tarifas mais caras do Brasil. Como pretende abordar esse tema?

Eu acredito que nós podemos chegar a tarifa-zero de forma gradativa. A arrecadação de Curitiba para esse ano está prevista em mais de 12 bilhões de reais. Aqui o transporte público é subsidiado pelo município, o que é pago para as empresas de ônibus não é o valor que é pago pelo passageiro lá no ônibus. Então, no novo contrato é possível estabelecer um valor que precisa ser calculado evidentemente em todos os dados que não temos no momento, e que são dados internos da URBS que administra o transporte coletivo. É necessário se chegar em um valor para que as empresas privadas possam operar esse sistema de uma maneira que elas tenham seu lucro, o que é desejável em um país capitalista com economia de mercado, mas sem que a Prefeitura explore os passageiros, os usuários do transporte coletivo.

Uma das opções que pode ser estudada é o pagamento por quilômetro rodado. E a outra opção que pode ser também imaginada, e que tem que ser muito discutida com a sociedade, com os usuários do transporte coletivo, assim como as empresas que forem ser contratadas no futuro para fazer esse trabalho, é a opção do pagamento por passageiro transportado, sem que haja uma tarifa técnica e uma tarifa diferenciada para o passageiro.

Uma tarifa transparente, uma tarifa que a população saiba que a prefeitura está pagando por ela para as empresas. Eu não acho que é rápido fazer um transporte com tarifa zero em Curitiba, mas acredito que é uma meta que pode ser alcançada em médio prazo. Poderíamos começar com a volta da tarifa-zero aos domingos, isso não acarretaria nenhum prejuízo para as empresas, elas são pagas pela própria prefeitura, e não pelo usuário final, e depois disso ir ampliando gradativamente.

Mas para dar uma opinião mais certeira e efetiva sobre a questão, é só estando no exercício no cargo de prefeito para ter acesso a todas as informações. Infelizmente, o que se sabe através dos portais de transparência do município não é o suficiente para apresentar um plano imediato para conduzir essa questão para um bom desfecho.

Edição: Lia Bianchini