Paraná

TRANSPORTE E PODER

Sétimo artigo da série. A política da prorrogação dos contratos do transporte coletivo

Em 1981, o Governador Ney Braga, nomeado pela ditadura militar, nomeou Jaime Lerner para prefeito de Curitiba

Curitiba (PR) |
O que levou a vitória de Requião foram os ataques constantes a vinculação de Lerner com os empresários do transporte coletivo - Giorgia Prates

A licitação do transporte coletivo de Curitiba se arrastou desde 1954 até 2010, com fortes traços de fraude para que tudo ficasse como estava, sem mudanças das empresas que o exploram até hoje.

Em 1954, o então prefeito de Curitiba, Ney Braga, legalizou o transporte irregular das famílias que até hoje continuam no negócio.

Essas famílias faziam o transporte de forma irregular, disputando os passageiros com a Companhia Pública de bondes elétricos, que transportava 10 milhões de passageiros ano, enquanto o transporte irregular por ônibus levava em torno de 3 milhões de passageiros por ano.

Esse transporte irregular passa a ter forte influência política junto ao prefeito e à Câmara Municipal de Curitiba. Consegue sua regularização com um contrato de permissão, evitando assim a licitação pública para se ter concorrência de mais empresas.

A permissão foi concedida por 20 anos, até 1974. Com a garantia da permissão, conseguiram junto ao prefeito a desativação dos bondes. Houve muitos protestos principalmente de estudantes contra a permissão sem licitação, o fim dos bondes pelo menor preço da tarifa, melhor qualidade do transporte e sem poluição do ar.

Em 1974, Jaime Lerner é nomeado prefeito de Curitiba pelo governador Jaime Canet, por indicação de Ney Braga,  influenciado pelos empresários.

Como os prefeitos anteriores, Lerner não chamou a licitação. Seu sucessor, o empresário do transporte coletivo, Donato Gulin, obviamente ignorou a licitação , sendo que a permissão era até 1974. Em 1981, o Governador Ney Braga, nomeado pela ditadura militar, nomeou Jaime Lerner para prefeito de Curitiba, para seu 2º mandato no período de 1981 a 1984, período em que não fez a licitação.

Pressionado pelo movimento popular muito forte nessa época para fazer a licitação, reduzir os altos preços das tarifas e pela participação popular no Conselho Municipal de Transportes, apenas concordou em abrir uma vaga para os movimentos populares e para as associações de bairros no Conselho Municipal de Transporte.

Quanto à licitação, por pressão dos empresários que tinham mandatos na Câmara Municipal de Curitiba, em 1981 ele prorrogou as permissões por mais 10 anos até 1991.

As associações de bairros, sindicatos, as comunidades eclesiais de base da Igreja Católica continuaram a pressão, com denúncias no Ministério Público do Paraná.

Devido a essa pressão e sua forte vinculação com as famílias tradicionais da cidade, que há décadas dominavam esse rentável negócio do transporte coletivo, o prefeito Jaime Lerner saiu da prefeitura de Curitiba muito desgastado.

Em 1985, foram restabelecidas as eleições diretas nas capitais e áreas de segurança nacional.

Nessas eleições, houve uma forte polarização entre Jaime Lerner e o deputado estadual Roberto Requião. Requião, que vinha militando no movimento de associações de bairros, desde 1975 e com forte apoio dos movimentos populares, vence Jaime Lerner por 13 mil votos.

O que levou a vitória de Requião foram os ataques constantes a vinculação de Lerner com os empresários do transporte coletivo. Essa luta projeta Requião, que prometeu e cumpriu que iria intervir no transporte coletivo para acabar com a roubalheira dados os exorbitantes preços das tarifas.

Logo que assumiu com o parecer da nulidade dos contratos feito pelo famoso advogado Geraldo Ataliba, fez a intervenção com dois decretos municipais, anulando os contratos. A administração do serviço passou para a URBS, nomeada uma nova diretoria empresa de economia mista.

Requião introduziu a tarifa pública e controlou os custos por meio da frota pública de noventa ônibus expressos adquirida pela prefeitura. Não chamou a licitação por temer a articulação dos empresários. Durante toda a sua gestão, os conflitos com os empresários foram constantes, até  os empresários se tornarem vitoriosos ao conseguirem anular judicialmente o fundo da frota pública aprovada por lei na Câmara Municipal de Curitiba.

Com o beneplácito da Justiça, recuperaram o controle privado dos custos operacionais do transporte coletivo de Curitiba até hoje, sem mais os parâmetros de comparação de custos  vigentes até a anulação da frota pública.

O Ministério Público do Paraná (MPPR)  teve êxito em sua ação e conseguiu, finalmente, em 2009, por decisão judicial, que a Prefeitura Municipal de Curitiba realizasse a tão esperada licitação após décadas de luta.

 

 

 

 

Edição: Pedro Carrano