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Delator da Lava Jato

De caçador de marajá a delator de Moro: quem é Tony Garcia?

Empresário surgiu na campanha de 1990 ao Senado, foi preso por fraude e chegou a delatar o “amigo” Beto Richa

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Político paranaense se tornou pesadelo para lavajatistas ao denunciar espionagem e irregularidades na atuação da força tarefa - Reprodução redes sociais

De “sujeito alto, bonitão, com cara de super-herói americano”, como disse numa entrevista o publicitário Jamil Snege, a delator do ex-juiz e atual senador Sérgio Moro (União-PR). A vida pública de Tony Garcia, empresário, ex-candidato à Prefeitura de Curitiba e ao Senado, tem mais a trajetória de um verdadeiro anti-herói.

Amigo de celebridades como Ayrton Senna e Xuxa, no início dos anos 1990, o empresário e “playboy”, depois de alguns anos afastado dos holofotes após ter delatado o “ex-amigo”, ex-governador e atual deputado federal Beto Richa, voltou às manchetes, desta vez por delatar o ex-juiz Sérgio Moro. Em diversas entrevistas, Garcia tem relatado sua experiência como “informante” da Operação Lava-Jato, com denúncias de grampos ilegais e até referências a uma possível festa em suíte de hotel cinco estrelas em Curitiba entre juízes do TRF-4 (que analisa em segunda instância as decisões da Lava Jato) e prostitutas.

De caçador de marajás à prisão

Antônio Celso Garcia teve um início de carreira política promissor. Empresário, começou como uma espécie de “caçador de marajás” das Araucárias. Em 1990, resolveu se lançar na política pelo PPB, então liderado por Paulo Maluf, como candidato ao Senado, na onda do ex-presidente Fernando Collor. Como ele, tinha cara de galã, prometia combater os “marajás” do serviço público contra os “perigosos sapos barbudos vermelhos”, uma alusão aos candidatos da esquerda.

Jamil Snege, conhecido publicitário paranaense, e um dos marqueteiros de várias campanhas de Garcia, conta: “Quando ele falou em sair para senador, achei uma coisa um pouco pretensiosa. Mas, em função da bela imagem que tinha na época e ainda conserva – sujeito alto, bonitão, com cara de super-herói americano – achei que daria para trabalhar a imagem em termos físicos”, afirmou em entrevista ao portal “Memória Paranaense”, do jornalista José Willie.

Garcia perdeu a eleição em 1990 e outras duas, em 1998 e em 2002, além de uma candidatura à Prefeitura de Curitiba. Era próximo do grupo político do ex-prefeito e ex-governador Jaime Lerner, que reunia de empresários, como Joel Malucelli, a figuras como seu então amigo de “kart” Beto Richa. Tony circulava pela Assembleia Legislativa nos anos 1990 como deputado estadual, em negociatas suspeitas e acordos com o governo Lerner. Chegou a se engajar na oposição a Lerner durante o processo de tentativa de venda da Copel, antes de selar as pazes com o Palácio Iguaçu num jantar retratado pelo jornal “Folha de Londrina”, em 2002, como tendo sido regado a “salmão e vitela”.

Imagem desmorona

A imagem criada por Snege, de jovem combatente da corrupção, começa a desmoronar em 2004, dois anos depois de sua última disputa eleitoral. Acusado por fraude pelo Ministério Público do Paraná na administração do extinto Consórcio Nacional Garibaldi, liquidado pelo Banco Central em 1994, Garcia teria sido responsável por prejuízo a clientes de mais de R$ 40 milhões. Dez anos depois, seria preso e, um ano após, seu advogado, o ex-conselheiro de Itaipu Roberto Bertholdo seguiria o mesmo destino. Um dos procuradores que atuaram nessa investigação foi Carlos Fernando dos Santos Lima, que se tornaria um dos principais nomes da Lava-Jato.

O delator

Tony Garcia sempre circulou na alta sociedade paranaense. Fez amizade com o ex-governador Beto Richa no início dos anos 1990, graças a uma paixão em comum: o automobilismo. Amigos dè kart, Garcia chegou a ajudar na primeira campanha de Richa a vereador de Curitiba, em 1992, numa época que o pai do amigo, o ex-governador José Richa, dizia que o filho não tinha perfil para a política. “A gente conversava sobre amenidades. Era um cara muito simples, de um trato maravilhoso, com pessoas boas ao lado. Casou com a Fernanda, a vida dele mudou, mas a gente continuava correndo juntos”, disse Tony sobre Richa em entrevista à “Gazeta do Povo”, em 2018.

É justamente em 2018 que a amizade de longa data chega ao fim. Tony se transforma em pivô de um dos maiores escândalos da política paranaense, que levaria o antigo “compadre” para a cadeia. Conversas gravadas por ele com Richa, e membros do governo do amigo, revelaram um esquema de fraudes em licitação no Programa Patrulha no Campo, foco da Operação Radiopatrulha, desencadeada pelo Gaeco, do MP paranaense.

As conversas gravadas acabariam por levar Richa à prisão à véspera da eleição para o Senado que Richa perderia. Passados mais cinco anos, em 2023, Tony ressurge, desta vez dedurando o “mocinho”. Em depoimento sigiloso à Justiça Federal, afirmou que teria gravado Beto de maneira irregular a mando da Lava-Jato.

Em seu perfil no Twitter, disparou: “Me usaram como agente infiltrado. Essa é parte da sentença onde Moro faz elogios eloquentes a mim em deslindes de casos complexos de interesse da justiça. Deixa claro que, para ele e o MPF, eu era “o cara. O que mudou?”, afirmou. Garcia ainda publicou um trecho de sentença assinada por Moro em que é elogiado como empresário que “participou de diligências destinadas a colher provas”. As acusações vêm causando pesadelos em Moro e seu grupo político, como causaram antes a outros “amigos”. É ver os próximos capítulos.

Edição: Frédi Vasconcelos