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Mês da Mulher

MULHERES ARTISTAS: Amor pelas artes resiste, mesmo com o machismo e lutas do dia a dia

Se forem mães, o caminho fica ainda mais difícil, solitário e excludente para as mulheres que trabalham com arte

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Mulheres, artistas, trabalhadoras, mães relatam os desafios de se manter no mundo das artes - - Arquivo Pessoal / Gilson Camargo

Etarismo, machismo, preconceito e desigualdade de gênero nas artes.Mesmo com tantas dificuldades, “continuar sendo artista é pelo amor.” Essa é a síntese da resposta dada por mulheres artistas entrevistadas pelo Brasil de Fato Paraná.Nas histórias, três delas dizem como encontram forças para superar as dificuldades.

Mãe solo, periférica,  e o amor pela arte

A atriz, produtora e fotógrafa Juliana Biancato começou a se interessar por artes no bairro Boqueirão, em Curitiba, onde voltou a morar recentemente. “Eu fazia parte de um grupo de jovens na comunidade e participava de peças de teatro, coral. Até que, aos 14 anos, passei fui aprovada numa peça que iria viajar pelo estado e fui com eles”, conta. De lá para cá, começou com fotografia e, depois, com a área de produção, principalmente na música e no audiovisual.

Juliana se apresenta como mãe solo periférica e diz que os desafios são diários. “São muitos os desafios, até pela sobrevivência, para pagar as contas e colocar comida em casa. Eu preciso fazer muitos trabalhos, taxas em bares e eventos”, relata.

Ainda diz que o mercado é cruel para as mulheres. “Não podemos envelhecer, não podemos ficar para trás nas tendências de estética e nos círculos “mainstream”,fala. Apesar das dificuldades, o amor a faz continuar. “É uma resposta simples, mas não tão fácil na vivência. É o amor, é a arte que mora em mim ou que foge de mim, é o amor que pode nos paralisar diante dos arrebatamentos e é justamente o que nos move na transformação para a matéria arte em decomposição eterna.”

Fotógrafa para ocupar seu lugar no mundo

“A minha vida era bastante limitada, numa Curitiba classe média. A fotografia me levava para outros modos de vida e trazendo curiosidades, uma vontade de estar com as pessoas. Com o tempo fui transformando isso em uma profissão”, conta a fotógrafa e professora Milla Jung. Há mais de 20 anos atuou como fotógrafa documentarista e, há cerca de 10 anos, na área multimídia.

No início foi bastante difícil por viver com uma geração de fotógrafos bastante machista. “Ser mulher na fotografia sempre foi muito difícil, lá atrás eu vivia com uma geração de fotógrafos muito machistas que vinham do trabalho de rua. Isso significava ter corpo para carregar o equipamento. E, também, que o fotojornalismo precisava de um olhar mais objetivo, e achavam que as mulheres estavam ali só atrapalhando caminho”, diz.

Para Milla, apesar de muitas transformações e conquistas, o mundo das artes ainda é bastante difícil para as mulheres, ainda mais se for mãe. “Ser mulher e mãe é quase uma impossibilidade no mundo das artes. Ter um filho é quase como você decretar que está fora do circuito artístico e da vida acadêmica. O etarismo, a misoginia e o machismo são gravíssimos nas artes”, cita.

Perguntada por que não desiste, responde que é para ter seu lugar no mundo. “Continuo para não ficar doente. É o que me faz respirar, é o meu lugar no mundo. Se eu olhasse para este sistema da arte, o que me traz de retorno, eu não continuaria. É um trabalho de resistência, de organizar minha própria raiva, minha reação com o mundo.”

Artista iniciante em busca de estabilidade

A poetisa e produtora cultural Maluz desde criança sempre teve muito interesse por leitura e escrita. Hoje se realiza na poesia e há oito anos atua na produção cultural, mas somente em 2022 conseguiu trabalhos remunerados. Maluz passou por vários obstáculos. “Queria cursar Cinema na Faculdade de Artes. Tentei duas vezes e não passei. Não consegui por ser periférica e precisar conciliar estudos, cuidar de irmã mais nova e trabalhar”, diz.

Mais tarde se formou em Tecnologia de Produção Cênica, depois do cursinho solidário em Curitiba. A partir daí, Maluz atuou em assistência de produção, mas sempre de forma voluntária. “Essa área ainda é vista como algo solidário. No início quase não pagam. Só comecei a ser remunerada mesmo em 2022”, diz.

Maluz também cita sua nova realidade de mãe sem rede de apoio e as dificuldades para conciliar os trabalhos. “Acabo tendo que levar meu filho e, se não tiver outras mãos pra ajudar, é muito solitário e pesado. Mas tenho conseguido pegar trabalhos com uma outra visão de mundo, que conseguem entender e dar uma assistência.”

Edição: Frédi Vasconcelos