Paraná

Crise hídrica

Com perdas de toneladas de alimentos, agricultores reivindicam serem ouvidos pelo governo do PR

Desabastecimento de água causou prejuízo que poderia ter sido evitado, apontam agricultores familiares

Curitiba (PR) |
“Tivemos uma perda irreparável, mas que poderia ter sido contornada se o governo nos ouvisse", relata agricultor familiar - Foto: Giorgia Prates

A crise hídrica no Paraná, que se somou à pandemia, trouxe perdas de toneladas de alimentos, especialmente soja, milho e feijão. Na outra ponta, o preço da comida chegou mais cara para a população. Mas essa crise não foi a primeira e nem a mais intensa. Lá atrás, na década de 90, algumas lições foram aprendidas e soluções já tinham sido apontadas, em momentos semelhantes ao atual. Porém não foram executadas.

Diante desse cenário, agricultores familiares relatam dificuldades econômicas. “Tivemos uma perda irreparável, mas que poderia ter sido contornada se o governo nos ouvisse. Com a estiagem, até o momento, 70% das lavouras de milho e soja foram perdidas”, relata o agricultor Jair Dobner. Ele e sua esposa Edilene Garbozza Dobner são agricultores familiares da Linha Formiga, em Francisco Beltrão. Produzem milho, soja e trigo para venda e também fornecem para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

O último relatório de estimativa de perdas preparado pelo Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento, aponta que as perdas na cultura da soja ultrapassam oito milhões de toneladas. No caso do milho, foram perdidos, mais de 1,5 milhão de toneladas, o que representa queda de 36% na projeção inicial de 4,2 milhões de toneladas. Já os agricultores que cultivam o feijão, terceira principal cultura neste período, perderam 83,8 mil toneladas, o que representa 30% a menos que a previsão.

Para Jair, o governo estadual poderia ter se antecipado à crise. “Muita coisa precisava ter sido feita. Nossa principal reivindicação agora é isentar os juros do investimento para custeio, os investimentos que o agricultor tem feito nos bancos e na compra de insumos para a produção agrícola”, diz.


Jair Dobner  e a esposa Edilene Garbozza Dobner são agricultores familiares da Linha Formiga, em Francisco Beltrão. / Arquivo pessoal

Para reforçar as reivindicações dos agricultores familiares do estado, no ano passado, em audiência pública, deputados do Bloco Parlamentar da Agricultura Familiar da Assembleia Legislativa do Paraná entregaram ao secretário da Agricultura e Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara, o documento “Pauta Emergencial e estruturante das organizações e movimentos sociais populares do campo e da cidade.”

Assinado por várias organizações da agricultura familiar, o documento reivindica medidas como a criação de um programa de auxílio emergencial que garanta renda neste momento a 40 mil famílias de pequenos produtores e camponeses que se encontram, devido à crise hídrica, em situação de vulnerabilidade social.

Para a deputada Luciana Rafagnin, líder do Bloco Parlamentar, “sem apoio, as famílias vão desistir da atividade rural e a situação ficará caótica. E na outra ponta, se não tivermos uma ação firme hoje, voltada para o campo, o drama da fome e empobrecimento da população como um todo só vai aumentar,” defende.

Crises do passado já apontavam soluções

Os problemas trazidos com a seca histórica no Paraná se potencializaram, neste momento, devido à falta de políticas públicas voltadas para a preservação do meio ambiente. Essa é uma das análises feitas por Robson Formica, coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

“Nas décadas de 1990 e 2000, o Paraná sofreu crises mais críticas que esta, comprovado por dados e relatórios de órgãos como a Agência Nacional de Águas (ANA) e do Instituto Água e Terra (IAT), Sanepar e a própria Secretaria Estadual do Meio Ambiente. E lá atrás já haviam sido apontadas soluções que, se tivessem virado políticas públicas, teriam evitado muito o desabastecimento de água, por exemplo”, analisa.

As políticas que deveriam e devem ser adotadas, segundo Formica, são as voltadas para os cuidados com mata ciliar, preservação de mananciais e nascentes, córregos e também pensar políticas de reordenamento territorial, além de uma política que olhe a questão da captação de água nas áreas urbanas.

“Essa crise está sendo potencializada com efeitos maiores por conta do avanço do modelo de desenvolvimento econômico que vê a preservação ambiental como obstáculo dos interesses de acumulação do capital. Temos a Sanepar com uma política de lucro com a água. Embora seja fornecedora de água, hoje, tem como objetivo principal  a transferência de dividendos, principalmente, para acionistas privados. Eles lucraram na pandemia e o usuário ficou com a conta mais cara,” conclui.

A reportagem do Brasil de Fato Paraná entrou em contato com a assessoria do governo do Paraná. Até o momento, não houve retorno.

Edição: Lia Bianchini