Wilner Rosier dorme pouco ou quase nada. E corre muito. Carismático e tranquilo, atende dezenas de pessoas. Trabalha no centro. Ajuda no bairro Tatuquara. Atravessa a capital várias vezes no dia. Residente no Brasil há dez anos, esse haitiano vive na área de ocupação Nova Esperança, em Campo Magro, e exerce a solidariedade em outras comunidades urbanas, no Campo Comprido e Tatuquara.
Desde o começo da pandemia, com o agravamento das condições de vida no governo Bolsonaro, novas áreas de ocupação surgiram e com forte presença da comunidade haitiana. O que evidencia a necessidade de moradia, mas também a contribuição cultural e organizativa deixada pelos haitianos.
É o caso de Rosier. Ele era presidente de uma associação de moradores no Haiti, com 200 integrantes, na cidade de Gonaives, quarta maior cidade do país. Acredita que a experiência é essencial para o papel que desenvolve hoje. Afirma que, no país caribenho, organizava projetos de trabalho voluntário. Em Campo Magro, a comunidade haitiana sempre se reúne, construiu uma igreja, horta comunitária, entre outras ações. “Estamos aqui para construir casas de material, colaborar, na parte econômica, cultural e social”, explica.
Base social
Em pesquisa feita pela prefeitura de Campo Magro (dado hoje desatualizado), dentre 720 famílias, 224 são oriundas do Haiti. Já na ocupação Nova Guaporé 2, próxima do centro de Curitiba, entre 101 famílias, cerca de 15 são haitianas, conformando uma comunidade consistente.
A União da Comunidade dos Estudantes e Profissionais Imigrantes (UCEPH) informa que, em 2019, havia 19 mil haitianos vivendo no Paraná. Os desafios são imensos. Entre eles, está a falta de renda. Noutro sentido, a exploração e o peso do trabalho informal. De 689 famílias, de acordo com a mesma pesquisa em Campo Magro, somente 175 possuíam fonte formal de renda. Outro problema sério é a falta de vínculo das crianças com a rede estadual e municipal de ensino.
O racismo e a xenofobia são cotidianos, o que oculta a própria formação e capacitação que os migrantes já traziam na bagagem. “Queremos oferecer, mas nem sempre temos oportunidade para mostrar o que sabemos. Eu sou cozinheiro, mas há preconceito. Vi dois amigos abrirem restaurante com a culinária haitiana, mas não foram para a frente por preconceito das pessoas”, critica Rosier.
Em entrevista ao programa Sul do Mundo, do Brasil de Fato Paraná, realizado no dia 25 de junho, Wilzort Cenatus, logístico e estudante de Agronomia, presidente da UCEPH, definiu que “O imigrante representa a força motriz do país”. Ele diz que um imigrante, que fica cinco anos trabalhando no país, é para o povo e para o governo brasileiro. Quando sai, deixa tudo aqui. E reafirma que um imigrante é para construir o Brasil.
Comunicação possível
Já a haitiana e professora de línguas Nadine Hyppolite passou a organizar cursos de línguas na ocupação em Campo Magro de forma a evitar ruídos na comunicação do dia a dia entre brasileiros e haitianos.
“A intenção do curso, assim que conheci Campo Magro, veio na minha cabeça de fazer cursos na intenção de familiarizar as pessoas. Casos em que as pessoas quando não entendem o que haitianos falam, às vezes podia gerar mal entendidos. Eu trouxe também outras colegas de faculdade para dar cursos de português para os imigrantes, para facilitar a entrada no mercado de trabalho”, descreve.
Edição: Lucas Botelho