Paraná

SEGURANÇA PÚBLICA

Governadores querem endurecer leis penais e defendem prisão por ''suspeita fundada''

"Você suprimir os direitos individuais das pessoas é abrir um precedente terrível", afirma especialista

Curitiba (PR) |
Outra proposta visa permitir a prisão em caso de abordagens de policiais que não tenham sido feitas de forma em elementos objetivos - Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Encontro na última semana com o ministro da justiça Ricardo Lewandovski, governadores participantes do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) apresentaram quatro propostas sobre segurança pública, entre elas, a prisão por ''suspeita fundada''.

O Cosud está liderando uma série de propostas que visam enfrentar o crime organizado e reforçar a segurança pública.

Os governadores do Paraná, Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina, Goiás, e Rio de Janeiro estão entre os líderes que defendem mudanças significativas na legislação e na abordagem em relação ao sistema prisional e à segurança pública.

Um dos pontos-chave da iniciativa é o aumento do período de cumprimento de pena no regime fechado antes da migração para o semiaberto.

A medida defendida pelos governadores quer garantir uma abordagem mais rigorosa em relação aos criminosos condenados, reduzindo as chamadas "saidinhas" e fortalecendo o controle sobre os detentos.

Outra proposta visa permitir a prisão em caso de abordagens de policiais que não tenham sido feitas de forma em elementos objetivos. A abordagem do policial poderia ser feita com base em um comportamento suspeito ou “condição que tenha levado a uma análise com elementos subjetivos do policial”.

Além disso, os governadores propuseram ajustes no Código Penal e na Lei de Execução Penal, visando tornar as penas mais rígidas para crimes específicos, como homicídio praticado sob ordens de facções criminosas.

Eles também destacaram a importância da regularização e compartilhamento de informações entre as forças policiais para monitorar eletronicamente condenados e permitir prisões em flagrante mesmo sem elementos objetivos de suspeita.

O governador do Paraná, Ratinho Júnior, enfatizou a necessidade de uma ação mais incisiva, argumentando que as leis atuais são inadequadas para lidar com a criminalidade. "Não é possível hoje você ter um criminoso que é condenado a oito anos de prisão e depois de dois anos ele já está na rua, muitas vezes cometendo crime novamente", afirmou.

Essa preocupação também foi ecoada pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que defendeu penas mais rigorosas para crimes graves. "Não é possível que haja a possibilidade de liberar-se alguém que praticou um homicídio, que tirou a vida de alguém com dois anos, dois anos e pouco de cadeia. É importante que haja um cumprimento da pena mais rigoroso para essas pessoas", declarou Leite.

Populismo penal

No entanto, o especialista em segurança pública Marcelo Jugend, ex-chefe de gabinete da Secretaria de Segurança Pública do Paraná, tem uma visão crítica sobre as propostas apresentadas pelos governadores.

Para Jugend, essas propostas são ''populistas'', pois acabam com prerrogativas importantes como a presunção de inocência e trabalham apenas com a lógica de punição, sem focar em ações e políticas públicas de prevenção para evitar que pessoas entrem na criminalidade. ''A pessoa ser suspeita não tira dela a presunção de inocência, você prender todo mundo não resolve a criminalidade''.

Além disso, Jugend destaca a necessidade de uma abordagem mais abrangente no combate à criminalidade, que não se limite apenas à punição dos infratores, mas também inclua políticas públicas e ações preventivas para evitar que as pessoas entrem no mundo do crime. Ele argumenta que medidas ''como investimentos em educação, emprego e inclusão social são fundamentais para abordar as raízes do problema da criminalidade e reduzir a ocorrência de crimes. 'É preciso desmontar o mecanismo que faz as pessoas caírem na criminalidade. Você suprimir os direitos individuais das pessoas, é abrir um precedente terrível, e trata a questão de um ponto de vista artificial. A questão é trabalhar na causa, e garantir a presunção de inocência'', afirma.

Lewandowski

A proposta dos governadores foi apresentada ao Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, durante uma reunião em Brasília na última semana. Lewandowski destacou a necessidade de uma ação conjunta entre as polícias locais e federais, enfatizando a importância da integração e troca de informações para enfrentar o crime organizado.

"O crime organizado, as milícias e as facções não triunfarão porque o Estado brasileiro tem instrumentos suficientes para enfrentar esse desafio e vai utilizá-los", declarou Lewandowski. Ele ressaltou a importância da integração não apenas entre os estados, mas também com o governo federal, para combater efetivamente a criminalidade.

Mais equilíbrio

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, prometeram discutir as propostas apresentadas pelos governadores. No entanto, Pacheco alertou para a necessidade de uma abordagem equilibrada, evitando medidas excessivamente punitivas.

"É muito importante que a gente não caia também na armadilha de achar que ficar criando tipos penais, aumentando combinação de penas, aumentando causas de pena, etc, que isso vai resolver o problema. Nós temos que ir trabalhar com inteligência e ir direto ao foco, combater a criminalidade organizada, haver melhor integração entre as polícias, legislação que seja eficiente sem populismo penal", afirmou Pacheco.

Resumo das propostas:

1. Alterar as regras das audiências de custódia, introduzindo o conceito de "reincidência criminosa", o que permitiria a detenção preventiva mesmo na ausência de uma condenação definitiva, desde que haja evidências de uma história recorrente de delitos por parte do indivíduo.

2. Classificar como homicídio qualificado os assassinatos cometidos sob ordens de organizações criminosas, resultando em penas mais severas para os responsáveis por esses crimes.

3. Regularizar e facilitar o compartilhamento de informações entre os diversos órgãos policiais, especialmente no que diz respeito à supervisão eletrônica de indivíduos condenados.

4. Ampliar as condições para efetuar prisões em flagrante durante abordagens policiais, mesmo na ausência de elementos evidentes de suspeita, visando aprimorar a capacidade de ação das forças de segurança no combate ao crime.


Você suprimir os direitos individuais das pessoas, é abrir um precedente terrível, e trata a questão de um ponto de vista artificial. A questão é trabalhar na causa / Marcelo Jugend

Edição: Pedro Carrano