Paraná

"BREQUE DOS APPS"

“Breque dos Apps”: entregadores sinalizam greve dos aplicativos de delivery em Curitiba e Região para dia 20 (quarta)

"O maior desafio é o controle do Estado sobre as empresas", afirma Sidnei Machado, professor de Direito do Trabalho

Curitiba (PR) |
Além da regulamentação, o movimento reivindica melhorias nas condições de trabalho na plataforma de Delivery IFood - Emerson Nogueira

do Parágrafo 2

Entregadores de aplicativos de delivery e motoboys de Curitiba e Região Metropolitana prometem uma greve para o dia 20 de março, que também deve ocorrer em outras capitais e cidades do país no mesmo dia.

O objetivo do movimento é reivindicar melhorias nas condições de trabalho da categoria, além de se posicionar sobre o tema da regulamentação recente do segmento.

Em Curitiba e Região Metropolitana, entregadores já realizaram uma primeira paralisação, no dia 29 de fevereiro, motivada pelos atrasos nos repasses de pagamentos semanais da empresa Ifood. Esta paralisação dos serviços motivou os entregadores a convocarem uma nova greve para o dia 20, agora para reivindicar que as plataformas criem melhores condições de trabalho para a categoria.

Outras capitais também devem realizar manifestações conjuntas. “Vai ser nacional, São Paulo, Goiânia, Brasília, a princípio também vão aderir à greve. Estamos querendo que todas as cidades do Brasil parem juntas, para ver se conseguimos brecar o Ifood a nível nacional, para reivindicar nossas melhorias, porque já passou da hora”, é o que relata "Samurai", que é entregador e integrante do movimento.

Regulamentação

Entre as pautas do movimento estão a regulamentação da categoria dos entregadores. No dia 4 de fevereiro, o governo federal assinou o Projeto de Lei Complementar (PLC) sobre a regulamentação dos motoristas de aplicativos, que deve tramitar no Congresso Nacional antes de ser aprovada. O PLC deixou de lado os entregadores. A categoria teme que um projeto semelhante que favorece apenas as empresas seja aprovado.

De acordo com Samurai, “a maioria dos motoboys são contra uma alíquota de 7,5% porque o valor proposto é inviável, visto que a plataforma ultimamente não está tão boa como antigamente, os valores estão menores, ganhamos menos por km rodado, gasolina e peças da moto aumentaram e já existe o MEI que permite a contribuição. O melhor seria exigir que se pagasse o MEI para podermos contribuir com o INSS”.

Além da regulamentação, o movimento reivindica melhorias nas condições de trabalho na plataforma de Delivery IFood, que concentra a maioria dos entregadores. Entre as reivindicações estão aumento da taxa mínima por entrega, que atualmente é de R$ 6,50; fim do bloqueio temporário após a recusa de corridas enviadas. Hoje, após recusar quatro corridas, o entregador fica bloqueado por 15 minutos; a retirada da opção do agendamento para fazer entregas, que não é obrigatório, mas coloca limite de entregadores por horário.

A regulamentação e os direitos trabalhistas

Para Sidnei Machado, professor de Direito do Trabalho da UFPR e coordenador do Grupo de Pesquisa Clínica de Direito do Trabalho (CDT-UFPR) - Trabalho e Direitos, “O problema central das plataformas digitais é o seu modelo de negócio ancorado no trabalho autônomo e a prática de péssimas condições de trabalho. Os salários são baixos, há elevada jornada e as empresas controlam e praticam um despotismo sobre os trabalhadores”.

Diante desse cenário de precarização do trabalho, o maior desafio é o controle do Estado sobre as empresas. “O desafio é o Estado, por meio de uma lei, controlar as plataformas e garantir direitos trabalhistas a esses trabalhadores”, destaca Machado. No entanto, os impasses diante de uma regulamentação trabalhista para as plataformas de Delivery, tem causado incertezas sobre a garantia de tais direitos.

“O projeto de lei, apresentado no início de março pelo governo Lula, somente contempla de fato os motoristas de aplicativos. Os entregadores não foram incluídos porque não concordam com o modelo proposto de trabalho autônomo e remuneração apenas do tempo de entrega. Mas o iFood também não concordou com vários dos pontos que entraram na proposta dos motoristas. Então, para os entregadores a disputa pela regulação continuará”, aponta o professor de Direito.

“Os entregadores têm uma condição de trabalho mais vulnerável que os motoristas. Trabalham em motocicletas, há muitos trabalhadores que fazem com que a concorrência por trabalho entre eles seja grande. Isso faz com que o tempo de espera sem remuneração seja imenso e as tarifas cada vez mais reduzidas. O caminho é uma regulação forte no setor de entregas de comida e mercadorias, que garanta pelo menos uma tarifa adequada por quilômetro rodado e remuneração pelo tempo de espera para retirar a comida. Mas a questão do acesso aos direitos trabalhistas plenos é que garantirá a eles uma condição melhor de trabalho, pois assegura o direito a férias, limitação da jornada e direito à aposentadoria.”

Arrecadação previdenciária sobre o lucro das empresas

Sobre as críticas apresentadas pelos trabalhadores sobre o PLC apresentado pelo governo federal, o professor de Direito do Trabalho da UFPR, diz que a saída correta seria que a arrecadação previdenciária incidisse apenas sobre o lucro das empresas.

“Realmente a proposta do governo para os motoristas têm pontos críticos. A questão da contribuição à Previdência Social é um deles, pois os trabalhadores passariam a pagar 7,5% sobre uma parcela da tarifa; enquanto atualmente pelo MEI o valor é menor. Isso poderá impactar na renda dos trabalhadores. A empresa passará a contribuir também para a previdência, mas ela têm a possibilidade de transferir esse custo para o consumidor ou mesmo para os trabalhadores. Não há saída fácil, mas a direção correta é criar regras que façam com que o custo seja pago pelo lucro das plataformas, ou seja, incidir sobre o seu faturamento.”

Ao que tudo indica, a regulamentação para os entregadores será benéfica às empresas como o Ifood, como temem os trabalhadores.

“O iFood defende uma regulação fraca e que viabilize a continuidade de seu modelo de negócio. Mas é preciso uma verdadeira regulação que controle as plataformas, reduzam o seu poder e assegurem direitos aos trabalhadores em igualdade de condições com os demais trabalhadores brasileiros que são empregados.”, conclui Sidnei Machado.


Diante desse cenário de precarização do trabalho, o maior desafio é o controle do Estado sobre as empresas / Emerson Nogueira

 

Edição: Pedro Carrano