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Qual é o significado do tapa da PM na cara de um jovem da periferia?

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O tapa na cara é ferramenta de terror, porque nos tira a dignidade, porque comunica através da violência que não somos cidadãos - Foto: Divulgação / PMPR
Todo jovem periférico já presenciou ou sofreu perseguição policial

"Tapa na cara pra te desmoralizar/ Tapa na cara pra mostrar quem é que manda/ Porque os cavalos corredores ainda estão na banca", O Rappa, Tribunal de rua.


Um tapa na cara, uma rasteira, uma bicuda no estômago, uma revista violenta, um flagrante forjado, um tiro pelas costas, o caminho da violência policial é imprevisível, a certeza é de que se você é periférico vai ser alvo.

Me lembro da primeira vez que um cara foi morto no meu bairro. Ele fugiu de uma abordagem, eu estava brincando na rua quando a moto passou em alta velocidade seguida por uma viatura, eles viraram a esquina e eu ouvi uma sequência de tiros. Naquela noite pairava no ar um clima de breu, a escuridão não vinha só da noite, era também da morte.

Relato essa memória de infância não por ser uma exceção, mas por ser regra. Todo jovem periférico já presenciou ou sofreu perseguição policial, não existe presunção de inocência, nossas mães nos ensinam como agir em caso de abordagem desde cedo, elas odeiam quando a gente quer usar boné, até para comprar pão na padaria a gente vai com a identidade no bolso, isso não é do nada, são táticas populares de sobrevivência à violência perpetrada pelo Estado.

O tapa na cara é ferramenta de terror, porque nos tira a dignidade, porque comunica através da violência que não somos cidadãos, que não temos direitos, eles se alimentam de nossas lágrimas, você já viu o sadismo nos olhos de um agente de segurança publica?

O vídeo que está circulando esta semana é um quadro comum na periferia, a policial extremamente violenta, não dialoga, apenas xinga e bate, consequência direta desse ‘modus operandi’ é que no imaginário social da periferia a policia se torna sinônimo de insegurança, medo e morte.

Sejamos realistas, em qualquer lugar do mundo as forças de segurança representam o monopólio da violência atribuído ao Estado, no Brasil a história colonial se funde e torna as forças policias algozes altamente treinadas para identificar a cor padrão – termo utilizado pela PM para definir pretos e pardos – e reprimir todo sujeito periférico, mesmo que ainda criança.

A democracia ainda não chegou à periferia, lá o estado de exceção é continuo. Por isso para nós é questão de necessidade resistir e sobreviver.
a filosofia do samba e do rap são certeiras e nos ensinam “erguer a cabeça”, “lavar o rosto” e seguir em frente porque “nada como um dia após o outro”.

Conceição Evaristo resumiu nossa história: "Eles combinaram de nos matar. Mas nós combinamos de não morrer".

É preciso mais que isso. Urge a necessidade de construirmos um projeto de segurança pública realista que responda as necessidades do povo brasileiro, pautada no combate ao genocídio da juventude negra e periférica, que reivindique a reformulação das forças de segurança, não basta pressionar os governos, precisamos permear o debate por meio da sociedade civil, construir consensos e linhas gerais com propostas concretas.

Do contrário helicópteros transportando toneladas de pasta base continuarão pousando em fazenda de políticos e mansões continuarão sendo deposito de fuzis enquanto crianças e jovens são brutalmente desumanizados nas periferias.

Entra ano, sai ano e a reivindicação básica que une qualquer periferia brasileira é Paz e Justiça.

Edição: Pedro Carrano