Paraná

MORTO NO ANO 2000

Corte Interamericana divulga sentença sobre assassinato do camponês Antônio Tavares na quinta (14)

Morte do trabalhador rural aconteceu em ação da Polícia Militar do Paraná que feriu outros 185 integrantes do MST

Rio de Janeiro (RJ) |
Ato junto a monumento que homenageia Antônio Tavares em Campo Largo (PR) - Juliana Barbosa/MST-PR

Será divulgada nesta quinta-feira (14) a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado brasileiro por omissão e não responsabilização dos agentes públicos envolvidos no assassinato do trabalhador rural Antônio Tavares. Ele foi morto pela Polícia Militar do Paraná em 2 de maio de 2000, em ação que deixou feridos outros 185 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

A Corte, vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA), analisa o caso desde fevereiro de 2021. Em junho do ano seguinte aconteceram audiências na Costa Rica, com a presença da viúva de Tavares, Maria Sebastiana; da sobrevivente Loreci Lisboa; de organizações representantes das vítimas; e de integrantes dos governos do Brasil e do Paraná, representando o Estado brasileiro.


Trabalhadores sofreram repressão policial durante manifestação / APP-Sindicato

A morte do camponês aconteceu em meio à realização da Marcha da Reforma Agrária, organizada em Curitiba para comemoração ao Dia Internacional de Luta dos Trabalhadores e Trabalhadoras. Um grupo de mais de 1.500 integrantes do MST sofreu repressão policial: uma tropa de agentes bloqueou a rodovia BR-277 e usou armas de fogo para impedir a chegada de uma comitiva de 50 ônibus à capital paranaense.

Antônio Tavares, que tinha 38 anos, era casado e tinha cinco filhos, foi atingido e morreu depois que ele e outros passageiros desceram de um dos ônibus. No mesmo contexto, outros trabalhadores e trabalhadoras ficaram feridos e não receberam socorro.


Antônio Tavares tinha 38 anos quando foi morto / Acervo familiar

Para o MST, o episódio é "um dos momentos mais emblemáticos do processo de violência e de criminalização da luta pela terra". O caso foi arquivado no judiciário brasileiro e, diante da impunidade, foi levado pelo Movimento e pelas organizações Terra de Direitos e Justiça Global à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Além disso, foi solicitado que chegasse à Corte Interamericana.

A coordenadora de incidência internacional da Terra de Direitos, Camila Gomes, destaca que o país se comprometeu a respeitar um extenso rol de direitos e, em caso de violação, mobilizar todas as instituições para poder promover reparação – o que não aconteceu no caso em julgamento.

"Para um caso chegar a essa etapa de ter uma sentença condenatória de um tribunal internacional, ele precisa ser um caso grave e muito emblemático de violações de direitos, mas ele precisa também não ter tido uma resposta adequada dentro do próprio país. Ou seja: são casos graves em relação aos quais as autoridades, as instituições do país não conseguiram dar uma resposta", afirma.

As entidades que fizeram a denúncia destacam que o contexto da época no Paraná era de muita violência contra trabalhadores e trabalhadoras do campo, com criminalização da luta pelo direito à terra, ameaças e assassinatos, como os de Diniz Bento da Silva (conhecido como Teixeirinha), Sebastião Camargo e Sétimo Garibaldi – o país já foi sentenciado na Corte pela morte de Garibaldi.

Julgamentos no Brasil

Inquérito policial militar instaurado dias após o assassinato de Antônio Tavares terminou com arquivamento do caso, sob o argumento de que os agentes atuaram com "estrito cumprimento do dever legal". O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná encerrou processo criminal sobre o caso, alegando que a Justiça Militar já tinha feito o arquivamento.

As petições ao tribunal internacional foram apresentadas após o esgotamento das possibilidades de justiça no cenário local. Por ter se submetido (voluntariamente) à Corte Interamericana, o Brasil deve acatar as decisões que forem tomadas. As decisões tomadas não são recorríveis e devem ser cumpridas.

A sentença desta quinta será recebida formalmente pelo Ministério das Relações Exteriores. Entretanto, a sentença é dirigida ao Estado brasileiro como um todo, o que inclui União, Estados e municípios. Diferentes órgãos, em todas essas esferas, podem ter de cumprir partes da sentença, portanto, e isso será acompanhado de perto pela Corte.

"[A Corte] vai estabelecer medidas específicas em relação às vítimas concretas, as pessoas que foram afetadas, mas vai também indicar as chamadas garantias de não repetição: medidas estruturais que o Estado precisa adotar para que essas violações não voltem a acontecer com outras pessoas", explica Camila Gomes.

Edição: Matheus Alves de Almeida