Paraná

PERFIL POLÍTICO

Professora Liliam (PT) é pré-candidata à prefeitura em Cascavel

"Sou a única nota dissonante" na cidade, afirma vereadora ligada a bandeiras populares

Curitiba (PR) |
“O papel do mandato foi fiscalizador. Fizemos o papel da denúncia e do contraponto. É sempre tenso porque eu sou a única nota dissonante" - Flávio Ulsenheimer

Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência. A frase de Marx é dita de bate pronto logo que a reportagem pergunta à vereadora Professora Liliam sobre a sua identidade e trajetória, na sala de aula e na política.

Isso porque, antes da sua atuação como vereadora em Cascavel, no Oeste do Paraná, e agora como pré-candidata à prefeitura municipal pelo Partido dos Trabalhadores (PT), Liliam construiu um currículo extenso e especializado em Educação, a partir do conceito de uma educação libertadora.

“Sou pesquisadora em política educacional, dentro da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) por 20 anos”, apresenta-se. Por contraditório que pareça, errou quem achava que o mandato seria monotemático a partir dessa pauta tão importante. “Não acho que eu seja uma vereadora apenas da educação, com a marca que eu imaginei que fosse”, revela.

Neste sentido, Lilian resume em três os principais problemas que visualizou na cidade polo durante essa caminhada: Saúde, segurança e meio-ambiente, problemas entremeados também pela ausência de moradia e regularização fundiária nas periferias.

Vereadora solitária na oposição, a professora teve a segunda maior votação no pleito de 2020, com 2.855 votos, 100 a menos que o vereador mais votado. Acredita que a atual definição do seu nome para concorrer à prefeitura pode surpreender numa cidade em que Lula teve cerca 33,10% dos votos no segundo turno de 2022. E onde avalia que a situação está fragmentada.

Pautas e problemas de Cascavel

Considera Cascavel, nas suas palavras, uma “cidade pujante, com boa qualidade de vida”, no entanto uma cidade bastante desigual, e Liliam aponta que a gestão de Leonaldo Paranhos da Silva (Podemos) se agarra numa construção de “imagem marqueteira”, sobretudo após o recebimento do Prêmio Cidades Excelentes, de segunda melhor cidade entre 100 e 500 mil habitantes.

“Há graves problemas no serviço público, segurança, saúde, a juventude negra e periférica está morrendo nos bairros, é uma cidade violenta em algumas regiões, mas o foco é repressivo, de ampliar condições de repressão, acentua segurança que é só repressiva”, critica.

Perigos do machismo

Liliam foi eleita e manteve-se como única vereadora de oposição e do PT. Anteriormente, essa posição era conduzida por seu companheiro, o indigenista, professor e fotógrafo Paulo Porto, com um mandato de oposição que já incomodava as elites locais.

De acordo com a atual vereadora, frações reacionárias e a mídia buscam vincular os dois nomes como forma de prevalecer o machismo e apagar a figura de Liliam. A imprensa, por sua vez, não se refere a ela como Professora Liliam, mas apenas com o sobrenome Porto, do casamento. Vale recordar que há vinte anos a cidade não elegia uma mulher. Liliam foi eleita em 2020, ao lado de outra professora - Beth Leal (Republicanos).

“Sinto que preciso ir com o pé na porta para estar nesses espaços. A imprensa só publica Liliam Porto e não Professora Lilian, como se eu tivesse herdado o mandato do Paulo, como se o Paulo abrisse o meu espaço. Temos que ficar sempre atentas”, adverte.

O inimigo no latifúndio

Descreve que esses quatro anos foram de duros embates e uma saraivada de críticas por parte da Associação Comercial de Cascavel, ao lado das entidades patronais que compõem o chamado "G8" de Cascavel - "há poucos capitalistas detentores de meio de produção e um empresariado extremamente conservador", descreve, na cidade na qual a Sociedade Rural do Oeste (SRO) historicamente buscou atacar a Jornada de Agroecologia e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

“As mídias me evitam. Ninguém me entrevista, como no caso da lei de dignidade menstrual, com atendimento para moradoras em situação de rua, que fiz em parceria com outra vereadora, não falaram de mim. A Câmara é um ambiente agressivo e desqualificador", lamenta.

O impacto do uso de agrotóxicos no entorno da cidade foi tema de lei municipal, de Paulo Porto, e ainda é objeto de luta para que seja cumprida. 

"Cascavel é uma ilha entre latifúndios de soja, o que afeta o ar e o solo, com índices altíssimos, reconhecidos internacionalmente, com ampliação de nascimento de crianças autistas. Ao longo do período de governo federal de Bolsonaro, o que houve foi o arrefecimento da denúncia. A lei municipal prevê limite de 300 metros de aplicação de agrotóxico, onde tiver escola e vila urbana”, aponta.


O sericicultor explica que o agrotóxico aplicado por avião nas plantações de cana é carregado pelo vento e atinge as folhas de amoreiras, principal fonte de alimento dos bichos-da-seda / Creative Commons

Articulação para o futuro

Liliam faz um balanço sobre o atual mandato. “O papel do mandato foi fiscalizador. Fizemos o papel da denúncia e do contraponto. É sempre tenso, porque eu sou a única nota dissonante", analisa.

Afirma que sua candidatura tem sido debatida no interior do PT de Cascavel há um ano, buscando agora articulações com PSB e PDT, a partir da figura de Goura.

Pensa que a apresentação de seu nome já gerou um certo rebuliço numa situação que, até aqui, está dividida. “Quem votou no Lula na próxima eleição, vota no PT. A direita está dividida, não temos um grande nome, não tem nada de novo”, aponta, otimista.

Quem é?

Liliam Porto, 58 anos

Formada em história pela Universidade Estadual de Campinas (1990), com mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2000), doutorado em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (2006) e pós-doutorado pela Unicamp. É professora Associada C da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, vinculada ao Centro de Educação, Comunicação e Artes - CECA. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em política educacional.

 

Edição: Lia Bianchini