Paraná

SAÚDE DA JUVENTUDE

Coluna da Juventude | Redução de danos pós carnaval

Organizamos uma lista de orientações sugeridas para esse pós carnaval

Paraná |
"nunca esquecer que a guerra é contra a população negra e periférica e não contra as drogas. Toda luta feminista e antirracista precisa ser antiproibicionista!" - Imagem criada pelo autor usando o Dall-E

Ao debater acerca do uso de drogas, é importante destacar que seu caráter proibicionista é datado e tem razões sociais e econômicas para sustentar uma lógica mercadológica, racista e classista. Até porque, algumas substâncias possuem determinadas funções em diferentes culturas, sejam valores subjetivos, religiosos ou terapêuticos. No entanto, associar determinadas substâncias enquanto nocivas com o objetivo de justificar sua proibição, serve a interesses lucrativos e de perseguição a determinados grupos sociais. 

Confira abaixo as dicas e orientações sugeridas para esse pós carnaval através da Redução de Danos

A discussão sobre o uso de drogas a partir de uma perspectiva antiproibicionista e que pensa o enfrentamento ao mercado ilegal de drogas enquanto uma questão de saúde pública e não apenas de segurança, tem sido objeto de estudo em várias partes do mundo, como no Uruguai, Portugal e, mais recentemente, no México e Canadá (Alvarenga, Rodrigo et al, 2021). 

Já no Brasil, contudo, a partir do nosso histórico escravocrata - o qual constitui uma população fortemente influenciada pelo mito da democracia racial - que traz o binômio racismo-pobreza como um marco estrutural, caracteriza e orienta seletivamente os processos de criminalização, prisão e homicídios no país. Desse modo, podemos nomear enquanto “guerra às drogas” uma política de genocídio e encarceramento em massa da população negra e pobre do Brasil. 

São, sobretudo, jovens negros e oriundos das classes sociais subalternas que constituem o núcleo preferencial da ação cotidiana do sistema de justiça criminal e repressão policial. Sendo 53% das vítimas jovens, em que 77% são negros e 93% do sexo masculino (Ferruguem, 2020). Cabe ressaltar que há todo um aparato ideológico cujo objetivo é sustentar o sistema capitalista e racista, o qual aparece cotidianamente na mídia e nos meios de comunicação hegemônicos, em que se associa o uso de drogas à periculosidade, à predominância nas regiões periféricas, ao crime organizado e em todos os casos: à população negra e pobre. Precisamente como objetivo de “justificar” e sustentar a violência e opressão em nome de uma suposta “ordem”, “segurança”.

Durante o carnaval esse debate vem à tona devido ao aumento do uso de substâncias psicoativas e as abordagens policiais se tornam respaldadas pelo argumento de que se tratam de ações de segurança pública, como foi a ação policial truculenta no Largo da Ordem, em Curitiba, no último dia 13 (terça-feira) de fevereiro. No entanto, pouco se diz sobre as forças de segurança que mantêm relação com os lucros gerados pelo comércio de drogas ilícitas. 
 


Tabela de combinações de drogas / Imagem: Reprodução / Twitter: @sentomesmo

Para muitos, o carnaval é sinônimo de vadiagem, libertinagem e depravação, o que complexifica ainda mais a discussão, já que o debate fica restrito a ideias conservadoras e moralistas. Outro aspecto importante de ser abordado é o aumento de 20% (MDH, 2019) do número de violência sexual contra mulheres durante o carnaval. O uso de substâncias lícitas e ilícitas juntamente com o machismo estrutural, nos trazem questões importantes para debater sobre estratégias de segurança e cuidado de grupos marginalizados, como também acontece com a população LGBT+. Contudo, queremos propor outro modo de pensar o uso de substâncias nesse período, para não cair em um debate moral e que tampouco negligencie questões de saúde. 

Após essa breve introdução sobre a nossa defesa de uma posição antiproibicionista ao debater o uso de substâncias psicoativas (SPAs), queremos trazer rapidamente algumas noções sobre a redução de danos enquanto um conjunto de ações de cuidado que podem auxiliar no manejo de possíveis prejuízos relacionados ao uso de SPAs, buscando minimizar os riscos causados pelo consumo de diferentes substâncias, sem necessariamente ter de se abster do seu uso, tampouco as tratando como estritamente nocivas a saúde. Nosso intuito não é demonizar o uso de substâncias psicoativas, até porque partimos da compreensão que elas podem, inclusive, ser usadas para fins medicinais, terapêuticos, religiosos, culturais etc. 

Partindo da compreensão de que o sujeito é ser ativo, agente pensante que tem capacidade de definir seus objetivos e tomar decisões de acordo com as condições materiais e objetivas da realidade. Entendemos como necessária a luta por melhores condições  de vida para a juventude da classe trabalhadora, para que assim existam possibilidades reais de escolha por hábitos de vida mais saudáveis e também melhores condições para experienciar o próprio uso de substâncias. Contudo, a partir do que já expusemos, sabemos que na maioria das vezes não temos as melhores condições para isso, além de sermos submetidos a condições adoecedoras, violentas e de riscos. Por outro lado, acreditamos que isso não nos impossibilita por completo de construirmos coletivamente algumas práticas que busquem formas de minimizar os prejuízos para nossa saúde. 

Nesse sentido organizamos uma lista de orientações sugeridas para esse pós carnaval através da Redução de Danos (RD), partindo da concepção de que é possível manejar o uso de psicoativos de uma forma mais eficaz que o proibicionismo.

1. Evite misturar álcool + comprimidos calmantes, solventes ou outros depressores: o efeito depressor é acentuado, podendo levar a alteração nos batimentos cardíacos, sonolência e parada respiratória.

2. A mistura de álcool + antibióticos pode causar  vômitos, palpitação, cefaleia (dor de cabeça), pressão baixa e dificuldade respiratória;

3. Álcool com dipirona potencializa o efeito do álcool;

4. Álcool com paracetamol pode gerar hepatite medicamentosa ou grave inflamação no fígado;

5. Caso queira beber muito, coma bem antes de sair de casa e leve junto uma garrafinha de água.

6. Se for usar alguma substância sintética (LSD, ecstasy, GHB), não use sozinha, esteja acompanhada de alguém que você confia, pelo risco de uma bad trip ou até mesmo situações de assédio e violência;

7. Procure lugares seguros para reduzir as chances de passar por situações de risco.

8. A mistura de álcool com crack ou cocaína leva a formação de uma substância tóxica chamada cocaetileno, aumentando os riscos de convulsão, problemas no fígado e parada cardíaca;

Por último e não menos importante: nunca esquecer que a guerra é contra a população negra e periférica e não contra as drogas. Toda luta feminista e antirracista precisa ser antiproibicionista!

Autoras:

*Ana Keil, fonoaudióloga e militante do Levante Popular da Juventude.
*Moema Fiuza, psicóloga e militante do Levante Popular da Juventude.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

Edição: Lucas Botelho