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Em qual Curitiba você vive?

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O foco da gestão também não está na educação infantil ou na moradia digna - Joka Madruga
Segundo a ONU, a capital do Paraná ocupa desde 2010 a 17ª posição do ranking da cidade mais desigual

Curitiba é uma cidade, mas não é a mesma para todos que moram nela. A depender do seu CEP, renda mensal e cor de pele, a cidade revela-se de modos diferentes, numa escala que varia entre ir ou não tranquilamente para o trabalho, acessar ou ter negado seu direito à saúde e manter-se ou não seguro em casa durante uma chuva forte.

Mas o que faz uma única Curitiba se transformar em tantas outras? A resposta é uma só: o perfil da gestão. Quem está à frente das decisões da cidade precisa considerar as múltiplas realidades que ela contém. Mas como enxergar essas realidades se a atenção da gestão continua ano após ano com o mesmo foco?

Um deles é o asfalto. Enquanto a Prefeitura anuncia mais de 800 km de asfalto novo, vemos obras apenas no Centro, com as melhorias nas ruas nunca chegando até as regiões periféricas da cidade. Além disso, esse foco se mantém nos carros, pois não existem novas implementações em infraestruturas viárias que contemplem outros modais, como a bicicleta.

Outro foco preferencial da gestão são as empresas do transporte coletivo, que têm seus lucros garantidos em contratos que não contemplam o direito social ao transporte, estabelecido pela Constituição Federal. Há décadas, o sistema de ônibus da cidade permanece nas mãos de poucos empresários, que enriquecem à custa do sacrifício de quem paga caro para andar espremido, em lotações sucateadas.

Podemos também falar do foco na sustentabilidade. A cidade sustentável que o prefeito adora vender na realidade sofre com índices de reciclagem cada vez menores e poucos incentivos aos verdadeiros agentes ambientais de Curitiba: os catadores e catadoras de recicláveis.

E se quisermos mudar o foco para a saúde, o que vemos é uma solução amplamente divulgada como uma grande inovação: a digitalização dos serviços, que direciona o acesso à consultas médicas por meio de um aplicativo (o Saúde Já Curitiba) para uma população que vive muitas vezes em situação de vulnerabilidade e sequer tem condições de acessar plenamente a internet.

O foco da gestão também não está na educação infantil ou na moradia digna, já que a cidade enfrenta filas enormes de gente aguardando vagas na creche ou sem ter onde morar (quem aí já percebeu o aumento da população em situação de rua)?

Cito esses exemplos, mas poderia continuar a lista, sobretudo porque estamos falando de uma das cidades mais importantes do Brasil - e uma das mais desiguais do mundo. Segundo a ONU, a capital do Paraná ocupa desde 2010 a 17ª posição do ranking da cidade mais desigual do planeta.

Curitiba tem potencial para ser exemplo de cidade inovadora para as pessoas, e não para uma inovação que só serve de propaganda para impressionar quem mora do outro lado do oceano.

Me pergunto em qual Curitiba os moradores daqui querem de fato viver. Qual seria a sua? Me conte pelo (41)99922-8881 ou no [email protected]

*Maria Leticia é médica-legista, ginecologista e vereadora pelo Partido Verde em Curitiba. Sua luta pela defesa das mulheres e da saúde começou antes de sua entrada na política, já que em 2012, fundou a ONG Mais Marias para ajudar mulheres vítimas de violência. Conquistou o primeiro mandato como vereadora em 2016 e desde então realiza um trabalho focado na construções de políticas públicas que tenham impacto real na vida das pessoas. Atualmente, preside a Comissão do Meio Ambiente da Câmara e é Procuradora da Mulher.

**As opiniões expressas nesse texto não representam necessariamente a posição do jornal Brasil de Fato.

 

Edição: Pedro Carrano