Paraná

MORADIA DIGNA

Com 16 anos, ocupação Portelinha sonha com regularização fundiária

Porém, Cohab admite que não tem projeto para a área, o que decepciona moradores

Curitiba (PR) |
Na reunião do dia 2 de fevereiro, moradores apontaram que continuam se mobilizando - Pedro Carrano

A área de ocupação Portelinha desde 2007 luta contra o silêncio, contra a violência e contra o esquecimento.

Assim mesmo, apesar de tentativas do poder público de vencer a comunidade pelo cansaço, não é possível deixar de notá-la. Cortada em duas áreas pela rua Rezala Simão, entre o final do bairro Santa Quitéria e começo do Fazendinha, a comunidade já foi tema do noticiário por conta da violência policial contra seus moradores

Mas nunca foi apenas essa a memória construída pela comunidade. Nesse meio tempo, na verdade, os moradores e lideranças não a deixaram parada. Pelo contrário, organizaram cursos, clube de mães, contam com atuação na área do Movimento de Organização de Base (MOB). No período recente de pandemia, também fizeram dossiê de 153 páginas com a história da comunidade. Criaram espaços coletivos. E agora querem retomar cursos de alfabetização, em parceria com coletivo de educadoras do MST.

Dessa forma, toda a lição de casa orientada pela campanha nacional Despejo Zero é cumprida pela Portelinha. O Despejo Zero hoje aglutina áreas do MST, ocupações urbanas e indígenas com risco de reintegração de posse e que buscam o direito à moradia. No seu processo, muitas áreas de ocupação têm aprendido que, quanto mais espaços comunitários e sociais num espaço, mais força.

No dia 2 de março, com mediação da Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Paraná, lideranças da comunidade, caso de Arildo Taborda, o “Dida”, e Jô Dias de Matos, participaram de nova rodada de negociação com a presença de representantes da Cohab, Procuradoria do Município, Fundação de Ação Social (FAS), Superintendência Geral de Diálogo e Interação Social do Estado do Paraná (Sudis), e com a presença também da Residencial Plano Leve, autora do pedido de reintegração de posse na área. A mediação ainda deve buscar presença do Ministério Público em reuniões futuras, bem como da prefeitura de Curitiba, ausente desse espaço de negociação.

Além da falta de respostas do poder público e de certezas sobre o futuro da comunidade, que está enraizada no bairro e quer prosseguir ali, as novidades foram duas: Foi a primeira mesa de negociação com a presença da Residencial Plano Leve, que ensaiou uma primeira proposta sobre negociação da área, o que ainda será formalizado, apontando, por um lado, anistia para as próprias dívidas, porém sem demonstrar interesse imediato na execução do despejo.

A outra questão é que, declaradamente, a Cohab admitiu, também pela primeira vez, não ter interesse e não ter previsão de projeto para o local, de acordo com a ata da reunião. A Companhia mista ficou ainda de fornecer mais informações que possui. Da parte dos moradores, por outro lado, a assembleia cheia mostrou insatisfação e até revolta com tantos anos de espera sem respostas em relação ao poder público.

“A empresa pela primeira vez esteve em mesa de negociação. Em 2017, entraram em contato com Ministério Público para negociação, mas a comunidade não estava presente. Não havia propostas, porque a empresa está em situação precária, existe formalmente, ganhou ação de reintegração de posse há muito tempo. A proposta foi feita agora, de R$ 24 milhões, não especificado como gostaria de obter esse valor”, apontou Luan Galindo, um dos advogados da comunidade, ressaltando que a construtora ficou de enviar proposta por escrito, a partir de cálculo sobre as dimensões da área e potencial construtivo (veja abaixo), de forma que a comunidade reaja com contrapartida à proposta.

Mobilização

Na reunião do dia 2 de fevereiro, moradores apontaram que continuam se mobilizando, unificando a parte de cima e de baixo da Portelinha – e devem participar da Jornada de Lutas do dia 7 de março, convocada por mulheres do campo e da cidade.

“E a gente vai lutar até o fim, não vai cinco pessoas conquistar e cinco pessoas perder. Ou todo mundo ganha ou todo mundo é despejado. Queremos jogar com o time que está jogando com a gente, que são os movimentos sociais e o Despejo Zero”, afirma uma das lideranças da região, Dida, um dos coordenadores da associação de moradores que está sendo montada.

"Pra nós todo o despejo é criminoso, na casa tem sonhos, todo o despejo é violento", acrescenta Joabe Oliveira, da coordenação estadual do MST e da campanha Despejo Zero.


Da parte dos moradores, por outro lado, a assembleia cheia mostrou insatisfação e até revolta com tantos anos de espera sem respostas em relação ao poder público / Pedro Carrano

Encaminhamentos

Na ata da reunião, constam como encaminhamentos: a empresa autora no processo, a Residencial Plano Leve deve encaminhar, em 15 dias, propostas de valores por escrito, bem como levantamento de dívidas em relação do imóvel em litígio e também dívidas da empresa em relação ao município e ao governo do estado.

A Comissão de Conflitos Fundiários deve mobilizar representante da prefeitura de Curitiba para acompanhamento das próximas audiências conciliatórias. A Comissão também deve oficiar a Cohab para apresentação de medidas administrativas e apresentação de documentos referentes ao caso. Além de busca de envolvimento do Ministério Público do Paraná, por meio da Promotoria de Habitação e Urbanismo.

Edição: Frédi Vasconcelos