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Carnaval

Resistência dos artistas, ancestralidade e universo drag vão para avenida em Curitiba

A escola de samba mais antiga da cidade irá levar para a avenida a comemoração dos seus 75 anos

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Bloco Afro Pretinhosidade - Foto Folia

Depois dos anos de pandemia e as ruas em silêncio sem o carnaval que, assim como várias outras festas e espetáculos, foram os primeiros a parar e os últimos a voltar. A expectativa é grande neste ano para quem curte e estava sentindo saudades dos blocos carnavalescos e escolas de samba. Maior ainda para quem se dedica e trabalha nesta grande festa popular.

O Brasil de Fato Paraná conversou com representantes de diferentes escolas de samba que irão participar do desfile, em Curitiba, na Avenida Marechal Deodoro. Além da alegria de voltar, os artistas, sejam os compositores, produtores, figurinistas, integrantes sentiram saudades e também sofreram o impacto da pandemia e destacam que o carnaval é uma manifestação cultural importante também para a economia do país.

A diversão aliada à temas políticos, sociais e culturais estarão presentes nas letras de música que desfilarão na avenida de Curitiba.

Resistência dos artistas periféricos

Paulo Bearzotti Filho que integra a comissão organizadora da Leões da Mocidade e também assina o enredo deste ano conta que o tema tratará de resistência. “ O tema deste ano é “Penso, logo resisto – Cultura e Cidadania no chão da periferia”. Um tema que debate a desigualdade na área da cultura principalmente porque os recursos ficam concentrados em certas atividades culturais sujeitas à lógica do mercado e um excesso muito grande de burocracia que inviabilizam, em princípio, os artistas de periferia. Mas baseados na sua consciência estes artistas resistem,” conta.

“O desfile da Leões da Mocidade vai trazer essas desigualdades, mas também vai falar das diferentes formas de resistência trazendo o hip hop, o funk, o samba, aqueles que fazem grafitem costura, os dançarinos numa perspectiva sempre inclusiva,” conclui Bearzotti.


Leões da Mocidade / Divulgação

Universo Drag

Giovanni Cosenza, produtor cultural e idealizador do Bloco Púrpura que desfila pela quarta vez em Curitiba, conta que nesse ano quem entra na avenida é o universo Drag. “A gente pretende abordar toda a variedade do universo drag, as drag queen, kings, monstras. Fizemos o convite para várias artistas de Curitiba que vão demonstrar sua identidade drag. Nossa intenção é mostrar tudo isso de uma forma bem plural,” conta.

Giovani lembra que chegaram a participar, em 2021, do carnaval digital organizado pela Prefeitura de Curitiba, devido à pandemia. “Fizemos nesta edição uma homenagem a Gilda e agora voltamos abraçando mais a comunidade LGBTI de Curitiba. Trazer essa temática é sempre importante que também combate preconceitos e mostramos que nossa comunidade é linda e unida,” lembra.


Bloco Púrpura / Divulgaçao

 

Ancestralidade

Allan Coimbra da Luz, da coordenação e produção do Bloco Afro Pretinhosidade, conta que a escola, neste ano, fará uma homenagem a mulher preta Iyagunã Dalzira que aos 82 anos tornou se doutora pela UFPR. “Como a grande maioria da raça negra, Iyagunã foi alfabetizada aos 13 anos, aos 47 concluí o ensino fundamental e aos 63 anos iniciou a graduação e recentemente conclui doutorado na Universidade Federal do Paraná. A gente pretende levar o nosso bloco da forma que sempre foi, com muito fundamento respeitando os mais velhos, nossa ancestralidade e na base de muita luta, suor e alegria que é a essência da raça negra,” conta Allan. 

Allan destaca que o Bloco Afro Pretinhosidade sempre teve a função de resgatar a alma e descendência negra do nosso povo. “ Fazemos isso principalmente nessa cidade que o nosso povo é constantemente invisibilizado e apagado,” diz.


Bloco Afro Pretinhosidade / Foto Folia

75 anos da escola mais antiga de Curitiba

Diogo Perez de Lima, presidente da Associação Cultural Embaixadores da Alegria, escola mais antiga de Curitiba.  Nesse ano nosso tema é “Folia de Reis” e de forma bastante lúdica vamos brincar com os vários reis existentes em nosso imaginário como o rei do futebol, o rei do rock, os reis das frutas o abacaxi, os três reis Magos, os reis do mundo, entre outros. Então o nosso Rei Momo convida estes reis da nossa história para a festa de 75 anos da Escola de Samba Embaixadores da Alegria, a escola mais antiga da cidade de Curitiba,” conta.


Embaixadores da Alegria / Divulgação

A volta do carnaval pós pandemia

A volta do carnaval presencial após dois anos de pandemia, para os carnavalescos, é aguardado com muita expectativa, alegria e, principalmente, para mostrar a importância da cultura para a cidade, tanto do ponto de vista de entretenimento como da economia.

Para Diogo, da Embaixadores da Alegria, a volta do carnaval é sim um renascimento de várias formas. “Falou de carnaval falou de cultura. E sim, é verdade que após período da pandemia é o renascimento da principal manifestação de cultura gratuita e democrática do país. Para o pobre e para o rico. Por isso, essa volta vem pra comemorar a vida e a saúde e também para mostrar que a cultura influencia na economia de uma cidade,” diz Diogo.

Já Bearzotti, da Leões da Mocidade, diz que a espera é pela alegria que o carnaval traz principalmente para os moradores da periferia. “A importância do carnaval é enorme. As escolas de samba que são uma comunidade, um movimento social que envolve centenas de pessoas e atividades.  Tudo isso ficou interrompido pela pandemia que acaba sendo uma interrupção da comunidade. O carnaval representa essa grande inversão do status social quando uma moça da periferia que no seu dia a dia tem uma função desvalorizada, na avenida ela é uma rainha. Então o carnaval celebra a cultura e essa ruptura de hierarquia coma alegria e vivacidade” diz

Para quem vive a resistência todos os dias e há anos, a pandemia foi só mais um capítulo de resistência. Essa é opinião de um dos responsáveis pelo Bloco Afro Pretinhosidade.

“Nossa primeira movimentação foi em reação a uma ação da polícia militar e ali nasceu a semente do bloco. Então, não será uma pandemia que vai tirar a gente da existência e da avenida, já resistimos a   380 anos de escravidão!,” diz.

Edição: Frédi Vasconcelos