Paraná

Direito à moradia

Estado e movimentos populares buscam mediação contra despejos no Paraná

Nota técnica e mesa de negociação apontam necessidade de esgotamento de alternativas antes de remoção

Curitiba (PR) |
Movimentos por moradia avaliam possível nova conjuntura no próximo período, com a mudança nos órgãos responsáveis pela regularização fundiária - Foto: Giorgia Prates

No período da pandemia, que aprofundou a crise econômica e social no país, medidas judiciais impediram a realização de despejos forçados no campo e na cidade. Mas, no dia 31 de outubro, havia grande expectativa, no Paraná e no Brasil, sobre decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro determinou então que os tribunais estaduais que tratam de casos de reintegração de posse instalem comissões para mediar despejos forçados, o que foi confirmado pelo plenário do STF.

O Paraná, em especial, foi citado pelo ministro como exemplo de diálogo entre órgãos do poder público e a articulação Despejo Zero, que envolve as áreas de ocupação. A Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Paraná (CCF/TJPR) tem feito visitas constantes às comunidades, emitindo pareceres e criando mesas de negociação com os movimentos populares. Em 2022, foram organizados três atos públicos que levaram à mesa de negociação com os órgãos do estado.

A negociação tem contado com a presença do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania para matéria fundiária (Cejusc Fundiário), da CCF, da Defensoria Pública do Paraná, Ministério Público, Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, entre outros órgãos.

Nota técnica

Os integrantes da CCF desenvolveram a Nota Técnica 01/2022. Entre outras questões, de maneira geral, o documento reconhece a função social da propriedade, a necessidade de não deixar famílias em situação de vulnerabilidade, buscando alternativas à reintegração de posse.

“Estamos com perspectiva de estabelecer regime humanitário e de transição para desocupações no Brasil inteiro. Caminhar para pacificação”, afirmou Fabiane Peruccini, juíza auxiliar da presidência do Conselho Estadual de Justiça, em reunião com a articulação Despejo Zero, em 4 de novembro.

Os movimentos por moradia avaliam também uma nova conjuntura no próximo período com a mudança de direção nos órgãos responsáveis pela regularização fundiária – caso do ministério das Cidades, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Fundação Nacional do Índio (Funai) e Fundação Palmares.

Além disso, a presença do dirigente do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) Guilherme Boulos na equipe de transição do próximo governo pode ser um sinal de reativação de alguma política para o segmento.

Medidas e garantias

Em estudo sobre a Nota Técnica e sua relação com a determinação do ministro Barroso, os movimentos populares visualizam que a reintegração de posse só pode ocorrer se forem esgotadas as formas de negociação e mediação do poder público.

Entre os requisitos para isso está a inspeção da área pela Comissão de Conflitos Fundiários, a interlocução prévia entre órgãos do Estado e a Comissão, além de apresentação por parte do poder público de um plano de realocação, mediante cadastramento prévio e apresentação de local.

Esse ponto do local da realocação, na visão das organizações populares, de forma geral, é o mais incerto, uma vez que fica a dúvida sobre qual destino o poder público daria às famílias. Além disso, os movimentos populares são críticos à ausência de participação da prefeitura de Curitiba nas mesas de negociação entre Comissão e articulação Despejo Zero.

Unidade na luta

Valdecir Ferreira, liderança do Movimento Popular de Moradia (MPM), que organiza cerca de cinco áreas em Curitiba e região, afirma que a não realização do despejo é uma medida humanitária e as organizações estão unidas em torno disso.

“Entendemos que, se houve auxílio no período de pandemia, importante também não ter despejo. Vamos nos unir em bloco para que nenhuma comunidade seja despejada”, afirmou, na reunião do dia 4.

A fala de Ferreira representa uma articulação que envolveu o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), áreas de ocupação do movimento indígena e ao menos dez áreas de ocupação, em Curitiba e Região metropolitana, que foram organizadas em período de pandemia.

Darci Frigo, da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), avalia que é necessário, no marco da realocação e da regularização fundiária, fundos públicos para garantir o direito das famílias. “Precisamos pensar de fato em fundos públicos de investimento para que as pessoas possam ter moradia digna”, afirma. 

Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini