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EDUCAÇÃO

Artigo | Lula lá! A educação e a cultura sustentarão nossa vitória

É tempo de construir e reconstruir, coletivamente, um projeto de educação democrática

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Nos primeiros dias da transição, demandas urgentes estão sendo encaminhadas. A educação já entrou na pauta. - Brasília - Agência Brasil (EBC)

A vitória de Lula foi a vitória do povo brasileiro. Há muito que se comemorar, afinal, foram quatro anos de medo, ameaças, perseguições, retrocessos, perda de direitos, empobrecimento do povo.

Foi uma grande vitória contra a máquina da mentira, a máquina do uso do dinheiro público, a máquina da ameaça aos trabalhadores, aos jornalistas, aos professores, aos indígenas, aos quilombolas. Foi a vitória contra a máquina do sigilo de 100 anos, contra a máquina que produziu desemprego e 33 milhões de pessoas que passam fome. Foi a vitória contra a máquina do corte de verbas das Universidades Públicas, a máquina armamentista, a máquina que se omitiu frente à morte de 700.000 pessoas na pandemia e zombou da vacina.

Trazer essa discussão na semana que se inicia a transição de governo ajuda a reafirmar a necessidade de mobilização constante. É fato que Bolsonaro está derrotado, no entanto, em seu entorno está a extrema-direita que sempre foi raivosa, histérica, violenta e parte dos seus integrantes tem muito dinheiro para financiar desde atos golpistas de rua, fechamentos de rodovias, até ações na internet.

Bolsonaro é o tocador de tambor de um movimento que o conduziu ao poder em 2018 e tentou reconduzi-lo em 2022. Esse movimento traz em suas entranhas os resquícios do colonialismo, do coronelismo, da escravização, do conservadorismo, misturado com as ideologias neopentecostais, da teologia da prosperidade e até com grupos nazifascistas, e permanece presente na sociedade brasileira e se incomodou com a derrota do tocador de tambor.

Com a eleição de Lula foi possível tirar a baqueta das mãos de Bolsonaro e ainda é incerto se haverá, e quem será o novo tocador do tambor. Nesse sentido, não é hora de esperar, mas de avançar no enfrentamento e no combate às ações da extrema-direita e dos movimentos nazifascistas. É hora de dar continuidade às lutas de resistência dos últimos anos na defesa dos direitos sociais, protagonizadas principalmente por sindicatos, por movimentos sociais, movimentos estudantis, povos indígenas.

Essas lutas, agora, se reafirmam como lutas de resistência, mas passam a ser também para dar condições ao governo Lula consertar os estragos do governo Bolsonaro, fazer o Brasil voltar a crescer, garantir os direitos sociais aos brasileiros e criar as condições para que os valores universais da solidariedade, dos direitos humanos, da justiça, da verdade e da democracia sejam compreendidos e defendidos, de maneira que a extrema-direita, o bolsonarismo e os grupelhos nazifascistas sejam reduzidos à insignificância.

Há extensos e necessários debates e escritos sobre as relações de Bolsonaro com a extrema-direita e com os grupos nazifascistas. Noam Chomsky, em entrevista à revista Jacobin Brasil, no mês de outubro de 2022, alerta sobre o avanço do fascismo no Brasil. Há inúmeras notícias que reportam o aumento do número de células nazistas no país. No campo econômico, o governo Bolsonaro adotou as políticas neoliberais, sob comando de Paulo Guedes. Nessas políticas de conluio com o capitalismo neoliberal empresas públicas, altamente lucrativas, foram privatizadas, empresários se apoderaram da administração de serviços públicos como educação e saúde, colocaram serviços públicos a serviço do lucro das empresas, em detrimento do direito do povo, impuseram a ideologia da meritocracia, a ideologia do empreendedorismo. Essas políticas econômicas geraram acúmulo de riqueza a alguns privilegiados à custa da miséria de milhões de brasileiros.

Bertold Brecht, dramaturgo, romancista e poeta alemão, num dos seus escritos no ano de 1935, intitulado “O Fascismo é a Verdadeira Face do Capitalismo”, dizia que “Se as causas evitáveis puderem ser identificadas, as más condições poderão ser combatidas.” Brecht fazia também o alerta que “O obscurantismo oculta as forças reais que causam desastres.” A afirmação de Brecht continua atual e contribui para que os brasileiros que não arredaram o pé das lutas se firmem ainda mais, e consigam ampliar o número daqueles que querem construir um Brasil melhor.

Para Brecht, há uma relação direta entre o capitalismo e o fascismo, portanto, o combate ao fascismo caminha junto com o combate ao capitalismo. Dizia ele: “Aqueles que são contra o fascismo sem serem contra o capitalismo, que lamentam a barbárie que sai da barbárie, são como pessoas que desejam comer carne de vitela sem matar o bezerro.”

A campanha de Lula foi alicerçada numa ampla aliança, que se mostrou necessária e vencedora. Essa aliança tende a se ampliar para garantir a governabilidade. Vale lembrar que, nessa aliança, estão os milhões de brasileiros que acreditaram no projeto de governo e na história de Lula. É na aliança com o povo que se terá a verdadeira garantia da governabilidade e da implementação das políticas sociais tão necessárias aos milhões de brasileiros em situação de pobreza.

Nos primeiros dias da transição, demandas urgentes estão sendo encaminhadas. A educação já entrou na pauta. Espera-se que seja contemplado os recursos financeiros para garantir a qualidade da educação, e que se dê atenção ao currículo, à concepção de educação, aos seus fundamentos, às políticas educacionais. Desde o governo Temer e passando pelo governo Bolsonaro os empresários da educação ditaram as diretrizes para a educação nacional com a aprovação da Reforma do Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular. Nesse tempo, a educação foi duramente atacada e precarizada.

Nos últimos seis anos, as condições de trabalho dos professores piorou, o desânimo da categoria com a profissão aumentou, a procura dos jovens pelas licenciaturas diminuiu. Foram anos de criminalização de professores, anos em que chamar professor de vagabundo, de privilegiado, de doutrinador passou a ser rotineiro. Criaram-se fantasmas em relação à escola como o kit gay, o banheiro unissex. Fantasmas disseminados por quem nunca entrou numa escola para conhecer de fato a realidade em que trabalham os milhões de professores no país, ou mesmo daqueles que desconhecem que o governo Bolsonaro cortou recursos das Universidades Públicas e até mesmo da merenda escolar. A qualidade na educação pública vem sendo garantida graças à dedicação dos professores comprometidos com a formação das crianças e jovens brasileiros.

Diante disso, com base nas contribuições de Brecht, reafirmamos a necessidade de combater o capitalismo para também combatermos o fascismo. Defendemos que a educação tenha seus recursos financeiros garantidos, que seja revogada a Reforma do Ensino Médio e a BNCC, que as disciplinas que compõem o Ensino Médio brasileiro tenham a garantia de carga horária nos três anos, especialmente Filosofia, Sociologia, História, Arte, Geografia. Que a concepção de formação do nosso jovem não seja pautada pelo mercado, mas pelo conhecimento científico, filosófico, sociológico, histórico, artístico e estético. Que a formação seja pautada pela emancipação humana, pela formação do pensamento crítico e que nossos jovens tenham acesso ao conhecimento historicamente acumulado e sejam sujeitos do processo formativo e da sua própria história.

A extrema-direita, o bolsonarismo e o nazifascismo não acabarão em função da derrota nas urnas. Há que se trabalhar na construção de um projeto societário alicerçado na cultura, e a educação é o espaço fundamental para que isso ocorra. Há que se dedicar esforços na construção das bases de sustentação de um projeto de nação que contemple as reais necessidades do povo brasileiro, garantindo a alimentação, moradia, esporte, lazer, trabalho, saúde, direitos humanos e, também, para que sigamos lutando pela superação do sistema capitalista, esse sistema de morte.

É tempo de construir e reconstruir, coletivamente, um projeto de educação democrática. É tempo de ir além. Esse tempo exigirá mais de todos que estão inseridos ativamente na vida prática na sociedade. É tempo de se dedicar a organizar a cultura, na perspectiva da concepção de Antônio Gramsci, de maneira que se criem processos de engajamento na sociedade, de agentes políticos, de agentes sociais, em vista da elevação da consciência e da elevação cultural das massas populares.

A Vitória de Lula deu condição para esse avanço e a sociedade espera que isso ocorra. Os votos de Lula são votos lúcidos, honestos e de esperança, do verbo esperançar! Na eleição, a civilização venceu a barbárie, e, se de fato queremos continuar lutando pela emancipação humana, temos muitas e importantes tarefas para já.

*Regis Clemente da Costa é doutor em Educação e professor na UFFS - Campus Laranjeiras do Sul

Edição: Lucas Botelho