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A voz do gesto: Semiótica e política no livro de Mario Milani

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bolsonaro e collor
Governador de Alagoas eleito pelo PMDB em 86, Collor era representante de uma tradicional oligarquia política, e foi membro da Arena e do PDS — legendas de apoio aos governos militares. - Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Aprovado pelo comando da campanha, o gestual ganhou vida nas diversas atividades de rua

No final dos anos 80, o governo José Sarney naufragava nas ondas da impopularidade, com uma inflação sideral e um tsunami grevista, que sacudia o país. Em 1988, o Partido dos Trabalhadores (PT) elegia a nordestina Luiza Erundina para a prefeitura de São Paulo, após um massacre do Exército, às vésperas do pleito, contra trabalhadores grevistas na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda (RJ), vitimando fatalmente três operários e ferindo dezenas.     

É nesse contexto, de ofensiva das lutas sociais e marcado por uma nova Constituição, promulgada em outubro de 1988, que o Brasil teria a primeira eleição presidencial direta, depois de quase 30 anos, em 1989.

A eleição para presidente da República reuniu na disputa personalidades políticas relevantes da vida nacional como Leonel Brizola (PDT), Ulisses Guimarães (PMDB), Mario Covas (PSDB), Aureliano Chaves (PFL), Paulo Maluf (PDS), Roberto Freire (PCB), Guilherme Afif (PL), o protofascista Enéas Carneiro (Prona), entre outros.

Na eleição de 1989 dois projetos políticos antagônicos polarizaram o eleitorado: de um lado, Luiz Inácio Lula da Silva, uma liderança sindical surgida nas greves do ABC paulista no final dos anos setenta. Lula participou ativamente dos movimentos pela redemocratização e tinha sido eleito deputado federal em 1986 com a maior votação (mais de 600 mil votos) até então obtida por um candidato à Câmara dos Deputados.

De outro, Fernando Collor de Mello (PRN), prometendo uma “caçada aos marajás” e a modernização neoliberal do estado brasileiro. Governador de Alagoas eleito pelo PMDB em 86, Collor era representante de uma tradicional oligarquia política, e foi membro da Arena e do PDS — legendas de apoio aos governos militares.

A campanha foi bastante acirrada, Collor apelou para o anticomunismo, atraindo os setores conservadores apavorados com o crescimento eleitoral de Lula. O candidato da Frente Brasil Popular (PT, PSB e PCdoB) praticamente triplicou seu número de eleitores no segundo turno, mas Collor venceu a disputa com 53% dos votos válidos contra 47% de Lula.

Uma campanha criativa e de massas em 1989

A campanha de Lula adotou o slogan “Sem Medo de Ser Feliz” que rapidamente empolgou a militância, um refrão do jingle cantado por Chico Buarque, Gilberto Gil, Djavan, e sempre acompanhado de um coro de atores e atrizes do primeiro time da Rede Globo.

Além disso, a campanha fez uma paródia da vinheta da Globo com a “Rede Povo”, que diariamente no horário eleitoral abordava o dia a dia da disputa eleitoral com humor e seriedade programática — uma composição que funcionou até o fim.

Um outro elo da engrenagem da criativa e eficiente propaganda do candidato petista foi o popular gesto com as mãos que faz um “L”. Uma criação do jornalista e publicitário paranaense Mario Milani, que apresentou a ideia no Encontro Nacional do PT, realizado em São Paulo, ainda no período pré-eleitoral.

Aprovado pelo comando da campanha, o gestual ganhou vida nas diversas atividades de rua e na propaganda eleitoral, nos comícios, nas passeatas, nas caravanas do candidato pelo país, nas panfletagens nas fábricas e bairros. Um sucesso instantâneo em 1989, e que criou uma poderosa e duradoura marca das campanhas petistas usada até hoje. E que se transformou em símbolo e código identitário da militância do PT.

Durante a vigília pela liberdade de Lula, encarcerado injustamente pela odiosa operação Lava Jato em Curitiba, o gestual foi intensamente repetido por milhares de pessoas e personalidades internacionais em visita ao líder petista. A marca do L foi divulgada em todo o mundo, facilitada pelo alcance dos aplicativos nas redes sociais.

O livro “A voz do gesto” de Mario Milani, com prefácio do ex-presidente Lula, vai nos contar os bastidores desse case, uma feliz e eficaz combinação entre semiótica e propaganda política.

Neste sábado (27), no Nina Comida e Arte, às 19h, o autor fará o lançamento da obra. Escrevi um texto para o livro. Aqui só é um aperitivo. Recomendo “A Voz do Gesto”.

Edição: Pedro Carrano