Paraná

Povos tradicionais

Violência contra territórios, povos e comunidades tradicionais é tema de aula pública

Evento foi organizado pelo mandato da vereadora Carol Dartora (PT) em parceria com Núcleo de Estudos Afrobrasileiros

Curitiba (PR) |
Aula Pública "Violência contra os territórios, povos e comunidades tradicionais", com Carol Dartora, Paulo Porto, Isabela da Cruz e Jovina Renhgá - Ana Carolina Caldas

De janeiro a agosto de 2021, segundo o relatório “Conflitos no Campo”, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), mais de 400 territórios tradicionais foram vítimas de violência, com destruição de suas casas e pertences, expulsão, grilagem e pistolagem, além do impedimento de acesso às áreas de uso coletivo. Desse total, 28% são territórios indígenas, 23% quilombolas, 14% de posseiros e 13% de sem terras, entre outros.

O enfrentamento e a denúncia diante da legitimação da violência no campo, águas e florestas pelo atual governo foi tema de uma aula pública na Universidade Federal do Paraná (UFPR), nesta sexta (01).

O evento contou com as falas da vice presidenta do Conselho Nacional das Mulheres Indígenas (Conami), integrante da Marcha das Mulheres Indígenas e escritora Jovina Renhgá, da quilombola, historiadora e advogada Izabela Cruz e do ex-vereador de Cascavel, indigenista e professor universitário Paulo Porto.

A  Aula Pública “Violência contra os territórios, povos e comunidades tradicionais" foi organizada pela vereadora Carol Dartora (PT) em parceria com o Núcleo de Estudos Afrobrasileiros, do Setor de Educação da UFPR (NEAB), SIPAD UFPR, UFPR Litoral e Setor de Ciências Humanas UFPR.

“É muito importante e significativo estarmos aqui dentro da Universidade e contando com a parceria de setores dessa instituição. É muito gratificante estar nesse espaço que muita vezes é tão elitista e ver essa diversidade de pessoas. [...] É importante que se faça essa ponte entre a academia e o que se efetiva realmente na sociedade e nesse caso, nas comunidades tradicionais”, destacou a vereadora.

Racismo ambiental

Dartora pontuou que a violência contra os povos e territórios tradicionais é resultado do racismo estrutural que existe em nossa sociedade.

“Primeiro a gente precisa considerar que a sociedade brasileira é organizada a partir do racismo estrutural. A nossa estrutura social se organiza pelos eixos de gênero, raça e classe. A partir disso, ao olhar para os territórios, podemos falar também do racismo ambiental que faz com que os territórios mais impactados pela falta de justiça ambiental sejam os territórios racializados. E que territórios são estes. Nas cidades, as periferias, e no campo, as comunidades indígenas, quilombolas, entre outras”, explicou.

“É preciso reflorestar a mente do povo”

“Estamos sendo violentados desde 1500. No Brasil de hoje, há cada vez mais desrespeito com os povos e territórios tradicionais. Estamos vendo a entrada do tráfico de drogas, de crianças, garimpagem e vendo gente que nos defende ser assassinada. É muito triste”, disse Jovina Renhgá.

Para ela, é preciso fazer com que todos se conscientizem de que o futuro do planeta está ameaçado. “Não falo só por nós, indígenas que estamos sendo violentados. Mas por toda a humanidade. O que será de nós daqui a 30 anos se agora as águas estão todas contaminadas? É preciso reflorestar a mente do povo. Se todos tiverem essa consciência, é possível salvar o futuro”, concluiu Jovina.

Para Isabela Cruz, quilombola e advogada, a luta dos povos tradicionais é a "coragem de ir contra o sistema". “A nossa luta é ancestral, mas também é a longo prazo. Falar das muitas violências que nos atravessam é dolorido porque lembram nossas feridas. Mas temos pacto com a memória, as pessoas que nos antecederam não lutaram em vão”, afirmou.

“O inimigo está no poder”

O indigenista Paulo Porto apontou que este é o pior momento do Brasil no que se refere à defesa dos povos tradicionais. “Espero, sim, que as eleições tragam o fim a este ciclo de mortes e ataques contra quem defende a natureza e vive nela. Tivemos governos até que não eram simpáticos à causa, mas atualmente temos um inimigo declarado. O inimigo está no poder”, disse.

Porto trabalha junto às comunidades indígenas do oeste do Paraná desde 1990 e denuncia que em todos esses anos pouco foi feito para as comunidades.

“Temos no oeste do Paraná 21 comunidades indígenas, sendo que 18 delas ainda aguardam reconhecimento. Além disso, há uma relação bastante perversa da Itaipu com essas comunidades. Muitas dessas comunidades foram desalojadas na década de 80 devido à subida das águas e nunca receberam indenização”, contou.

Para ele, é preciso defender neste ano eleitoral uma proposta civilizatória. “É preciso que um governo progressista tenha isso me mente, é preciso retomar a civilidade e, neste caso, respeito aos povos tradicionais”, concluiu.

Edição: Lia Bianchini