Paraná

ALFABETIZAÇÃO

A leitura com os olhos de Freire e de Cuba

Áreas de ocupação organizam cursos de alfabetização e contraturno escolar

Curitiba (PR) |
A tarefa abrange os turnos da manhã e da tarde. Nas terças, por exemplo, é dia na casa de Carla e ela exibe filmes para as crianças - Giorgia Prates

Áreas de ocupação e comunidades em Curitiba e região estão organizando experiências de alfabetização de jovens e adultos, contraturno escolar e reforço. Contando com apoio de educadores populares e ativistas, a organização dos espaços, em muitos casos, tem sido das próprias associações de moradores, combatendo um problema estrutural aprofundado com a pandemia: a dificuldade do acesso dos trabalhadores e seus filhos na periferia à educação. 

Estudo com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) aponta que 41% das crianças de 6 e 7 anos não sabem ler e escrever, maior índice de analfabetismo registrado no Brasil desde 2012.  

Há dois anos, Carla, presidenta da associação de moradores da ocupação Tiradentes, área habitada por 420 famílias, na Cidade Industrial de Curitiba, organiza o revezamento do contraturno entre as mães da comunidade. Ao todo, 47 crianças e jovens são atendidos. 

A tarefa abrange os turnos da manhã e da tarde. Nas terças, por exemplo, é dia na casa de Carla e ela exibe filmes para as crianças, numa forma de organização na qual ela incentiva a participação coletiva. “Montamos aulas livres de acordo com o que querem, um formato democrático no qual a maioria decide”, afirma. O espaço da biblioteca local também é usado.

Carla afirma que a pandemia e a ausência de políticas públicas na área da educação afetaram a educação das crianças. “Os pais tiveram que buscar o sustento da casa e não conseguem suprir a necessidade. Está difícil, é triste ver o semianalfabetismo na quarta série”, protesta. 


Carla afirma que a pandemia e a ausência de políticas públicas na área da educação afetaram a educação das crianças / Giorgia Prates

Alfabetização de trabalhadores e migrantes

Também marcada por ausência de regularização fundiária e incertezas próprias desse processo, caso de um incêndio apontado como criminoso, em dezembro de 2018, a área de ocupação 29 de Março, vizinha à Tiradentes, desenvolve projeto de alfabetização de jovens e adultos na biblioteca da comunidade. 

Juliana Teixeira, da coordenação da ocupação, comenta que o projeto é feito em parceria com ONGs e conta com educadoras populares, com fundamento na pedagogia de Paulo Freire, autor de “Pedagogia do Oprimido” e outras obras de referência mundial. 

A iniciativa, no fundo, partiu de demanda da área e atualmente atende cerca de 15 pessoas: “Muitos moradores não sabiam assinar e escrever. O projeto envolve pessoas mais de idade, migrantes e moradores que têm dificuldade de não conseguir ler uma placa de ônibus ou comprar algo”, comenta. 

Juliana ainda aponta que a comunidade desenvolve outros projetos a partir dessa iniciativa exitosa. “Temos projeto ligado ao vereador Renato Freitas (PT), que envolve música, literatura e cinema, todo sábado, além de projeto de montar e desmontar computadores e capoeira”, elenca. 

Apoio 

Ambas as iniciativas contam com apoio de entidades, ONGs e movimentos populares. As lideranças afirmam que, neste momento, optam por esse apoio na proposta de atividades educativas para preencher a grade horária, além de doações concretas. “Queremos um professor haitiano que ensine português aos migrantes”, afirma Juliana.  

Contato para colaboração:  

Juliana – 96440839  

Carla – 96404482 


uliana Teixeira, da coordenação da ocupação, comenta que o projeto é feito em parceria com ONGs e conta com educadoras populares / Giorgia Prates

Educação com DNA social

MST e coletivo Marmitas da Terra preparam educadores para ação em comunidades  

Um dos principais projetos envolvendo pedagogia popular e a demanda de áreas de ocupação organizadas tem sido desenvolvido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e pelo Coletivo Marmitas da Terra que, desde o início da pandemia, têm feito ações solidárias e organizativas. 

O coletivo prepara a realização do curso de alfabetização de jovens e adultos, em parceria com as áreas Nova Esperança, em Campo Magro, na vila Pantanal, no Boqueirão, e no barracão de carrinheiros Novo Amanhecer, abrangendo também a demanda do bolsão Formosa e da União de Moradores, que fica no bairro Novo Mundo. 

As comunidades, nas conversas iniciais, levantam a demanda, que será coordenada com militantes que atuam na educação, buscando formar também pessoas na comunidade para a capacitação, explica Elza Dissenha Costa, uma das coordenadoras da iniciativa, ela que integra também o Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos (EJA). “O coletivo de educação do Marmitas da Terra fez a formação junto com o MST a partir do método cubano “Sim, eu posso!”, associando com o método de Paulo Freire. Estamos indo nas comunidades formar alfabetizadores lá mesmo”, explica. 

Edição: Frédi Vasconcelos