Paraná

Aulas presenciais

''Este ano tem que acabar'': medo de contágio e outras marcas da pandemia

Desde setembro, aulas presenciais ocorrem no Paraná. Funcionários, professores e alunos falam de suas dificuldades

Curitiba (PR) |
Saúde mental afetada, dificuldades financeiras e medo do contágio são problemas comuns entre estudantes, professores e funcionários - Foto: Giorgia Prates

Matheus Bregenski é aluno do Colégio Estadual do Paraná, do terceiro ano do ensino médio. Vacinado com a primeira dose, assim como seus colegas de sala, tem tentado adaptar-se à "nova velha" rotina depois de boa parte de seu ensino médio ter acontecido entre aulas online ou com poucos colegas em sala.

“Minha experiência de voltar para o colégio, depois do modelo online, tem sido um pouco frustrante, principalmente pela Variante Delta. Tomei apenas uma dose, mas moro com meus avós, que são do grupo de risco, vou porque preciso, mas vivo preocupado em botar a vida deles em risco”, relata.

A realidade do jovem Matheus tem sido a de diversos outros estudantes, professores, pedagogos e funcionários da rede estadual de ensino no Paraná. Passados quase dois anos do início do estado de emergência sanitária, as marcas deixadas pela pandemia são profundas e os desafios enormes para a retomada, ainda ameaçada pela possibilidade de uma quarta onda da pandemia no Brasil.

A professora de Sociologia do município de Cambé, Camila Torres, conta que, desde que voltou ao “normal”, tem sido difícil e diferente ter que lidar novamente com alunos e colegas de trabalho. A professora, que atualmente está afastada, relata sentir pânico de ouvir o sinal tocando e afirma que a maioria tem desrespeitado as normas sanitárias, levando até a certa “banalização da doença” na comunidade escolar, e que tem dificuldades em lidar com salas lotadas e falta de circulação de ar.

“Exceto por dois ou três colegas, os demais aceitam sem grandes questionamentos, não se importam com salas lotadas, ausência de circulação de ar, falatório, refeitório lotado ou sala dos professores com janelas fechadas. Esse é o cotidiano”, conta.

Com problemas em sua saúde mental, Camila pretende recorrer juridicamente para ter direito à reposição sem ter o salário descontado, por ter medo da pandemia. “Estou sem perspectiva, pois nossa disciplina estará numa única série, me inscrevi no curso de formadores, a contragosto. Já tive duas vezes minha perícia indeferida.”

Rodrigo Tomazini, funcionário de escola, afirma que sente que o desejo de todos é que o ano acabe logo. Conta que o aumento da evasão escolar tem sido grande, assim como a dificuldade para os estudantes irem para a aula. “Muitas vezes os pais perderam o emprego e preferem que os estudantes fiquem em casa, já que os custos de deslocamento, por van, transporte coletivo, ou carro, têm sido altos. O medo também tem sido muito grande, muitos preferem ficar online, ou até desistiram”, relata.

"EaD é péssimo, mas retorno presencial foi precoce"

De acordo com dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a evasão escolar no Brasil atinge cinco milhões de alunos. Durante a pandemia de Covid-19, esses números aumentaram em 5% entre estudantes do ensino fundamental e 10% no ensino médio. Para os que ainda estão matriculados, a dificuldade foi de acesso, com quatro milhões de estudantes sem conectividade.

Matheus, que pretende fazer vestibular neste ano, afirma que sentiu na pele as dificuldades de estudar na pandemia, diz que ainda não conseguiu pegar ritmo. “A pandemia mexeu muito com minha saúde mental, então fiz a prova do Enem [Exame Nacional do Ensino Médio] desestabilizado. Eu sou péssimo com EaD [Educação a Distância], acho horrível, a qualidade é péssima, não aprendi nada no ano passado, mas o retorno presencial foi muito precoce a meu ver, é muito difícil manter o distanciamento social”, diz o jovem.

Além das dificuldades financeiras, de saúde mental, e o medo do contágio, em comum entre Camila, Rodrigo e Matheus está o convívio com o luto deixado pela pandemia. “Tenho vários colegas de sala de aula que perderam entes queridos e vejo como tem sido difícil lidar com o luto, muitas vezes são pessoas que sustentavam a casa”, relata Matheus.

A Secretaria de Educação do Estado foi procurada pela reportagem do Brasil de Fato Paraná para esclarecer a respeito das dificuldades enfrentadas pelas escolas na volta ao modelo presencial e quais ações a pasta prevê em auxílio psicológico, financeiro e social.

Até o momento do fechamento desta reportagem, não houve resposta.

Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini