As pressões, sobretudo em um cenário de crise econômica, social e sanitária, são a regra
Nenhum governo progressista e de esquerda está imune às pressões vindas dos setores conservadores, submetidos à visão de mundo do governo dos EUA.
Aliás, a regra parece ser esta. A instabilidade e as pressões, sobretudo em um cenário de crise econômica, social e sanitária, são a regra para quando as forças populares se colocam em luta pelo poder do Estado em dada conjuntura.
No caso peruano, as primeiras mobilizações sociais estouraram ainda em 2020, em um país marcado pela exploração neoliberal durante quatro décadas. Houve a queda de dois presidentes, o que tornou o cenário eleitoral mais disputado e polarizado.
Agora, em pouco mais de um mês de governo, o presidente Pedro Castillo, professor rural e sindicalista, eleito a partir de uma plataforma de mudanças estruturais, com forte base social camponesa e popular, enfrenta ataques da extrema-direita e, recentemente, embates vindos do interior das forças armadas, especificamente na chamada Marinha de Guerra.
Este setor militar ficou descontente com declarações do ministro de relações exteriores do país, Héctor Béjar, sociólogo e ex-guerrilheiro, que estava a apenas 19 dias no cargo. No seu lugar, Castillo foi forçado a uma concessão, nomeando o ex-chanceler Óscar Maúrtua, nome mais conservador e ligado aos EUA, que será possivelmente aprovado pelo congresso peruano.
A vitória eleitoral apertada de Castillo sobre a extremista Keyko Fujimori, filha de ex-ditador, por vantagem de somente 44.080 votos, deu vez à tática e ao expediente que a direita neofascista usou nos EUA e já começa a aplicar no Brasil: deslegitimar o resultado das urnas, desgastar o novo governo já no seu começo, gerar o caos propício à sua militância violenta, tentando inibir a ação dos trabalhadores.
Neste cabo de guerra de início de mandato, dirigentes de movimentos populares no Brasil que acompanham a conjuntura peruana apontam que a tendência deve ser a pressão por parte da extrema direita derrotada nas urnas. Castillo, por sua vez, deve se escorar na pressão das organizações populares (o professor é integrante das chamadas Rondas Camponesas, organização rural de massas) e também estar com olho atento ao cenário futuro em um continente que segue em processo de lutas e possíveis mudanças. No plano geopolítico, o esvaziamento do famigerado Grupo de Lima, criado para desestabilizar e condenar a Venezuela, já é uma grande notícia.
Em meio à crise no país, severamente afetado pela pandemia, pela relação entre total da população e alto número de mortes, e queda de até 11% na economia peruana, Castillo anunciou o apoio de 1,2 bilhão de dólares (R$ 6,5 bi) em subsídios para quem tem renda familiar inferior a 732 dólares.
O Peru Libre de Castillo é um partido marxista-leninista, escorado também no pensamento de José Carlos Mariátegui (marxista e elaborador chave para compreensão da formação social peruana). O programa avançado do partido inclui reformas estruturais, controle e participação do Estado sobre os investimentos, além de disputar a renda das corporações mineradoras, a exemplo do que Morales iniciou na Bolívia.
O processo certamente será longo e com muitos percalços, idas e vindas. O fundamental é que não se ignore o caráter golpista das elites latino-americanas e do governo dos EUA – e que não se abandone a luta de massas, para assim seguir avançando na conquista do poder do Estado.
Edição: Frédi Vasconcelos