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Aposta na vida ou aposta na morte?

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Em 10 meses, casos de morte por Covid avançaram no Brasil e no Paraná além das piores previsões - Giorgia Prates
É difícil encontrar adjetivo para as escolhas do governo brasileiro, com anuência dos demais poderes

Em 11 de julho do ano passado, publicamos artigo neste portal do Brasil de Fato Paraná intitulado: “70 mil mortos: O Brasil perdeu a guerra para o Covid-19”. Passados dez meses, eis que o Brasil supera 430 mil mortos. Naquela mesma data, o Paraná contava 999 mortos. Nesta semana, nosso estado superou a marca de 24 mil óbitos. Naquele registro ressaltávamos que o presidente Bolsonaro, ao expelir seus dois primeiros ministros da saúde e optar pela toupeira que se revelou o general Pazuello, fazia uma aliança com o pior dos mundos. Optava por expor o povo brasileiro à face sombria da morte. Naquele mesmo período, estimativas davam conta de que o Brasil poderia chegar a 120 mil mortos caso não fosse realizado um planejamento adequado para lidar com a pandemia.

O cenário de guerra perdida se transformou em terra arrasada. É difícil encontrar adjetivos que qualifiquem com precisão a escolha que o governo brasileiro fez e aplicou com a anuência dos demais poderes. A Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado só foi aberta por determinação do Supremo Tribunal Federal. O resultado, a conferir, poderá ser positivo se houver pressão social. A apatia da maioria do povo e a estridência da parcela bolsonarista expõem mais uma vez a face histórica do nosso país, ou seja, uma república dominada por uma elite entreguista, antipovo e golpista em essência. Toda vez que houve um início de avanço para a massa pobre, ocorreu golpe de estado (Getúlio Vargas, João Goulart, Dilma Rousseff, prisão de Lula). Mas é uma elite muito capaz de conviver com 21 anos de ditadura civil/militar e aturar o atual presidente, içado ao poder pela fraude das mentiras, do ódio de classe e total desapego à vida do povo. Essa elite cuja representação parlamentar se expressa no chamado Centrão tolera tais governos, pois se alimenta da chantagem que a favorece financeiramente. É uma elite capaz de garantir liberação do orçamento de emendas para favorecimento de seus currais eleitorais e virar as costas para a mortandade do povo. Alguém imagina que durante uma pandemia o recurso público não deveria ser todo focado no combate ao vírus?

No Paraná a situação da pandemia é gravíssima. O governador Ratinho Jr (PSD), que num primeiro momento ensaiou tornar o estado um laboratório para alavancar a vacina russa, que recentemente afirmou que o retorno escolar presencial só se daria com a vacinação dos profissionais da educação, agora se deixa conduzir pelas pressões de interesses econômicos e outros mais. No período em que os índices demonstram que estamos entre os três estados com maior número de contaminações por Covid 19, flexibiliza o isolamento social, autoriza reabertura de escolas sem a segurança que só a vacinação da maioria da população poderá garantir.

Na última semana a APP-Sindicato divulgou a nota técnica “Avaliação da Pandemia de Covid-19 no Estado do Paraná, necessidade de manutenção de medidas até avanço da vacinação”. No documento pesquisadores do Inpa – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia –, da UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais –, Ufam – Universidade Federal do Amazonas–, UFSJ – Universidade Federal de São João del-Rei – e por uma pesquisadora aposentada do Instituto Butantã afirmam a necessidade de aplicação de medidas rigorosas de isolamento no Paraná. Um lockdown de 21 dias seguido de monitoramento contínuo, ao mesmo tempo em que a vacinação fosse acelerada, preveniria maior número de óbitos ao esmagar a curva de contaminações. Infelizmente, o governo estadual e a maioria dos prefeitos não seguem esse caminho. Ao optar por medidas como retomada de aulas presenciais nas redes municipais, particular e estadual, flexibilizar mais uma vez a abertura do comércio como foi para o final de semana do Dia das Mães e repetir o discurso negacionista preponderante no país, assumem o risco de apostar na morte e no surgimento de novas ondas e cepas do vírus aqui no estado.

A APP-Sindicato, por representar trabalhadores/as que lidam com a ciência, o conhecimento e o processo de ensino-aprendizagem optou pela aposta na vida, desde o início da pandemia. Sabemos que a maioria do povo e dos professores/as, funcionários/as e estudantes deseja urgentemente voltar às escolas, como afirmou o próprio governador, mas numa pandemia não é o desejo que deve prevalecer, mas sim a ciência, para que vidas sejam preservadas.

No mesmo artigo acima citado, registrávamos o seguinte enunciado: “O que fazer com essas lideranças que não vêm cumprindo com seus papeis de proteger a vida do povo? Essa reflexão precisa ser feita. Não é possível imaginar que fiquem impunes diante de tantas perdas desnecessárias. Pensar num tribunal popular para o julgamento público desse povo pode ser uma alternativa”. Essa reflexão continua necessária. O que fará o Poder Legislativo nas esferas municipal, estadual e federal? Vai exercer seu papel constitucional de fiscalizador do Poder Executivo? O Sistema Judiciário continuará abrindo as portas ao negacionismo? A imprensa, que todo dia divulga o número de mortos, continuará festejando a retomada de atividades escolares que resultam em surtos de contaminações? Ficará a pandemia brasileira e paranaense como mais um capítulo da impunidade dos poderosos? A resposta é uma só. Nos mobilizamos e superamos a apatia ou entraremos num período de anomia e aprofundamento da exploração do sangue do povo. Lutar é preciso. Viver também é preciso!

Edição: Frédi Vasconcelos