O sistema de monocultura, implantado no Brasil desde o século 16, traz consequências desastrosas para o povo e o território brasileiros. O modelo vem provocando destruição da biodiversidade e esgotamento dos solos, além de contribuir com a fome, já que sua produção é primária, restrita a poucos alimentos e destinada, quase que exclusivamente, para exportação.
No Paraná, segundo o Censo Agropecuário de 2019, cerca de 200 mil propriedades são usadas para monocultura. O inventário da cobertura vegetal do Paraná, elaborado pelo Serviço Florestal Brasileiro, mostra que o agronegócio ocupa 50,3% do território estadual. Estão nessas áreas, segundo o estudo, os maiores trechos de erosão do solo.
“O monocultivo no Paraná ocupa grandes extensões de terra, tem alto investimento em tecnologia para produzir apenas quatro alimentos: soja, trigo, milho e cana de açúcar. Essa produção é revertida para o mercado, não chegando à mesa do paranaense. Ou, se chega, é com preço bastante alto,” explica José Damasceno, coordenador estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O dirigente conta que a produção via agricultura familiar e agroecologia, praticada pelo MST, que ainda ocupa menos espaço que o agronegócio, traz exemplos concretos de sustentabilidade e geração de alimentos.
Atualmente, no Paraná, são 320 assentamentos consolidados com 22 mil famílias assentadas produzindo alimentos saudáveis para venda direta, autossustento e doação. “O que os assentamentos fazem é o contrário da monocultura. Produzimos vários alimentos sem agrotóxicos e os disponibilizamos para venda direta para população”, conta Damasceno.
Terras que geram fartura
Desde o início da pandemia, acampamentos e assentamentos do MST se tornaram exemplos de solidariedade. O Movimento iniciou uma campanha nacional de doação de alimentos em abril de 2020. De lá pra cá, só no Paraná já foram doadas mais de 600 toneladas de alimentos a famílias que enfrentam a fome e a insegurança alimentar. Em todo o Brasil, as famílias Sem Terra partilharam mais de quatro mil toneladas de alimentos. "A Reforma Agrária é o nosso norte para tornar esses exemplos uma alternativa para toda a população”, afirma Damasceno.
Transformar a dor em promoção da vida
Apenas em abril, o MST doou 67 toneladas de alimentos no Paraná, durante a Jornada Abril Vermelho. As mobilizações neste mês lembram os 25 anos do Massacre de Eldorado dos Carajás, quando a Polícia Militar do estado do Pará assassinou 21 trabalhadores rurais Sem Terra e mutilou outros 69, no dia 17 de abril de 1996.
A violência ainda é uma ameaça constante àqueles que lutam pela terra no Brasil. Relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT) lançado em abril de 2020 mostrou que o número de conflitos no campo no primeiro ano de gestão de Jair Bolsonaro foi o maior dos últimos 10 anos, com um total de 1.833 ocorrências registradas em 2019.
No Paraná, apenas em 2019, nove comunidades rurais foram despejadas. Atualmente, 70 acampamentos e sete mil famílias camponesas sofrem com ameaças de reintegração de posse.
“A gente transforma o nosso luto, a nossa dor, o nosso pesar pelos nossos mártires em luta, em produção de comida, em promoção da vida e da solidariedade. E pra nós, solidariedade é partilhar aquilo que a gente tem, que é fruto do nosso trabalho”, diz Ceres Hadich, assentada no norte do Paraná e integrante da direção nacional do MST.
Edição: Lia Bianchini