Paraná

Covid-19

“Esquecem que somos pessoas dentro dos ônibus superlotados”

Trabalhadores do transporte coletivo denunciam condições precárias de proteção, superlotação e falta de EPIs

Curitiba (PR) |
Vacina antecipada é a principal reivindicação da categoria - Giorgia Prates

“Recebemos uma única máscara desde o início da pandemia e um frasquinho de álcool em gel. Trabalhamos com superlotação e voltamos para casa com o risco de contaminar nossos familiares.” Essa é a rotina dos trabalhadores de transporte coletivo em Curitiba, segundo contou um cobrador de ônibus, que atua na função há mais de 30 anos e não quis ser identificado.

As condições precárias de proteção contra o coronavírus vêm sendo denunciadas pela categoria desde o início da pandemia. A principal reivindicação da categoria é que a vacinação seja antecipada. 

 “Já perdemos inúmeros colegas para este vírus. Não podemos naturalizar estas mortes. Também sabemos que não podemos parar para que a economia da cidade não pare. Por isso, a vacinação é a demanda mais urgente,” conclui o trabalhador.  Segundo a Secretaria Municipal da Saúde, os trabalhadores do transporte coletivo integram o Grupo 4 de vacinação. Atualmente, estão sendo vacinadas as pessoas que integram o Grupo 2, idosos com mais de 60 anos.

“Onde eles alegam que somos essenciais para a economia da cidade, esquecem que somos pessoas ali dentro dos ônibus superlotados porque empresários não querem investir em mais ônibus e segurança aos trabalhadores. Estamos em maior risco para morte por este vírus,” diz o cobrador de ônibus.

Um motorista de ônibus que está há mais de 10 anos na área e que também não quis ser identificado diz que o sentimento entre os trabalhadores do transporte coletivo é de abandono.  “Estamos abandonados por todos os lados. As empresas do transporte coletivo não ofereceram Epis necessários e de qualidade para nós. O Sindicato dos Motoristas e Cobradores de ônibus de Curitiba até este último mês não tinha tomado providências e a Prefeitura mascara a realidade,” diz. 

O Setransp (Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba) informou nesta terça-feira, 23 de março de 2021, que 21 colaboradores morreram vítimas da Covid-19 desde o início da pandemia no país, em março de 2020, até o presente momento. Entretanto, o Sindimoc (Sindicato dos Motoristas e Cobradores nas Empresas de Transporte de Passageiros de Curitiba e Região Metropolitana) apontou o aumento acelerado de mortes de trabalhadores do setor, chegando a 100, em decorrência da Covid-19.

Empresas recebem milhões da Prefeitura

Em 2020, as empresas que operam o transporte em Curitiba receberam repasse de mais de R$ 203 milhões da Prefeitura. O valor, no entanto, não se reflete na qualidade da prestação de serviços.

O professor de Economia aposentado pela UFPR e integrante do Fórum do Transporte Público de Curitiba, Lafaiete Neves, afirma que uma das soluções, neste momento, é aumentar a frota. “É grave a situação pelo qual passam os motoristas e cobradores de ônibus, pois estão expostos ao vírus mais do que a grande maioria, devido à atual superlotação. Mas a Prefeitura precisa ser questionada. O Prefeito repassou mais de 200 milhões aos empresários  de transporte coletivo porque eles alegaram diminuição de usuários na pandemia. Porém, o que estamos vendo é que eles tiraram ônibus, o que tem culminado em superlotação. Ou seja, é a sanha do lucro em detrimento da vida.”

Esse foi o principal motivo que levou o presidente do TCE-PR, conselheiro Fabio Camargo, a emitir medida cautelar restringindo a circulação de ônibus na capital, mas mantendo o transporte de trabalhadores da saúde e de serviços considerados essenciais pelo município. Fiscalizações realizadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná desde o início da pandemia chegaram à mesma conclusão: apesar do subsídio oficial, o sistema de transporte coletivo de Curitiba não está conseguindo manter os limites de ocupação fixados legalmente para reduzir o contágio pela Covid-19

A situação de descumprimento do patamar máximo de ocupação dos ônibus foi confirmada em inspeção, realizada por nove auditores da Coordenadoria de Auditorias do TCE-PR, ao fim da tarde da última sexta-feira (19), no horário de pico do transporte. A fiscalização foi determinada pelo presidente, por meio da Portaria nº 462/21.

A pedido da Prefeitura de Curitiba, a liminar foi derrubada pelo Tribunal de Justiça do Paraná na noite da última sexta-feira (19 de março). Com base em relatório técnico, o TCE-PR, em conjunto com a Procuradoria Geral do Estado, vai solicitar ao TJ-PR que reconsidere sua posição e permita a implantação efetiva da restrição de circulação do transporte coletivo, considerado um dos principais focos de disseminação do coronavírus.

Resposta oficial

Segundo a Prefeitura, a frota, de cerca de 20 mil veículos, está organizada para atender número superior à atual demanda. Durante a bandeira vermelha, informa a Prefeitura, o movimento diário é de 242 mil passageiros. A frota está configurada para atender 450 mil. 

A Prefeitura informou que suspendeu, nesse período, a remuneração das empresas e os repasses de custos de amortização da frota. Há também a garantia de manutenção dos empregos, segundo a administração municipal. 

Edição: Lia Bianchini