Paraná

COMUNIDADE INDÍGENA

Indígenas Kaingang da área urbana de Londrina enfrentam dificuldades e resistem

Medidas restritivas decretadas pelo governo estadual prejudicam o acesso a comida e itens básicos de higiene

Londrina (PR) |
A Funai estima que 90% dos indígenas da região de Londrina já tenham recebido pelo menos a primeira dose da vacina contra o coronavírus - Murilo Pajolla

Os indígenas moradores do Centro Cultural Kaingang em Londrina lutam para suportar as duras consequências da pandemia. O toque de recolher e o fechamento das atividades não essenciais no Paraná prejudicam ainda mais a comercialização do artesanato, principal atividade econômica desenvolvida pelo povo na cidade.

Renato Kriri desabafa: “Hoje eu tenho aqui 22 famílias. A comida está sempre faltando. O arroz, o feijão, o macarrão, a comida do dia a dia mesmo”. O cacique é a liderança responsável pelo principal ponto de passagem dos kaingang na área urbana, localizado às margens da avenida Dez de Dezembro, a aproximadamente 100 km da Terra Indígena Apucaraninha.

As moradias são barracos de madeira e pecam pela infraestrutura precária. Além da alimentação, faltam itens de higiene que se tornaram essenciais na preservação da vida, como sabão, álcool gel e máscaras.

Renato relata ainda a dificuldade de promover o isolamento social na comunidade e a preocupação com o avanço da Covid-19 sobre os habitantes do Centro Cultural, onde já foram registrados 19 casos da doença, sem mortes. “Sempre falamos para usar máscara. Essa doença está matando muitos não indígenas, mas para nós é mais perigoso. O filho do não indígena, a mãe não deixa nem sair à rua. Mas o indigena vive mais solto, é da cultura, está acostumado a viver mais livre”.

Desinformação e genocídio

A Funai estima que 90% dos indígenas da região de Londrina já tenham recebido pelo menos a primeira dose da vacina contra o coronavírus, incluindo habitantes da aldeia urbana coordenada por Renato.

Em meio à torrente de notícias falsas disseminadas principalmente por igrejas evangélicas, as lideranças buscam orientar a população. “Eu recomendo a vacina e já tomei. O exemplo vem de nós, que somos líderes de um povo, de uma comunidade. Porque tem todas essas mentiras, e o pessoal que é inocente acredita”, diz o cacique.

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) aderiu à campanha nacional “Vacina, parente!”, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e se engajou em um amplo trabalho de conscientização e pressão sobre as autoridades de saúde no sentido de agilizar a imunização.

“São muitos dogmas, muito fundamentalismo de quem relaciona a vacina com uma coisa ruim. Não só essa questão de religião, mas várias ‘fake news’. Espalharam que ia trazer problemas de saúde e que não poderia mais ter filhos. Além de algumas igrejas terem falado que a aplicação da vacina era um sinal do mal. Faz parte de uma estratégia de eliminação dos povos”, denuncia Marciano Rodrigues Guarani, coordenador da Arpinsul.

Apesar da desinformação, ele avalia que a campanha produziu resultados positivos. “Isso tudo ocorreu, mas a gente fez um bom trabalho e estamos tendo um bom resultado das vacinações. Em alguns casos, indígenas não quiseram a primeira dose. Mas muitos acabaram se arrependendo depois de não terem se vacinado”.

Como doar

Os interessados em fazer doações aos moradores do Centro Cultural Kaingang devem ligar ou enviar mensagem no WhatsApp do cacique Renato para agendar a entrega dos donativos. O telefone é o (43) 99663-3942.

“A gente pede a Deus que a pandemia passe logo. Porque senão vai nos prejudicar muito. Já está prejudicando, e a gente não aguenta mais isso. O povo precisa voltar a trabalhar, fazer os seus negócios, assim como os não indígenas”, lamenta Renato.

Edição: Pedro Carrano