Paraná

AUTONOMIA DO BANCO?

Congresso Nacional: a casa das ‘vontades do povo’ literalmente à mercê dos banqueiros

Essa aprovação entregou o Banco Central a uma suposta autonomia que passará a ser exercida pelo sistema financeiro

Curitiba (PR) |
É nesse contexto que ainda crescente avanço da pandemia que a autonomia do Banco Central ganha mais urgência que a necessidade de discussão do auxílio emergencial - Marcello Casal Jr/Agência Braisl

A esdrúxula e intempestiva iniciativa da nova mesa diretora da Câmara Federal, ocupada agora por Artur Lira, de colocar urgência para votação da autonomia do Banco Central, em detrimento de pautas sociais mais urgentes, como discussão e gestão da Vacinação de Coronavírus, ou mesmo a discussão imperativa para o povo da continuidade do auxílio emergencial, demonstra como a casa das vontades do povo só serve aos interesses do mercado, que patrocina a grande maioria dos eleitos.

O que não é de se estranhar, afinal: se formos buscar um perfil socioeconômico da sua composição, vamos identificar a linhagem de quem está lá, ou em nome de quem os que estão lá, estão exercendo seus mandatos. E o que vemos que não é em nome da maioria da população que os que se elegeram exercem seus mandatos, com as dignas e raras exceções dos partidos de esquerda, como o PT, o PCdoB, o PSOL que podemos assegurar que jogam em nome da vontade do povo.

É necessário um urgente alerta sociológico para que o povo possa ver e se atentar a isso. Ou seja, você, eleitora e eleitor, que ganha abaixo dos 15 mil reais, isso mesmo, você que é classe média, as trabalhadoras e trabalhadores que são assalariados e todos os demais cidadãos brasileiros, que foram às urnas delegar suas vontades para o sistema representativo respeitando o conceito weberiano da ciência política da impossibilidade técnica do governo de massas, foram iludidos, pois seus representantes eleitos, às exceções descritas acima, não estão tendo seus votos representados. Isso mesmo: aqueles e aquelas que você elegeu não votam em seu nome e nem no que você acha mais importante e urgente, mas ao contrário votam conforme a vontade e o pedido dos grandes grupos econômicos. Leia-se o mercado financeiro, banqueiros e grandes empresários internacionais e nacionais.

As considerações acima destacam que não compreendemos como uma casa de leis deveria ser a tradução ipis literis da vontade do povo. Não o é, pois o que quer neste momento a maioria da população brasileira? O que essa maioria do povo esperava que fosse votado nesses primeiros dias do início do ano nova legislatura, a partir da composição das mesas diretoras? Vou lhes dizer: esperávamos que pudéssemos enfrentar a pandemia de coronavírus que assola de forma maléfica a maioria dos países do mundo e em especial o Brasil com outras prioridades que não a inversão de pauta. Esperava se que o Congresso discutisse e colocasse para o Executivo que é necessário agir rapidamente para evitar o número de mortes que cresce exponencialmente dia a dia ainda no Brasil, porque a vacinação e a chegada das vacinas no Brasil andam a passos muito lentos. Esperava que essa casa de leis e sua casa revisora criassem leis de proteção do povo brasileiro para enfrentamento da crise sanitária e econômica.

Por isso é necessário a imediata reedição da pela Câmara da lei de continuidade ao auxílio emergencial para que a maioria das famílias no Brasil possam se manter com condições de dignidade humana e garantir a não volta do flagelo da fome para milhões de famílias que em função do coronavírus sofrem sem a ajuda.

O auxílio emergencial, que o desgoverno Bolsonaro, a princípio nem queria que fosse implementado lá no início da pandemia e quando teve que se dobrar à vontade do Congresso, propôs que fosse somente de R$ 200 reais por família. Para mudar a vontade do desgoverno Bolsonaro foi necessário que as centrais sindicais brasileiras, por meio dos partidos de oposição, fizessem pressão sobre o Congresso Nacional e demonstrassem que para que as pessoas pudessem sobreviver aos períodos duros de enfrentamento a pandemia seria necessário que fosse ao menos um salário mínimo de ajuda em formato de auxílio emergencial, o que o Congresso também não entendeu e não implementou, aprovando somente 500 reais.

O desgoverno Bolsonaro, para poder surfar na onda populista que tanto negava, já que tinha perdido a discussão dos 200 reais, aprovou o auxílio emergencial de R$ 600 reais. As deputadas e deputados progressistas adendaram que as mulheres chefes de família teriam de ter direito a duas vezes o valor do auxílio totalizando R$ 1.200,00 reais. Discussão que não foi nada tranquila, mesmo tendo o Congresso aprovado ajuda financeira bilionária para os banqueiros e subsídio de sobrevivência na pandemia para diversos setores e ramos de atividade da indústria e do grande empresariado, o que ocorreu sem grande alarde na mídia tradicional.

Neste momento ainda extremamente crítico da pandemia no Brasil, em que o sistema de saúde entra em colapso em diversos estados brasileiros e ainda a vacinação anda a passos lerdos (resultado da política de enfrentamento da pandemia por parte do desgoverno Bolsonaro e de suas atrapalhadas homéricas) no âmbito de suas desastrosas relações internacionais seguidistas do governo Trump, que foi fragorosamente derrotado nas urnas.

Ou seja, que teve seu modo genocida de administrar descartado pelos americanos, mas que ainda aqui no Brasil encanta alguns seguidores fervorosos principalmente no primeiro escalão do desgoverno Bolsonaro. O que vimos nos principalmente nos meses em que mais se aumentava a pandemia eram discursos de ódio, ideologicamente construídos e posições negacionistas e extremamente vinculadas ao trumpismo. Isso isolou o país nos mais diversos aspectos que se relacionavam à doença.

Essa postura, inclusive, resultou para Brasil e Estados Unidos uma proporção gigantesca de infectados e também um grande percentual do número de mortos em decorrência da pandemia nestes dois países que alcança 1/3 do total de mortes no mudo.

É nesse contexto que ainda crescente avanço da pandemia que a autonomia do Banco Central ganha mais urgência que a necessidade de discussão do auxílio emergencial, sendo em um dia aprovada sua “urgência” e no outro aprovado o mérito do projeto, sem o mínimo de discussão possível com a sociedade.

Essa aprovação entregou o Banco Central a uma suposta autonomia que passará a ser exercida diretamente pelo sistema financeiro e seus cinco ou seis grandes banqueiros, tirando da alçada o presidente da república, o legítimo mandatário da vontade soberana do povo, o poder de controle sobre a diretoria e a presidência do Banco Central, para que possa, se achar pertinente intervir para evitar os abusos do sistema financeiro.

Agora, com mandatos alternados de quatro anos, o presidente do Brasil não pode mais demitir o presidente do Banco Central Brasil, ou seja, o capital está com todos os poderes para gerir a política de inflação e juros na sociedade brasileira. Isso acontece mais ou menos aos moldes do alinhamento de preços do petróleo no mercado internacional, onde o governo não se mete mais, perdendo a possibilidade de garantir ao povo brasileiro, condições para fugir da pressão internacional de preços. E como o mercado nacional tem um balizador neoliberal, quando sobe o preço do petróleo fora do Brasil, o preço sob aqui, mas quando os preços no mercado internacional baixam, não vemos o mesmo efeito nas bombas da diminuição dos preços.

Em uma leitura rasa, podemos dizer que é o que acontecerá com a política de juros e a inflação no Brasil, ficará sob a égide de um banco que tem autonomia em relação ao Estado brasileiro, mas como historicamente os componentes do Banco Central são pessoas indicadas pelo mercado financeiro, em relação a eles não haverá nem autonomia e nem independência. E isso porque, como dissemos no início, a casa das vontades do povo, que deveria ao menos ver a tempestividade da proposta e ao olhar as dificuldades pelas quais passa toda a população brasileira para enfrentar o coronavírus e dizer que o momento político é como apontamos, de outras prioridades do povo.

Prioridades como construir um plano nacional de vacinação com base no Sistema Único de Saúde, o SUS, que é um dos poucos do mundo que em havendo vacinas pode dar cabo em pouco tempo de vacinar todo o povo brasileiro, ou aprofundar a discussão que está em voga na sociedade sobre os reflexos ainda da pandemia: a necessidade de salvaguardar a dignidade humana de sobrevivência para que os homens e mulheres que mais sentirão o alargamento temporal da pandemia possam sobreviver.

Ou seja, a necessidade de se aprovar a toque de caixa a autonomia do BC, só era de interesse, como dissemos, de cinco ou seis grandes fortunas que controlam o sistema financeiro nacional e demonstraram, por meio da mobilização da maioria do conjunto das deputadas e deputados, também controlar o congresso, que deveria ser no termo mais radical da palavra, a casa soberana da realização das vontades do povo.

Edição: Pedro Carrano