Supermercados

Carrefour, Pão de Açúcar e BIG descumprem requisitos de responsabilidade corporativa

Relatório da Oxfam Brasil estabelece pontuações para 4 quesitos diferentes; resultado foi abaixo do esperado

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Representante da Oxfam diz que o resultado surpreendeu negativamente - Tânia Rego/Agência Brasil

Os três maiores supermercados do Brasil, Carrefour, Pão de Açúcar e BIG, não cumprem requisitos básicos de responsabilidade sobre suas cadeias produtivas. É o que mostra o relatório “Por Trás das Suas Compras – uma análise da responsabilidade corporativa com o respeito aos direitos humanos nas cadeias produtivas dos maiores supermercados brasileiros”, divulgado pela Oxfam Brasil nesta quarta-feira (13).

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A pesquisa estabeleceu pontuações para os supermercados em quatro temas: transparência; trabalhadores e trabalhadoras no campo; pequenos agricultores e agricultura familiar e direitos das mulheres. O objetivo da pesquisa é estimular melhores práticas entre as empresas.

O levantamento foi feito entre julho e setembro de 2020, a partir de informações divulgadas pelas próprias redes varejistas.

Responsáveis pelo controle de 46,6% do setor no país, os supermercados obtiveram uma média de 4 pontos na tabela da Oxfam, em que a pontuação máxima é 93. O mais bem colocado foi o Pão de Açúcar, com 6,5, contra 2,7 do Carrefour e 2,2 do BIG.


Tabela mostra baixa pontuação dos supermercados nos quatro quesitos analisados / Reprodução/Oxfam Brasil

Decepção

Gustavo Ferroni, coordenador da área de Setor Privado, Desigualdades e Direitos Humanos da Oxfam Brasil, afirma que as três redes varejistas teriam condições de obter resultados melhores. Além disso, são líderes de mercado e deveriam dar exemplo, influenciando de forma positiva o setor. Falta, segundo ele, uma decisão empresarial de que cumprir esses requisitos é uma prioridade.

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“A gente sabe que a conversa no Brasil, no que tange à responsabilidade sobre a cadeia produtiva, direitos humanos e as ferramentas para implementação dos princípios orientadores da ONU, não caminha no mesmo ritmo de outros países do centro do capitalismo”, pondera. “Mas o resultado foi pior do que imaginávamos”, lamenta.

Para efeito de comparação, os supermercados europeus obtiveram média de 25 pontos, e os dos EUA, 12 pontos.

Duplo padrão

Ferroni ressalta que as três redes varejistas fazem parte ou estão ligadas a empresas multinacionais. “Essa conexão deveria, minimamente, alinhar a discussão que é feita nos demais países, e no âmbito internacional, em termos de melhores práticas de direitos humanos e cadeia produtiva. Mas isso não está chegando aqui. Tem uma lacuna de implementação, um duplo padrão”, observa.

“O que a gente reparou é que, aqui no Brasil, os maiores supermercados estão muito atrelados, ainda, a uma abordagem exclusivamente de auditoria, que é muito limitada”, acrescenta o representante da Oxfam Brasil. “Não há transparência sobre quem foi auditado, quais foram os resultados, que padrão foi utilizado. Faltam informações públicas. Eles não revelam quais as cadeias produtivas críticas e quais os principais problemas”.

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É nesse aspecto que o Pão de Açúcar obtém pontuação superior aos concorrentes, na metodologia da Oxfam, mas Ferroni enfatiza que o resultado é insuficiente e não há nada a comemorar.

O Carrefour, por sua vez, promete divulgar a lista completa de seus fornecedores diretos até 2022, e dos indiretos até 2025. As conversas da organização com o BIG não avançaram, segundo Ferroni.

O relatório faz parte de uma série de pesquisas da Oxfam Brasil sobre as causas da desigualdade no país e o papel que grandes empresas das cadeias produtivas de alimentos, como os supermercados, podem ter no esforço para combatê-las.

Outro lado

Brasil de Fato entrou em contato com as redes varejistas citadas. As três responderam por meio de suas assessorias de comunicação.

O Grupo Pão de Açúcar (GPA) disse que "tem como propósito ser um agente mobilizador na construção de uma nova agenda social, ambiental e de governança para uma sociedade mais inclusiva e sustentável." Sobre os resultados do relatório, o GPA afirma que "entende que as diferentes realidades e particularidades de cada país devem ser consideradas e compreendidas, incluindo as diferenças socioeconômicas, regulatórias e de processos produtivos que impactam nas políticas e práticas relacionadas à cadeia de produção, mas entende seu papel de apoiar com protagonismo essa transformação".

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"Pela complexidade da cadeia de valor do varejo, este é um caminho que precisa ser percorrido com afinco, de maneira multisetorial, continuamente. O varejo é o elo e conexão entre fornecedores e clientes, e tem a importante oportunidade de desenvolver novas práticas junto à cadeia de abastecimento para construir um futuro que potencialize os impactos positivos para uma sociedade mais justa e sustentável", completa a nota enviada pela assessoria.

O Grupo BIG informou que não teve acesso ao conteúdo do material na íntegra, por isso não fará comentários.

O Carrefour respondeu por meio de nota, que pode ser conferida abaixo na íntegra:

"O Grupo Carrefour Brasil repudia qualquer prática que viole os direitos humanos ou a legislação trabalhista. A companhia preza pelo respeito e bem-estar de todos que integram suas cadeias produtivas e possui um Código de Ética e Social para Fornecedores com cláusulas específicas que os obrigam a se comprometer rigorosamente com todas as normas da legislação trabalhista vigente.

Como parte de seu diagnóstico de riscos sociais, o Carrefour Brasil está empenhado em atualizar sua análise, integrando os riscos específicos das cadeias de abastecimento alimentar e não-alimentar no Brasil e implementando medidas preventivas adequadas. Um grupo de trabalho incluindo equipes da sede do Grupo estará encarregado de definir um plano de ação englobando entidades locais, monitorando sua implementação e informando sobre ele de forma transparente.

Como membro fundador e curador do Instituto Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (InPacto) – que atua na promoção do trabalho decente há 15 anos – e com ações nacionais e internacionais alinhadas aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU), a companhia atua para garantir alinhamento às principais demandas socioambientais globais e regionais. No que diz respeito aos direitos humanos, a atuação da companhia está vinculada às seguintes ODS: Consumo e Produção Sustentáveis, Saúde e Bem-Estar, Trabalho decente e crescimento econômico, Redução das Desigualdades, Cidades e Comunidades Sustentáveis.

Também vale ressaltar que o Grupo Carrefour Brasil atua conforme as diretrizes de direitos humanos abordados nos protocolos da Initiative Compliance and Sustainability (ICS) - iniciativa setorial internacional cujo objetivo é melhorar as condições de trabalho ao longo das cadeias de abastecimento globais dos varejistas e marcas que são membros - e da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX) – formada por redes varejistas para a implantação das melhores práticas de compliance entre seus fornecedores e subcontratados. Essas iniciativas incluem o combate ao trabalho infantil, ao trabalho forçado, análogo ao escravo, à discriminação, a abuso e assédio, garantindo a livre associação e canal de denúncia, salário e compensação e horas trabalhadas.

O Grupo Carrefour Brasil tem investido em um monitoramento e análise de risco crescente de suas cadeias de fornecimento, tem fortalecido documentos de governança e atuado com um comitê de auditoria social, aumentando a comercialização de alimentos cultivados com as melhores práticas e que respeitem e valorizem os pequenos produtores locais e todas as pessoas que trabalham no campo. Na admissão de novos parceiros comerciais, a companhia executa a Due Diligence de Integridade, que é o processo de coleta e análise de informações de fontes públicas relacionadas à idoneidade de pessoas físicas e jurídicas.

Para o Grupo Carrefour Brasil, a adequação dos produtores e fornecedores às boas práticas sociais é inegociável. Para serem parceiros da rede, os fornecedores precisam seguir padrões de qualidade e cumprir requisitos sociais, trabalhistas, ambientais e éticos, condições que também são formalizadas em contrato. Também é exigido que estejam de acordo com os principais documentos que norteiam a conduta social do Carrefour: Código de Conduta para Negócios, Código de Ética e Social para Fornecedores, além do Acordo Nacional de Compra e Fornecimento.

Os fornecedores devem ser submetidos a auditorias anuais independentes, medida que, no caso da cadeia de têxteis, também deve ser estendida aos subcontratados. Fabricantes que não cumprem esses requisitos, em especial os relacionados ao respeito aos direitos humanos e condições dignas de trabalho, têm os contratos de fornecimento suspensos. Em 2020, foram realizadas 272 auditorias junto a fornecedores de marca própria. Para mitigar as injustiças sociais, o Grupo Carrefour Brasil oferece treinamentos e acompanhamentos individuais para os fornecedores mais críticos de FLV, atuando com um plano de ação em casos de não conformidade com a política da companhia e suporte para que os parceiros comerciais melhorem suas práticas e se desenvolvam. O objetivo é educar, tornando a cadeia mais sustentável.

Outro ponto que merece destaque é que o Carrefour é a rede varejista pioneira no fomento de práticas mais sustentáveis de produção em parceria com produtores locais. Um dos focos da companhia é fazer um trabalho de reconhecimento/mapeamento de pequenos produtores. Além dos benefícios para a biodiversidade, essa aproximação se reverte em apoio a comunidades tradicionais, como indígenas e quilombolas, que promovem a agricultura familiar e cultivam alimentos típicos de determinadas regiões, aumentando sua renda, inclusão social e o desenvolvimento econômico local. Esses produtos são rastreados e sua história é compartilhada nas gôndolas, por meio do QR Code.

Em relação ao combate ao racismo, o Carrefour tem um compromisso de longo prazo no apoio e promoção a projetos de diversidade e inclusão como forma de contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e inclusiva. Desde o fim de 2020, após a morte do João Alberto na loja de Porto Alegre, o Carrefour reforçou fortemente as ações de combate ao racismo, assumiu compromissos públicos e um plano de curto, médio e longo prazo para aprimorar as práticas, reforçar a luta antirracista e promover a urgente inclusão social de negros e negras. Com isso, a companhia vem implementando mais de 50 iniciativas, que envolvem colaboradores, parceiros, fornecedores e toda a sociedade.

Vale ainda registrar que as informações sobre os códigos e políticas do grupo, bem como de governança social, podem ser consultadas no site www.conexaoeticacarrefour.com.br e no Relatório de Sustentabilidade de 2019 do grupo, bem como no site institucional."

Edição: Rogério Jordão