Paraná

Solidariedade

União de campo e cidade doa mil cestas e mais de 3 mil marmitas em Curitiba e região

Junto às cestas, foram entregues 7 toneladas de alimentos in natura partilhadas por acampamentos e assentamentos do MST

Curitiba (PR) |
Com as ações do Natal, as famílias Sem Terra chegaram a 501 toneladas de alimentos partilhados - Valmir Fernandes

“Essa ação se chama humanidade [...], estão fazendo o que Jesus fez, ajudar os necessitados.” É assim que o seu Roberto Gomes se referiu à marmita que recebeu na praça Rui Barbosa, no centro de Curitiba, nesta segunda-feira (21). Ele está entre as pessoas em situação de vulnerabilidade social atendidas pela ação “Nosso Natal é pela Vida”, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina (Sindipetro PR e SC) e ação Marmitas da Terra entre os dias 21 e 23 de dezembro.

A iniciativa distribuiu 3.400 marmitas, sete toneladas de alimentos frescos doados por comunidades do MST e 1000 “Cestas Esperanças”, organizadas pela Rede Produtos da Terra e compradas a preço de custo por pessoas apoiadoras da ação, sindicatos e entidades parceiras para que pudessem ser doadas às famílias.

A ação se encerrou na noite desta quarta (23) com a distribuição de 700 marmitas com cardápio especial de Natal: peru, farofa, arroz à grega, vinagrete, batata e tomate. A iniciativa ocorreu em frente à Catedral de Curitiba Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, na Praça Tiradentes, no Centro da capital. Cada marmita também foi acompanhada de uma embalagem de mel com açafrão, composto que contribui para a melhora da imunidade e previne infecções. O remédio natural é produzido e doado pelo Setor de Saúde Chica Pelega do assentamento Contestado, da Lapa.

Antes da entrega das refeições, Dom Naudal Alves Gomes, bispo da diocese paranaense da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, fez a benção dos alimentos e comentou sobre a campanha realizada pelas organizações. “Vocês trazem uma expressão concreta de solidariedade, de fraternidade e de respeito como ser humano. É também uma questão de justiça, porque alimentar-se não é só parte da justiça social, mas é parte também, na compreensão cristã, da justiça do reino”. 


Antes da entrega das refeições, Dom Naudal Alves Gomes abençoou-as / Valmir Fernandes

O religioso lembrou o sentido no Natal: “O menino Jesus, que nós estamos celebrando o nascimento agora no dia 25 de dezembro, foi perseguido porque veio trazer a justiça de Deus, em que ninguém pode ficar com fome e todo mundo tem que se alimentar, além das outras necessidades básicas pra sobrevivência.”

Adriana Oliveira, integrante da direção estadual do MST e da coordenação da campanha, frisa o objetivo das iniciativas solidárias: “Essas ações são fruto de um grande trabalho coletivo e em mutirão, feito com muita dedicação. Queremos mostrar nossa solidariedade a quem encara a fome dia a dia e levar a certeza de que podemos mudar essa situação. Também é uma forma de protesto contra a falta de ação do governo Bolsonaro diante do aumento acelerado da fome e do desemprego.”

A cesta levou à mesa das famílias carentes alimentos da Reforma Agrária e da Economia Solidária, como arroz, feijão, farinha de mandioca, panetone, doce de frutas e leite longa vida. Os alimentos in natura (melancia, legumes, verduras e tubérculos) foram doados pelo assentamento Contestado e pelos acampamentos Maria Rosa do Contestado, de Castro; Reduto do Caraguatá, de Paula Freitas; Emiliano Zapata, de Ponta Grossa; José Lutzenberger, de Antonina; e Maila Sabrina, de Ortigueira.

As entregues foram nesta terça-feira (22), em Curitiba, no Jardim Santos Andrade, no Campo Comprido; na Portelinha, do Santa Quitéria; no bairro Umbará e ligados ao Centro Comunitário de Proteção Alimentar Padre Miguel (Cecopam), no Xaxim; e também na comunidade Vila Santa Cruz, em Araucária.


Entrega de cestas na comunidade Santa Cruz, em Araucária / Valmir Fernandes

Já as marmitas foram destinadas especialmente a pessoas em situação de rua e em risco alimentar no Centro, como é o caso de seu Roberto Gomes, e em comunidades da periferia da capital, nos dias 21, 22 e 23. A maior parte dos ingredientes do cardápio veio de áreas e cooperativas da Reforma Agrária e da Agricultura Familiar, e também de lavouras comunitárias cultivadas por voluntários do coletivo Marmitas da Terra no assentamento Contestado, da Lapa.

Arildo Ribeiro Taborda é líder da comunidade Portelinha, onde 320 famílias vivem há 12 anos na luta por moradia. “Infelizmente, essa última semana foi muito triste, porque 300 famílias do Sabará foram despejadas. Isso choca a gente, porque são 300 famílias, 600 crianças que ficaram na rua, mesmo sendo época de pandemia. O governo, o prefeito, todos não pensaram nisso”, denunciou Taborda, referindo-se ao despejo forçado da ocupação Nova Guaporé, realizado no último dia 17. “Mas vocês vêm fortalecer a gente. Muito obrigado por isso”, completou.

Alexandre Guilherme, presidente do Sindipetro, conta sobre a ampla participação dos trabalhadores petroleiros com a doação de cestas. “É um momento dos trabalhadores olharem pelos trabalhadores. O desemprego e a crise econômica estão em alta e a nossa ação aqui é em solidariedade e para resistir a esse período difícil. Nosso desejo é que 2021 seja um ano muito melhor para todos nós”, disse durante a entrega na comunidade Portelinha. Ao longo do ano, a categoria já havia se somado a outras ações de solidariedade com a doação de cargas de gás de cozinha.

“Como produtor, eu me sinto realizado de fazer esse processo de juntar o campo e a cidade para mostrar o que há no campo, para que a gente possa, por longos anos, continuar nessa jornada na terra, mantendo a saúde e a diversidade e que isso fique para as futuras gerações”, relatou Ademir Fernandes, integrante do MST e coordenador da Rede Produtos da Terra. 


Marmitas foram destinadas especialmente a pessoas em situação de rua e em risco alimentar no Centro de Curitiba e em comunidades da periferia da capital, nos dias 21, 22 e 23 / Lizely Borges

Natal da Reforma Agrária Popular no Paraná

Além da mobilização em Curitiba, o MST realiza o “Natal da Reforma Agrária Popular” com partilha de alimentos em todas as regiões do estado. No total, foram doadas 58,5 toneladas de alimentos entre os dias 16 e 23 de dezembro, em Guarapuava, Paiçandu, Rio Branco do Ivaí, Londrina, Cascavel, Jardim Alegre, Curitiba e Araucária.

A iniciativa integra a campanha nacional do MST em solidariedade com quem enfrenta a fome neste período de pandemia e de falta de políticas eficazes vindas do governo Bolsonaro. Com as ações do Natal, as famílias Sem Terra chegaram a 501 toneladas de alimentos partilhados desde o final de março. Mais de 170 assentamentos e acampamentos, de 80 cidades do estado, participaram de dezenas de iniciativas. De maio até este dia 23 de dezembro, a Ação Marmitas da terra entregou mais de 38 mil marmitas em Curitiba e região. 


Com as ações do Natal, as famílias Sem Terra chegaram a 501 toneladas de alimentos partilhados / Valmir Fernandes

Dados da fome e do desemprego

Índices de desemprego e de fome recordes, fim do Auxílio Emergencial e falta de emprego e de políticas de fortalecimento da agricultura familiar e da produção de alimentos. Essa combinação sinaliza para um 2021 ainda mais difícil para a população pobre.

Em outubro, o desemprego afetava 13,8 milhões de pessoas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os desalentados (que gostariam de trabalhar, mas não procuraram vagas por terem perdido as esperanças) são 5,8 milhões de brasileiros. Em janeiro, a pobreza extrema (quem vive com US$ 1,90 por dia) deve atingir de 10% a 15% da população brasileira (27,4 milhões de pessoas), de acordo com projeção da Fundação Getúlio Vargas.

Edição: Lia Bianchini