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Eleições Municipais 2020: disputar as consciências para garantir a vida

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O processo das eleições deve ter, na base do diálogo com a população, o exercício de compreender as razões pelo cansaço e a descrença na política institucional - Joka Madruga / Fotos Públicas
Foram muitos os votos brancos e as abstenções sustentados por um discurso de negação

O Analfabeto Político

O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.

O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.

(Bertolt Brecht)

Vamos falar das Eleições Municipais deste ano. Serão 5.570 municípios brasileiros nos quais as pessoas devem escolher prefeitos e vereadores para governar as cidades. Assim, este momento deve ser compreendido como um espaço importante de batalha das ideias, de politização do diálogo para derrotar o neofascismo e semear as bases para construir uma alternativa popular.

O direito ao voto é uma conquista das classes trabalhadoras brasileiras que ao longo da sua história superaram os obstáculos de classe, raça e gênero para exercer de maneira universal o seu direito de votar. Direito este, muitas vezes interrompido pelos golpes militares seguidos de governos ditatoriais.

As eleições de 2020 estão marcadas pelo contexto de golpe iniciado em 2016 com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, uma articulação das classes burguesas que levou à presidência o governo neofascista de Jair Bolsonaro. Uma vez eleito, seu governo leva a cabo um projeto de poder que tem colocado em curso ataques contra os direitos conquistados pelas classes trabalhadoras, contra os povos indígenas e os movimentos sociais brasileiros.

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Com isso, aprofunda sua pauta política e econômica que dá unidade à classe dominante, de acordo com seus interesses privados. Neste momento, temos nossas vidas profundamente impactadas pelas crises econômicas e ambientais provocadas pelo sistema capitalista.

Como consequências do governo Bolsonaro, a pandemia provocada pelo COVID-19, levou 151 mil brasileiros e brasileiras à morte (até meados de outubro), especialmente o povo negro e pobre. No que toca à questão econômica, somos mais de 13 milhões de desempregados e cerca de 40 milhões de pessoas vivendo de trabalho precário. Além disso, a fome atinge 10,3 milhões de brasileiros e brasileiras, neste momento.

É nesse cenário que devemos debater qual é o sentido e a importância das eleições municipais que se aproximam.

Nos anos anteriores um dos elementos que marcou o processo eleitoral, como foi o caso das eleições de 2018, a crescente descrença por parte da população na política institucional, foram muitos os votos brancos e as abstenções sustentados por um discurso de negação, reforçando o senso comum que coloca no “mesmo saco” todos os políticos, entendidos como inimigos do povo e corruptos.

Diante deste cenário, cabe à classe trabalhadora organizada, aos partidos e aos candidatos e candidatas o dever de debater o processo eleitoral para além do ato de votar. As eleições devem ser concebidas como parte da luta de classes num momento em que os inimigos, ocupando o Estado, lançam mão de diversas formas combinadas de ataques, dentre eles, fake news, desmonte de políticas públicas, despejos urbanos e rurais violentos, perseguições políticas, militarização do Estado. Há uma verdadeira guerra em curso, uma guerra na qual ainda não foi articulada uma estratégia para derrotar os inimigos.

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Nesse sentido, o processo das eleições, deve ter na base do diálogo com a população, o exercício de compreender as razões pelo cansaço e a descrença na política institucional. Um diálogo que neste momento deve partir substancialmente da defesa da vida, pois a classe trabalhadora brasileira está em luta hoje para se manter viva.

Para tanto, é preciso compreender quais são as vidas que estão ameaçadas nos dias de hoje. Se trata do Covid, do racismo estrutural que se manifesta diariamente na forma como a população negra brasileira vive seu cotidiano e como perdem suas vidas. Estão ameaçadas as vidas da população LGBTq+ pela Lgbtfobia, estão ameaçadas as vidas das mulheres, dentro de suas casas, pelo feminicídio.

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Deve-se considerar a criação de políticas públicas que enfrentem o colapso ambiental compreendendo que o colapso ambiental tem consequências profundas para a vida dos povos do campo e das cidades, como por exemplo, na saúde, no acesso à água, no modo de reprodução de suas vidas. A pauta ambiental é uma pauta das classes trabalhadoras, pois são as mais impactadas com as mudanças climáticas, que no Brasil podemos afirmar tratarem-se de crimes ambientais provocados pelas grandes mineradoras, com o consenso do Estado, e também pelo próprio governo Bolsonaro que incendeia as florestas, que incita a violência contra os povos dos campos e das florestas, para favorecer os latifundiários e o agronegócio.

Neste diálogo do processo eleitoral deve ser pautada a soberania alimentar e a Reforma Agrária como alternativas, para a solução da fome, do desenvolvimento econômico e social do Brasil. Além disso, possam ser criados os mecanismos de defesa do SUS e da educação pública para todas as pessoas, reconhecendo que todas essas conquistas estão sob ataque neste momento.

Essas questões são fundamentais para a politização do debate eleitoral, devem ser entendidas de forma articulada, sem isso, não é possível enfrentar o projeto de poder agora em curso. É necessário ainda, avançar rumo a uma construção de um projeto político com o conjunto da classe que considere todos essas questões.

Devemos reconhecer que parlamentares, secretárias, ministras, progressistas impulsionam e fortalecem a defesa do Estado democrático de direito. Assim, nestas eleições, é necessária ainda mais uma articulação entre as esquerdas e compreender cada dimensão do Estado como uma trincheira de disputa antifascista.

Compreender que o aparato institucional também é sustentado pela mais valia produzida pela classe trabalhadora, e que se abrirmos mão desta disputa, estamos abrindo mão desta mais valia, e que o partido como ferramenta de disputa eleitoral deve cumprir uma função que deve ser a de elevar a consciência política da classe trabalhadora.

Edição: Rogério Jordão