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Coluna

Reflexões sobre o combate contra a corrupção no Brasil - 1

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Em seis anos de operação Lava Jato, descobriu-se procedimentos irregulares do ex-juiz Sérgio Moro e procuradores - Sergio Lima
É sabido que, desde o Brasil colônia, o tema do combate à corrupção parmenece praticamente o mesmo


“Onde está o dinheiro? O gato comeu, o gato comeu e ninguém viu, o gato fugiu, o gato fugiu, o seu paradeiro está no estrangeiro, onde está o dinheiro?” Esse é um trecho da marchinha carnavalesca “Onde está o dinheiro?”, composta em 1937 por José Maria de Abreu, Francisco Mattoso e Paulo Barbosa. Interpretada por Aurora Miranda para o carnaval de 1938, foi regravada com enorme sucesso na voz de Gal Costa em 1984.

Consta que na campanha presidencial para a eleição de 3 de janeiro de 1938 (essa eleição não ocorreu em virtude do golpe de 10 novembro de 1937 em que Getúlio Vargas impôs a ditadura do Estado Novo), o político paraibano José Americo de Almeida fez um comício afirmando que sabia onde “encontrar o dinheiro”. O povo começou a brincar com a pergunta, onde está o dinheiro? Bastou a criatividade artística dos autores para a marchinha cair na boca da população.

Fica evidente que os compositores aproveitaram o mote para realizarem uma crítica ao tema da corrupção. Uma outra estrofe da música descreve: “Eu vou procurar, e hei de encontrar, e com o dinheiro na mão, eu compro um vagão, eu compro a nação, eu compro até seu coração”.
Muito sagaz o conteúdo proposto na expressão cultural carnavalesca. É sabido que, desde o Brasil colônia, passando pelos sucessivos períodos históricos até os dias de hoje, o tema do combate à corrupção permanece praticamente o mesmo. Na política, tem sido definidor de definições históricas importantíssimas. Um dos processos de campanha em que o tema ganhou centralidade foi a de Jânio Quadros para presidente em 1960. Usando a vassoura como símbolo, o jingle da campanha se popularizou exaltando o combate à corrupção: “Varre, varre vassourinha! Varre, varre a bandalheira! Que o povo já tá cansado, de sofrer dessa maneira! Jânio Quadros é a esperança desse povo abandonado. Jânio Quadros é a certeza de um Brasil, moralizado! Alerta, meu irmão! Vassoura, conterrâneo! Vamos vencer com Jânio!”. Era comum nos comícios da época muitas pessoas levarem vassouras para expressar seu apoio à proposta que se tornaria vitoriosa. Jânio Quadros foi eleito pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN) em aliança com a liberal e conservadora União Democrática Nacional (UDN). Jânio tomou posse em 31 de janeiro de 1961, desgastado, acabou renunciando no dia 25 de agosto do mesmo ano sob a incredulidade geral da nação.
O golpe que implantou a ditadura civil/militar em 1964 tinha como bandeiras um pretenso combate ao comunismo e à corrupção. Não existia articulação que indicasse uma guinada do presidente trabalhista João Goulart, o Jango, ao comunismo. Ao implantar a ditadura, a censura dificultaria o controle externo do processo e não houve a criação de instrumentos de controle que impedisse a prática de corrupção. Nos anos 1980, letra da música Alvorada Voraz do grupo RPM, entoava “O caso morel, o crime da mala, Coroa-brastel, o escândalo das jóias e o contrabando, um bando de gente importante envolvida”.
Dentre as citações vale destacar o rumoroso caso coroa-brastel. Matéria do jornalista Roni Lima, publicada pela Folha de São Paulo em 1 de outubro de 1998, relata: “Após 15 anos do estouro do escândalo Coroa-Brastel, o empresário Assis Paim Cunha foi condenado (pelo iniciante juiz Marcelo Bretas), ontem à oito anos e três meses de detenção, em regime semiaberto, por gestão fraudulenta da instituição financeira... O caso Coroa-brastel é considerado um dos maiores escândalos financeiros do regime militar (1964-85)”.

Na mesma reportagem o jornalista cita: “Em outubro de 88, o Ministério Público Federal protocolou denúncia no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Cunha e os ex-ministros Antônio Delfim Netto (Planejamento) e Ernane Galvêas (Fazenda). Os três foram acusados de, à época do governo Figueiredo (1979-85), tramar a obtenção de vultoso empréstimo na Caixa Econômica Federal (CEF) para refinanciar dívidas da corretora Laureano, cujo controle havia sido assumido pela coroa-brastel”. Em entrevista ao mesmo jornalista, publicada pela Folha de São Paulo, no dia 2 de outubro, o empresário Assis Paim, afirma: “A minha responsabilidade, pela qual paguei um preço caro demais, foi ter emprestado dinheiro (para a corretora Laureano). Depois que emprestei o dinheiro, fiquei sem saída. Os três (os ex-ministros Ernane Galvêas, Antônio Delfim Netto e o ex-presidente do Banco Central Carlos Geraldo Langoni) são os grandes responsáveis. Eles obedeciam às determinações do general Golbery (do Couto e Silva), que era o dono do Brasil e determinou que ajudassem a corretora”. Até o fim da vida em 2008 o empresário Assis Paim afirmava a responsabilidade dos ministros do governo militar sobre todo o processo.
Em anos recentes, no Brasil afora diversas ações policiais envolvendo prisões, mandados de busca e apreensão sobre lideranças de vários partidos políticos e grandes empresários. Após seis anos de intensas repercussões sobre corrupção no país a força tarefa da Lava-Jato, a maior operação já realizada na História brasileira chega a um contexto em que acumulam denúncias de que procuradores e Sérgio Moro, o principal juiz da operação distorceram ritos processuais, planejaram ações em conluio entre Polícia Federal e MPF, que vai desfigurando e expondo as mazelas e os desacertos históricos do Brasil na pauta do combate à corrupção.

Como se vê, as elites historicamente no poder, o grande capital e os grupos familiares empresariais possuem longo histórico de envolvimento em corrupção, um tema histórico e mais profundo do que nos foi apresentado nos últimos cinco anos.

Em próximas colunas continuaremos refletindo esses rumos para pensarmos que proposta poderia ser aplicada para que o Brasil deixasse de figurar mundialmente entre os países mais corrompidos do planeta.

Edição: Pedro Carrano