Solidariedade

MST doa 12 toneladas de alimentos em região marcada pelo agronegócio e pela fome

Cidade é Capital Nacional do Leite, mas a fome é a realidade. Demanda por ajuda do CRAS cresceu 200% na pandemia

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Com a ação do último final de semana, agricultores e agricultoras sem-terra do Paraná chegaram a marca de 400 toneladas de alimentos doados - Iara B. Facalde Pereira

Arroz, feijão, legumes, frutas, verduras, leite, pão e até macarrão caseiro compuseram as mais de 12 toneladas de alimentos doados para cerca de 800 famílias carentes de Castro, no Paraná, no último final de semana. 

Os produtos – a maior parte orgânica – foram produzidos por sete assentamentos e acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) das cidades de Ponta Grossa e Castro. A região é amplamente explorada pelo agronegócio e moradores das periferias lutam contra a fome.

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A ação solidária faz parte da campanha nacional do MST para partilhar alimentos com quem enfrenta a fome neste período de pandemia do coronavírus. Somente no Paraná, já foram doadas mais de 400 toneladas de alimentos doados. Em todo o Brasil, foram mais de 2.800 toneladas.

O acampamento Maria Rosa do Contestado, em Castro, foi responsável pela logística de organização das cestas. No local vivem cerca de 200 famílias, que receberam, em março deste ano, certificação 100% agroecológica pela Rede Ecovida de Agroecologia.

Desde maio, as famílias mantêm uma horta comunitária para garantir a continuidade das doações e também o consumo interno. A comunidade completa cinco anos no próximo dia 25 e escolheu a ação de solidariedade como comemoração.

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“É uma forma de comemorar, agradecer os frutos colhidos da terra e repartir com as famílias, nossos amigos e irmãos da cidade que não têm a terra pra produzir e se desenvolver”, conta o agricultor Célio Meira.

Por outro lado, uma ordem de despejo preocupa os camponeses. No final de outubro, uma audiência vai decidir o futuro da comunidade.

“Mesmo a gente tendo as dificuldades e uma ação de despejo sendo movida contra nós, as famílias continuam animadas, plantando, produzindo, na tentativa de sensibilizar o poder público e toda a sociedade castrense e do país a ter um olhar mais cuidadoso, mais criterioso com o agricultor familiar, com a reforma agrária.” 

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Fome na Capital do Nacional do Leite

Castro recebeu o título de Capital Nacional do Leite em 2017, por ser a maior produtora do Paraná e uma das maiores do Brasil. No entanto, a fome é uma realidade para a população empobrecida.

“Tem pessoas que passam necessidade, que não têm o que comer, infelizmente. A gente fica sem ação, sem ter o que fazer, porque a gente vê as pessoas passando fome e não tem como ajudar. Isso machuca a gente como ser humano”, relata emocionada Rosilda Rodrigues Marcondes, 39 anos, sobre a realidade da sua vizinhança na Vila Operária, um dos bairros que receberam os alimentos.

A coordenadora do Centro de Referência em Assistência Social (Cras) Consulesa Helena Van Der Berg, Simone Gomes, conta que houve um aumento de 200% de atendimentos a famílias vulneráveis em maio. A demanda por cestas básicas passou de 40 para 120 por mês, “e se tiver mais cestas, tem demanda”, relata. “Muitas pessoas que nunca precisaram do CRAS agora estão nos procurando”, afirma.

Segundo ela, o auxílio emergencial tem sido usado para suprir o pagamento de contas como aluguel, contas de luz, água e remédios. A alimentação fica em segundo plano. “Pra nós foi de grande importância essa doação de alimentos vinda de vocês [MST]. Muitos têm uma visão equivocada do movimento de vocês. Só quem conhece sabe a causa realmente de vocês. A gente conhece os assentamentos, viu que vocês são organizados, têm uma produção boa”, diz.

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O agricultor Roberto Benitez é morador do assentamento Conceição, em Castro, há 36 anos. Ele faz parte da Cooperativa dos Trabalhadores Rurais e Reforma Agrária de Castro (Cootramic), que reúne produtores assentados e da agricultura familiar da região.

De lá saíram 1.5 mil litros de leite doados às famílias urbanas. “Na verdade, a reforma agrária funciona. A luta não foi em vão, valeu a pena, porque hoje a gente pode ajudar o pessoal lá da cidade. E, se a gente for ver, nenhuma grande propriedade doou nada, nem um litro de leite pro município. E nós vamos doar leite daqui”, compara.

A presença do agronegócio de grandes cooperativas agrárias é uma marca na política e na economia da cidade. Na principal estrada de acesso à área urbana do município, a PR 340, produtores rurais assinam dois outdoors em apoio a Bolsonaro.

Além do acampamento Maria Rosa do Contestado, participaram da ação outras cinco comunidades de Castro: assentamentos Três Pinheiros, Três Lagoas, Conceição, acampamento Padre Roque Zimmermann, agricultores familiares da comunidade Lagoa dos Ribas, e Associação União, que integra assentados e pequenos agricultores da região.

O assentamento Che Guevara e acampamento Emiliano Zapata, de Ponta Grossa, também fizeram parte da mobilização.

Fonte: BdF Paraná

Edição: Lia Bianchini