Pernambuco

ENTREVISTA

“A exploração da Amazônia é uma política de governo”, avalia pesquisadora

Maria das Graças é professora da UFPE avalia política ambiental do governo Bolsonaro no programa Aqui pra Nós

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Área devastada em agosto por incêndio na região de Altamira, Pará. No mês passado, queimadas aumentaram 300% com relação a 2018
Área devastada em agosto por incêndio na região de Altamira, Pará. No mês passado, queimadas aumentaram 300% com relação a 2018 - Foto: Joao Laet/AFP

 

Os retrocessos da questão ambiental no Brasil e a destruição dos recursos naturais no governo Bolsonaro foram tema na terça (04), da entrevista do Programa Aqui Pra Nós foi com a professora Maria das Graças Silva. O Aqui pra Nós vai ao ar todas as terças a partir das 19h no canal do Youtube do Brasil de Fato Pernambuco. Confira os principais pontos da entrevista:

Agronegócio e Meio Ambiente


Graça explica que o agronegócio hoje vai além das empresas de monocultura “O agronegócio é o latifúndio, mas é também a indústria que produz insumos para as grandes lavouras; pelos centros de pesquisa e inovação voltadas a biotecnologia; nanotecnologia e Inteligência Artificial; o capital financeiro e o próprio Estado, que impulsiona essas atividades”. 


Ela explica que essa multiplicidade fomenta grande parte dos trabalhos precários no Brasil “são relações de trabalho absurdamente precárias, grande parte do seu trabalho é análogo à escravidão, o que era desmontado pelo Ministério do Trabalho em outros tempos”. Para ela, outra questão que estrutura o agronegócio no país são os agrotóxicos, que trazem grandes impactos “Isso sem contar do adoecimento causado pela manipulação de agrotóxicos, que são tóxicos também para quem os manipula, para as populações circunvizinhas. Os venenos são prejudiciais a saúde de quem consome, quem manipula, ao solo, a animais como abelhas, às águas”.

Amazônia


“Ao invés de perguntar o que o governo fez pelo meio ambiente, a gente poderia perguntar o que eles não tem feito. A única resposta é constatar que é a exploração da Amazônia é uma política de governo” aponta. Ela também comenta sobre o documento que gerencia a parte da política ambiental do Brasil, o Plano Nacional para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação Da Vegetação Nativa”, que de acordo com a pesquisadora “é pífio, tem questões muito genéricas e superficiais e defende fundamentalmente o que eles chamam de ‘bioeconomia’ o que mostra a incapacidade do capital para preservar o meio ambiente e arranja novos nomes para maquiar velhas formas”. 

Ela explica que o conceito de bioeconomia está ligado ao que o documento cita como “ambientalismo de resultados”, que para o governo é a associação entre as boas práticas ambientais e eficiência economia. “Falar de eficiência aqui é assegurar a atividade que assegura lucro. No documento o plano para a Amazônia é ‘produzir alimentos, madeira, fármacos, cosméticos combustíveis, mantendo a floresta em pé’. Eles não só não combateram o desmatamento, como asseguraram a impunidade de quem faz isso” denuncia.

Garimpo


O garimpo foi considerado como atividade essencial durante a pandemia, mesmo quando há denúncias de diversas comunidades tradicionais sobre ações ilegais “O Estado deveria prevenir e impedir a presença do garimpo e sobretudo nas terras indígenas, porque ele é ilegal ali independente da circunstância. O garimpo envolve um nível de degradação assustador e eles não se localizam apenas no entorno dessas atividades, elas se espalham, inclusive através pelo curso dos rios”.


Graça avalia que o invés de desenvolver uma atividade de coibir, o governo favorece o avanço do capital e do garimpo sob as terras indígenas “o PL 191/2020 que quer abrir as terras indígenas para a mineração e isso tem um conjunto de desdobramentos que vai desde as mazelas como a poluição, violência, degradação do Meio Ambiente e além dessas velhas mazelas ele também tem levado o coronavírus como um desdobramento quase que inevitável. Essa política faz parte de um conjunto de ações que tem um maestro, que é o Governo Bolsonaro”.


“Passando a boiada”


A gestão do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles vem sendo definida por uma frase dita por ele em mesmo em abril, que é “passar a boiada”, que é a demissão de fiscais, anistia a desmatadores, censura e militarização como algumas das políticas ambientais realizadas pela sua gestão. A professora avalia que de maneira geral há um retrocesso na legislação ambiental do país “Uma dos principais retrocessos do governo é o desmonte da gestão ambiental pública, que são os avanços e conquistas na legislação e as instituições que surgem daí, como o IBAMA.” 


Ela também aponta que a lei ambiental brasileira possui muitos avanços, que antes mesmo de serem implementados estão em risco “Nós temos até hoje um conjunto jurídico bem robusto, que a partir da constituição derivou muitas normativas como as políticas de recurso hídricos, de saneamento, de resíduos sólidos, as resoluções do conselho nacional do meio ambiente. Isso está sendo claramente desmontado. Uma das derivações com impacto direto na realidade é o desmonte do IBAMA”. 
 

Agroecologia 


A pesquisadora visualiza movimentações contrárias a ação do governo como saídas para a preservação do meio ambiente no Brasil a exemplo da agroecologia “É importante ressaltar que essas experiência vem sendo desenvolvidas num contexto de negação ao latifúndio. É impossível pensar em Agroecologia com produção intensiva, porque ela obriga o solo a fornecer os mesmo nutrientes, atrai doença, empobrece o solo”. 

Ela também explica que a saída vai além de pensar na preservação do meio ambiente, mas levando em conta aspectos humanos e sociais “A agroecologia é importante pensando a reforma agrária, a produção de alimentos saudáveis, cientificamente orientada. Ela oferece possibilidades para sociabilidade dos trabalhadores camponeses e os que estão ligados a ela por redes de solidariedade, participação, ação nas políticas públicas. A agroecologia põe o dedo nas feridas o capital e em como ele se reproduz hoje”. 

Por, fim, Graça elenca desafios para a implementação de outro modelo agrícola no Brasil “enquanto tivermos agronegócio e não resolvermos o clássico estrutural problema da formação social do Brasil, que é a reforma agrária, não vamos adotar a agroecologia como uma política pública e efetiva de Estado”.

Edição: Monyse Ravena