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Educação

Artigo | O Interventor mente para seguir a cartilha do presidente

A marca da gestão Bolsonaro é a falta de compromisso com a transparência; Cândido Albuquerque não faz diferente na UFC

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Cândido Albuquerque ao lado do Ministro Weintraub - Divulgação MEC

Desde que aceitou - mesmo tendo sido o terceiro colocado na consulta à comunidade universitária - a nomeação para assumir o cargo de Reitor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Cândido Albuquerque demonstra, por meio de suas ações e decisões, qual cartilha para a educação segue: a mesma de Jair Bolsonaro e Abraham Weintraub. Além de realizar manobras para implementar, a qualquer custo, o Future-se, programa proposto pelo MEC com o objetivo de submeter a produção acadêmica e científica das universidades às demandas do setor privado, ele também parece ignorar, assim como o presidente e o atual ministro da Educação, a realidade de milhares de estudantes que não contam com suporte tecnológico básico, o que se agrava na atual situação de pandemia. 

A nível nacional, o Governo Federal tenta implementar a forma digital do Enem. Já na UFC, Cândido propõe aulas remotas obrigatórias, contrariando quase 5 mil estudantes que assinam uma petição contra esta medida. Cândido, com base em pesquisa realizada com a comunidade universitária, por meio digital, e que contou com a participação de 30% do corpo discente, afirma “Talvez o aluno não tenha acesso à internet para fazer atividades remotas, mas a consulta foi feita por e-mail. Quem não tem acesso a email?”. O Diretório Central dos Estudantes realizou uma pesquisa, por meio de formulário eletrônico, que contou com participação de 3.013 estudantes, dos quais 33,6% identificam a falta de acesso à internet como principal problema de suas turmas.

Weintraub chama estudantes universitários de "idiotas úteis" e curte publicações que ameaçam estudantes. Cândido, em suas redes sociais, como tentativa de intimidação, expõe histórico escolar de estudante contrário à sua administração. A propaganda do MEC para convencer a sociedade do sucesso do formato virtual do ENEM dizia "A vida não pode parar. Precisa ir à luta, se reinventar, se superar". Em nota enviada a estudantes, servidores técnico-administrativos e professores no último dia 12, Cândido afirma "Precisamos, cada um, com responsabilidade, fazer a sua parte. A universidade não pode parar", reproduzindo a crença de que o sucesso acadêmico, mesmo diante da atual crise sanitária e política, depende exclusivamente da vontade de cada estudante e de fatores individuais (como competência, disciplina e esforço), quando este sucesso é impossibilitado, principalmente, pela desigualdade de oportunidades, seguida pela vulnerabilidade social e econômica, além dos impactos severos da pandemia na saúde mental da população. Já é marca da gestão de Jair Bolsonaro a falta de compromisso com a transparência frente aos dados  estatísticos e a omissão da realidade, Cândido Albuquerque não faz diferente em sua gestão na UFC.

Assim como o Governo Federal, a administração superior da UFC não apresentou ao conjunto da comunidade universitária um plano estruturado com base na realidade material do corpo estudantil, mas sim uma chamada Proposta Pedagógica Emergencial, cuja eficiência é questionada desde sua formulação, que não viabilizou a participação ampla e efetiva do corpo discente. Mas, seguindo exemplo do presidente da República, Cândido Albuquerque não mede esforços para elogiar as medidas adotadas em sua gestão. Insiste em declarar, por exemplo, que o modelo virtual dos Encontros Universitários foi exitoso, quando grande parte dos estudantes foi afetada e deixou de participar do evento por falta de acesso à internet e a meios básicos de tecnologia. 

Quando Cândido sugere, em nota, que cada um faça sua parte porque a UFC não pode parar, ele parte da premissa de que todos os estudantes têm igual acesso à educação, o que desconsidera os diversos contextos culturais, condições financeiras e de habitação, fatores determinantes para o êxito ou fracasso dos estudantes perante as medidas propostas. Considerando-se estes e outros fatores, universidades públicas como a UFRJ, a UFMG e a UnB suspenderam seus calendários acadêmicos e descartaram, desde o começo da quarentena, a substituição de aulas práticas e presenciais por ensino à distância. É fato que as realidades das universidades citadas são distintas entre si e da UFC, o que reforça a importância do amplo debate entre a comunidade universitária para a formulação e implementação de um plano de emergência eficiente, bem estruturado e baseado nas demandas reais do diverso corpo discente.

*Gabriella Carvalho, estudante da UFC, militante do Levante Popular da Juventude e membro do Diretório Central dos Estudantes

Edição: Vanessa Gonzaga