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“Se o cenário não mudar, população de rua terá futuro nebuloso”, projeta Pastoral

Vulnerabilidade de quem está em situação de rua se intensifica com pandemia e grupos cobram respostas do poder público

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Em Belo Horizonte, até o fechamento desta matéria, havia uma pessoa em situação de rua internada com suspeita de Covid-19 - José Cruz/Agência Brasil

Em tempos de coronavírus, a parcela da população que mais sofre é a que já mais sofria antes: as pessoas em situação de rua. Com políticas públicas defasadas pelo Brasil, quem vive na rua tem os problemas habituais multiplicados pela falta de acolhimento e planejamento. A fome que castiga se intensifica, o acesso à saúde fica cada vez mais distante e precário.

Em Minas Gerais, organizações e movimentos cobram medidas urgentes do governo e dos municípios para que as pessoas em situação de rua também sejam incluídas nas estratégias de enfrentamento à pandemia.

Uma das principais dificuldades deste momento é a falta de comida e de água, que cresceu com a quarentena. A maioria da população em situação de rua recebia os mantimentos por meio de doações de transeuntes e de equipes de voluntários, que tiveram que diminuir a distribuição, como conta Claudenice Rodrigues, da Pastoral de Rua de Belo Horizonte. “Se o cenário que está hoje não mudar, a população de rua terá um futuro nebuloso pela frente”, avalia.

Reivindicações

A Prefeitura de Belo Horizonte já recebeu recomendações de como agir em caráter de emergência por meio de documento oficial assinado pelo Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DP-MG) e Ministério Público do Trabalho (MPT).

Entre as orientações estão manter os serviços públicos que atendem a população de rua e fornecer itens de higiene e utensílios descartáveis para os usuários e trabalhadores desses locais; abrigos com dignidade, que podem ser pensões ou hotéis; moradia prioritária para os grupos de risco; reduzir o número de pessoas por quarto nos albergues; disponibilizar pontos de água potável em locais públicos; fortalecer a política de redução de danos para usuários de drogas, evitando o compartilhamento de seringas ou cachimbos; alimentação gratuita todo dia da semana nos restaurantes populares; garantir atendimento do SAMU, acesso à medicação e cuidados; garantir leitos hospitalares, se necessário; identificar imediatamente imóveis públicos ou privados ociosos que possam ser moradia temporária e mais.

De acordo com Cristina Bove, da Pastoral Nacional do Povo de Rua, o plano foi entregue ao Executivo municipal no dia 18 de março, mas as instituições autoras seguem sem resposta. "Isso é muito sério, muito grave. A gente sabe que a prefeitura está buscando alternativas, mas a população de rua está completamente sozinha, dispersa pela cidade, sem saber como vai ser o futuro, em desespero", relata. 

Na esfera estadual, dois projetos de lei com o objetivo de minimizar o sofrimento dos trabalhadores e moradores da rua foram apresentados na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Um prevê renda emergencial para os catadores de materiais recicláveis, que tiveram que suspender o seu trabalho, e outro renda emergencial para as pessoas em situação de rua. Ambos propostos pela deputada Leninha (PT), eles ainda serão analisados. "Tudo surge ampliado [para a população de rua], tudo atinge mais porque eles estão aí, sempre vivendo no limite. E o Estado não se preparou", pontua Cristina.  

Em Belo Horizonte, até o fechamento desta matéria, existe uma pessoa em situação de rua internada com suspeita de Covid-19.

Sociedade civil

Com o Estado se organizando para enfrentar a pandemia, a sociedade civil se mobiliza para tentar diminuir os prejuízos. Dezenas de campanhas de doações realizadas por entidades especializadas estão de pé, recolhendo álcool em gel, máscaras, escovas de dente, shampoos, sabonetes, etc.


Campanha de doação para a população de rua em BH / Reprodução

Nos últimos dias, o Parque Municipal, no Centro de BH, amanheceu com sacolinhas de lanche penduradas nas grades da entrada, iniciativa de um grupo chamado Liga do Amor. O coletivo também distribuirá a comida por outras regiões da cidade.


Nas grades do Parque Municipal, em BH, coletivo pendura marmitas para pessoas em situação de rua / Arquivo pessoal

Governo

A prefeitura declarou que adotou práticas para a proteção de trabalhadores e usuários nas unidades de acolhimento, como a intensificação da limpeza, melhora na ventilação, higienização e orientação para cada pessoa, além de distribuir toalhas de papel, termômetros, máscaras e demais itens de proteção. A instituição diz que atividades coletivas estão suspensas, tanto nos refeitórios quanto nas salas de estar e de jogos.

"Os Restaurantes Populares seguem em funcionamento, com exceção do Refeitório Popular da Câmara Municipal, que está fechado. A forma do atendimento foi alterada, com a entrega de marmitex, evitando aglomerações. A alimentação está mantida em outros equipamentos da rede como abrigos e albergues. O Banco de Alimentos, que realiza doação de alimentos para entidades socioassistenciais, também continua atuando, garantindo que o alimento chegue às ONGs que realizam ações para essa população". A PBH afirma, ainda, que está construindo estratégias de longo prazo para proteger o povo em situação de rua.

O Governo de Minas informa que está articulando uma série de providências junto aos municípios para garantir o acolhimento e distanciamento social da população de rua, assim como o atendimento e isolamento, quando há necessidade. "O Governo criou um Grupo Intersetorial que conta com gestores municipais e estaduais nas áreas de saúde, assistência social e direitos humanos, bem como de representantes da sociedade civil, do Ministério Público e da Defensoria Pública", diz nota.

O Executivo estadual comunicou que nos próximos dias será emitido um documento orientador com operações que garantam o tratamento para quem vive na rua.

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Edição: Joana Tavares