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Da prisão à liberdade, Vigília Lula Livre recebeu mais de 90 atos inter-religiosos

Lula participou do ato inter-religioso deste domingo (10), por meio de uma ligação aos participantes

Curitiba (PR) |
Os atos inter-religiosos tiveram grande adesão na programação da Vigília Lula Livre, reunindo semanalmente centenas de pessoas
Os atos inter-religiosos tiveram grande adesão na programação da Vigília Lula Livre, reunindo semanalmente centenas de pessoas - Joka Madruga

A religiosidade e a fé estiveram presentes em todos os 580 dias da Vigília Lula Livre, em especial nos atos inter-religiosos realizados todos os domingos, desde a chegada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. Neste domingo (10), dois dias após a soltura do ex-presidente, a militância da Vigília fez do tradicional ato uma Celebração de Ação de Graças pela liberdade de Lula.

Bandeiras, flores, velas, sementes, a bíblia e a placa onde ficou cravada a marcação de 580 dias de resistência foram trazidos ao centro do espaço de celebração, carregados pelas pessoas que participaram do dia-a-dia da Vigília. Nos cantos entoados com entusiasmo, letras relacionadas ao viés religioso comprometido com a transformação da realidade e superação das injustiças.

“Como é bom nos encontramos hoje, com o coração muito aliviado e muito agradecido”, resumiu a Irmã Inês Pereira, integrante da congregação Franciscanas de São José e uma das organizadoras dos ato inter-religiosos ao longo do período da Vigília.

Dom Naudal Alves Gomes, bispo da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, relacionou a mensagem de Deus às palavras ditas por Lula em seus primeiros discursos. “A bíblia diz: ‘Amem a Deus acima de tudo e amem ao seu próximo como a ti mesmo’. Nosso presidente saiu da prisão e disse: ‘no meu coração não tem ódio, tem amor’. Nós precisamos amar uns aos outros. É assim que se constrói uma nova sociedade. Vamos à diante, com fé, alegria e perseverança”, diz o bispo. 

“No candomblé, tudo pra gente tem uma simbologia muito forte, todo símbolo representa alguma coisa de fundamento. O Lula sair no dia 8, numa sexta-feira, pra nós representa que ele tem uma proteção divina de Oxalá muito grande. Porque tanto a sexta-feira é o dia de Oxalá, quanto 8 é o número de Oxalá”, explica a Mãe de Santo Cris Mendes, participante do ato. 

Apesar da comemoração, Irmã Inês Pereira faz uma ressalva: “a alegria não pode nos acomodar, porque poderíamos cair num marasmo. Nós queremos celebrar com alegria e gratidão esse momento histórico para todos nós, que é a liberdade do nosso presidente Lula, que é sinônimo de liberdade para o nosso Brasil de tantas opressões que estão aí, em cima do nosso povo. Continuamos perseverantes por um Brasil mais junto, na luta por igualdade, onde todos tenham direitos”.

Ligação inesperada

Uma ligação conectada às caixas de som do ato surpreendeu o público. Era a voz de Lula, que acompanhava a celebração pela transmissão ao vivo e ligou para enviar um recado: “Eu quero dizer pra vocês que não existem palavras para que eu possa dizer o quanto eu me orgulho de ter vocês como companheiros e companheiras que me ajudaram, fazendo suas pregações, rezando, com sermões de vocês me fortaleci muito na cela em que eu estava durante 580 dias”.

Lula também falou com indignação sobre o golpe em curso na Bolívia. “Eu estou em liberdade, estou muito alegre, e acabo de ficar triste porque acabo de receber a notícia de que houve um golpe de Estado na Bolívia, e que o companheiro Evo e o companheiro Linera foram obrigados a renunciar o seu mandato para que os golpistas assumissem o governo na Bolívia. É lamentável que a América Latina tenha uma elite econômica que não saiba conviver com a democracia, que não sabia conviver com a inclusão social das pessoas mais humildes, as pessoas mais pobres, dos trabalhadores”.

Uma união que vai além da Vigília

Os atos inter-religiosos tiveram grande adesão na programação da Vigília Lula Livre, reunindo semanalmente centenas de pessoas e com sucesso de público nas transmissões ao vivo pela internet. No entanto, as primeiras celebrações começaram a ocorrer três anos antes, durantes as mobilizações contra o golpe imposto à presidenta Dilma Rousseff (PT). A iniciativa partiu da organização Frente Brasil Popular (FBP), que reúne centenas de entidades, partidos e movimentos sociais de esquerda.

Teresa Lemos, militante da FBP responsável pela articulação de religiosos progressistas de todas as matrizes religiosas, lembra de terem havido atos nas Praças Rui Barbosa, Tiradentes e Santos Andrade, todas no Centro da capital paranaense. 

As ações em torno da Superintendência da Polícia Federal começaram no dia em que ex-presidente Lula foi preso. “Logo que a gente terminou a celebração, os policiais começaram a jogar bomba em nós”, relembra, referindo-se à repressão sofrida pelas centenas de pessoas que protestavam em frente à PF, no dia 7 de abril de 2018. 

As celebrações começaram a acontecer já no primeiro domingo após a prisão, a céu aberto, quando a Vigília se instalou na rua. “Houve um domingo que nós fomos provocados durante a celebração, mas os companheiros e as companheiras nos defenderam, e isso foi nos animando”, conta Irmã Ana Fusinato, das Catequistas Franciscanas. 

“A inspiração que veio primeiro foi de alimentar o amor de quem estava aqui na Vigília, de amar também os que pensam diferente, os que têm projetos diferentes na vida. Também para assegurar aos nossos irmãos e irmãs que estavam lutando pelo presidente Lula que o Evangelho de Jesus nos chama para a fraternidade, para a justiça e para a dignidade”, completa a irmã, integrante do grupo de organização dos atos inter-religiosos. 

Entre o dia da prisão de Lula até a celebração de Ação de Graças pela liberdade, foram mais de 90 atos realizados todos os domingos, e também em celebrações especiais para marcar datas, como dois aniversários de Lula (em 2019 e 2019), falecimento do irmão do ex-presidente, Vavá, e do neto Arthur, Jornada de Agroecologia, Dia Internacional dos Trabalhadores, Natal e Ano Novo.

Minoria entre as lideranças evangélicas brasileiras, pastor Mike Vieira falou sobre as dificuldades que enfrentou por ter se posicionado contra a onda conservadora, integrado a organização das celebrações e também por ter visitado Lula. “Perdi muitos amigos pastores nessa caminhada por não concordar com o fascismo que estava acontecendo, mas ganhei muitos religiosos amigos que fizeram parte dessa caminhada. Porque o maior de todos os pecados é a omissão, e quando nós nos posicionamos sabíamos que havia uma injustiça”, relatou o pastor, membro da igreja Congrega Church.

Teresa Lemos conta já ter sido procurada por outras lideranças religiosas interessadas em fazer parte das próximas celebrações. “A ideia é que a gente continue fortalecendo esse viés da religiosidade nas lutas pela democratização do nosso país e na construção de um país justo para todos e todas”, anuncia.

Também estiveram presentes no ato deste domingo o padre Marcos Crescencio Sobrinho, vindo de Pindamonhangaba (SP), o Teólogo Augusto Conde, representando a igreja Batista, Irmã Zulmira Alves Araújo, das Franciscanas de São José, e Antonio Caetano de Paula Junior, conhecido como Pai Caetano de Oxóssi.

Edição: Lia Bianchini