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Aniversário

Artigo | 325 anos de Curitiba e uma festa no dia da mentira

A gestão Greca desmonta a ideia de que estamos andando para frente no curso da história

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
A população curitibana tem sofrido com enchentes. Nas últimas semanas, milhares de pessoas tiveram as casas danificadas e perderam móveis
A população curitibana tem sofrido com enchentes. Nas últimas semanas, milhares de pessoas tiveram as casas danificadas e perderam móveis - Giorgia Prates

Na quinta feira, dia 29 de março, Curitiba completa 325 anos de fundação. Infelizmente para alguns será difícil chegar ao parque Barigui no domingo e se deliciar com um dos 6 mil pedaços de bolo oferecidos pela prefeitura. A data, simbolicamente, também representa no imaginário popular o dia da mentira.

A festa começa às 8h30 da manhã com um passeio de bicicleta do bairro Água Verde até o Salão do Automóvel, no Parque Barigui. Quer algo mais simbólico que um passeio de bicicleta que termina no Salão do Automóvel? Isso reflete o que a gestão do prefeito Rafael Greca (PMN) pensa das políticas públicas para os ciclistas da cidade. Se lembrarmos bem, uma das primeiras ações do presente prefeito, quando eleito, foi realocar um monumento à bicicleta, que se encontrava em frente à prefeitura, para o próprio Parque Barigui. A ideia é exatamente essa, bicicleta pertence ao parque, e no dia a dia urbano que os ciclistas se virem ao dividir a rua com as motos, carros, ônibus e caminhões. Afinal quem não lembra da condição posta por Greca para instalar ciclovias na cidade “desde que não infernizem os motoristas”. Mensagem clara, parabéns Curitiba.

Mas não desanime se não puder participar do passeio de bicicleta, pois o parque Barigui fica próximo ao Terminal Campina do Siqueira e nada como um sistema de transporte eficiente para te levar ao braços de uma comemoração democrática. Aliás, é bom avisar que o prefeito Greca, além de aumentar a tarifa pra R$4,25, também extinguiu a tarifa domingueira, portanto, se a família estiver no clima de um bolinho no parque, se prepare para pagar no mínimo R$ 9,50 por pessoa ida e volta.

É preciso lembrar também que as empresas de ônibus firmaram um acordo pra lá de obscuro com a prefeitura para amenizar as disputas judiciais que travavam a renovação da frota do transporte público. Será que o prefeito Greca está esperando um momento propício para nos brindar com detalhes desse acordo? Ou será que de aniversário irá presentear a cidade com ônibus novos que não quebram no caminho pro trabalho? A ansiedade toma conta da cidade, parabéns Curitiba.

Quem está pensando em presentear a cidade com mais um super mercado é a rede Angeloni. Dentro de uma área de cerca de 60 mil metros quadrados, onde antes ficava o Hospital Bom Retiro, a rede de super mercados pretende instalar um complexo de 17 mil metros quadrados, mas promete preservar o que restou de área verde. O que poderia se tornar um simbólico parque para atender a população e aproximar o bairro do ideal de qualidade de vida proposto pelo selo da Cidade Ecológica parece entregue nas mãos de mais um caixote de concreto multifuncional. Nessa empreitada, a população se organiza contra a instalação do super mercado e até Jaime Lerner, um dos primeiros padrinhos políticos de Greca, parece discordar do atual prefeito. No fim do ano passado disse em um evento “eu prefiro um parque, mas não quero me manifestar sobre decisões aqui de Curitiba”. Bom, mas se manifestou. E logo retirou sua manifestação. Grande símbolo da cidade modelo, parabéns Curitiba.

E o que falar das denúncias de venda de terrenos pela Cohab, proferidas pelo vereador Goura (PDT) na última semana em plena Câmara dos Vereadores? Segundo o mandato do vereador, a Cohab estaria prestes a vender dois terrenos que somariam no total cerca de 5 mil metros quadrados, um na Av. Vicente Machado e um na Av. da República próximo ao shopping Palladium. Goura questiona porque que a Cohab se desfaz desses terrenos, rodeados de infraestrutura e equipamentos, em vez de promover habitações de interesse social. O mandato do vereador calcula que os dois lotes juntos poderiam contribuir para a moradia digna de pelo menos 230 famílias.

Mas talvez seja mais interessante para a Cohab vender os terrenos para a especulação imobiliária, e comprar terras cada vez mais distantes para alocar as famílias atendidas pela entidade. Como disse um amigo, para a prefeitura não importa a qualidade das construções ou sua localização, mas sim o número de casas construídas. O que você acha que salta mais aos olhos do eleitor, 400 casas construídas na periferia ou 230 no centro? Estratégia, gestão, parabéns Curitiba.

Mesmo com 325 anos de idade e uma história rica e de destaque na construção de uma digna cidade brasileira, há pouco a se comemorar nesse aniversário de Curitiba. A gestão Greca desmonta a ideia de que estamos andando para frente no curso da história: promove o retrocesso na gestão urbana e mostra cinismo e autoritarismo ao lidar com as críticas. Mas pelo menos irá distribuir 6 mil pedaços de bolo no dia da mentira. Tomara que não chova como nas semanas passadas. Seria triste ver se repetir os alagamentos na cidade e no Parque Barigui em pleno dia de comemorações. Água no bolo, parabéns Curitiba.

*Luiz Calhau é engenheiro civil, integrante do Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge-PR) e mestrando em Planejamento Urbano pela UFPR

Edição: Ednubia Ghisi